Médicos peritos reclamam de localização do novo Núcleo da Perícia Forense, em delegacia

Principal motivo da reclamação é porque a nova sede divide espaço com a Delegacia de Capturas. Código de Ética Médica (CEM) proíbe proximidade

14:13 | Dez. 02, 2019

A nova sede fica na rua Antônio Pompeu, 216 (foto: Reprodução/ Via WhatsApp O POVO)

Atualizado às 21 horas

Inaugurado no dia 11 de novembro deste ano, um novo núcleo da Perícia Forense construído na rua Antônio Pompeu, no Centro de Fortaleza, tem causado desconforto e indignação em médicos peritos. O principal motivo é a localização do novo espaço, que tem comunicação direta com instalações da Delegacia de Capturas (Decap), localizada na rua Conselheiro Tristão, nas dependência da 17° Vara de Custódia.

O médico legista presidente da Associação de Médicos Peritos Legistas do Estado do Ceará (Ampel-CE), José Mario de Lima, explica que perícias feitas em seres humanos, como aquelas para investigar lesões ou causa mortis, assim como as que são feitas em casos de violência contra a mulher ou em vítimas de crimes sexuais só podem ser realizadas por médicos.

Nesse novo núcleo, as perícias realizadas são as de lesão corporal em pessoas presas em flagrante e apresentadas à delegacia. Mário aponta o problema: “O Conselho Regional de Medicina estabelece que é vedado ao médico a realização de exames periciais de corpo de delito em seres humanos nas dependências de delegacias, de presídios e unidades prisionais similares”, completa.

Conforme o documento, o núcleo não conta com itens como macas com lençol de tecido ou descartável (Foto: Reprodução/ Via WhatsApp O POVO)

O Conselho Regional de Medicina (CRM) chegou a emitir um ofício onde orienta que profissionais não atuem no novo consultório. O relatório não conseguiu inibir os atendimentos, que continuam sendo realizados nas dependências do núcleo. “A gente, enquanto médico, ficou numa situação ‘entre a cruz e a espada. Lá, temos um local de custódia, onde ficam os xadrezes da delegacia. Não existe uma separação”, explica o presidente.

Ainda há outros motivos para a preocupação com esse novo espaço. Uma separação adequada entre o local da perícia e outras áreas garante um atendimento mais adequado às pessoas em situação de detenção ou outros pacientes que precisam passar por exames. Evita também que o médico se sinta inibido em realizar seu trabalho.

“Nesse ambiente onde acontece a detenção do preso, é um ambiente onde o preso pode ser submetido a uma lesão, algum tipo de tortura. O Conselho Federal de Medicina entende que a perícia tem que ser feita em um ambiente neutro”, complementa o médico. O artigo 95 do Código de Ética Médica (2018) diz que é vedado ao médico “realizar exames médico-periciais de corpo de delito em seres humanos no interior de prédios ou de dependências de delegacias de polícia, unidades militares, casas de detenção e presídios.”

Mário de Lima também disse ao O POVO que, ainda nesta segunda-feira, 2, a associação irá se reunir para discutir os próximos passos do movimento. A Perícia Forense Do Estado Do Ceará (Pefoce) continua emitindo as escalas dos médicos para atendimento no local. “A gente vai decidir, por exemplo, se vai notificar o Conselho Regional de Medicina. A gente já procurou o Ministério Público do Estado do Ceará para comunicar o que está acontecendo, que se prontificou a fazer uma mediação entre as partes”, comenta.

Segundo relatório do Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (Cremec), o núcleo construído não atende às normas necessárias para realizar atendimento. O POVO teve acesso ao relatório completo das instalações do núcleo da Perícia Forense na rua Antônio Pompeu, 216. Segundo documento, mais de 20 irregularidades foram detectadas. 

A mudança foi determinada pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Ceará (SSPDS). Por meio de nota, a pasta explicou que o funcionamento do Núcleo de Atenção ao Custodiado da Perícia Forense (Pefoce) no mesmo complexo onde funciona a Vara Única Privativa de Audiências de Custódia do Poder Judiciário reduziu em uma hora o tempo de deslocamento das equipes da PMCE. A SSPDS ressalta que exames sexológicos, de embriaguez e em vítima de crime continuam acontecendo na sede da Pefoce, na avenida Presidente Castelo Branco. Assim como procedimentos lavrados na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) e os decorrentes de apreensão de adolescentes.   

"A medida adotada, além de beneficiar a população, uma vez que aumentará a quantidade de tempo que as equipes da Polícia Militar permanecerão nas ruas, também atende a recomendações do Ministério Público do Ceará (MPCE) e Comissão Estadual de Defesa dos Direitos Humanos para que policiais que realizarem prisões não estejam presentes no mesmo local onde é realizado o exame de corpo de delito. A SSPDS, atendendo ao pleito dos profissionais que atuam na unidade em questão, iniciou uma obra para adequações no espaço físico, como a abertura de uma entrada independente pela Rua Antônio Pompeu. A Secretaria informa ainda que parecer nº 1878/2013 da Procuradoria Geral do Estado (PGE) aponta que o Conselho Regional de Medicina (Cremec) não tem competência para fiscalizar a atividade de perícia forense", transcreve a nota.

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O espaço começou a funcionar ainda em novembro, dia 11 (Foto: Reprodução/ Via WhatsApp O POVO)