Entenda como as festas na Grande Fortaleza se tornaram alvos da violência armada

Fechamento do forró do Gago, forró do Damásio e tiroteio em bares traz à tona a preocupação com a vida noturna na periferia de Fortaleza diante dos índices de violência

09:30 | Fev. 06, 2018

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O ano de 2017 e o começo deste ano foram repletos de confusões, mortes e tiroteios em festejos. Muita gente que procurou divertimento se deparou com situações de violência, como no caso de forró do Gago, no bairro Barroso, que foi invadido por criminosos e palco de uma chacina com 14 mortos.

Um dos últimos casos de grande repercussão aconteceu na madrugada do domingo, 4. O que era para ser uma noite de diversão com bandas de forró acabou em um tiroteio, no bar do Cebolinha, com o desentendimento entre duas pessoas no estabelecimento. A situação deixou feridos.

Na área nobre da cidade, as chacinas e tiroteios nas festas não chegam nem perto do que tem acontecido na periferia. No Porpino Burguer, localizado na Varjota, a confusão foi de menor potencial, sem baleados ou mortos, mas com registro de violência entre grupos de mulheres que brigavam por causa de batata frita.

Em 2017, uma festa de aniversário em um bar no município de Horizonte acabou com cinco mortos, entre eles uma criança de três anos de idade. No Porto das Dunas, a festa era em uma casa de praia, que foi invadida. Seis pessoas foram mortas na ocasião. Na Granja Lisboa, um festejo também terminou em mortes.

Eventos cancelados e operações

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Se, por um lado, os especialistas orientam a ocupar a cidade para inibir a violência, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) tem buscado intervir nos eventos que oferecem algum tipo de risco com ações do Corpo de Bombeiros e da Agência de Fiscalização de Fortaleza. Eles agem no combate à poluição sonoras e intervêm em locais que não possuem alvará de funcionamento.

Em agosto de 2017, os dois shows do MC Lan foram cancelados por falta de certificado de conformidade do Corpo de Bombeiros. Os eventos estavam marcados para acontecer no Clube do Vaqueiro e na barraca de praia Sunrrise Brasil. O artista usou as redes sociais para dizer que o evento foi cancelado, pois "as autoridades brecaram achando que eu sou criminoso". Lan foi preso em 2010 e permaneceu preso por um ano e meio. Nos eventos, ele costuma usar colete balístico (a prova de balas).

No dia 5 de agosto, a festa de aniversário da casa de shows conhecida como Forró Damásio foi cancelada devido a uma blitz que acontecia na rua. A presença da Polícia teria afastado alguns frequentadores que teriam problemas com a Justiça. Em novembro de 2017, o proprietário do estabelecimento, Damásio de Sousa, de 42 anos, foi executado. Ele possuía cinco antecedentes criminais, sendo dois por tráfico de drogas e os outros por porte ilegal de arma de fogo e crime ambiental.

A última publicação no perfil da rede social do forró do Damásio é do dia 1º de fevereiro, após a morte do fundador e o fim das atividades festivas do lugar. "Hoje bateu uma saudades cruel. Do melhor forró de Fortaleza. Quando todas as quebrada (sic) junto curtindo. Rolava umas brigas, mas tudo era resolvido na conversa. Será que a malandragem não sente falta de curtir esse forró? Cadê a consciência desse povo meu Deus, será que um dia ainda vamos viver aquela "Paz" que tínhamos a (há) um tempo atrás", divulgou o perfil do evento.

O forró do Gago lembra um pouco o estilo do forró do Damásio. Dentro da periferia e frequentado por grupos de diversas comunidades. Após a chacina, o lugar deve dar espaço a um templo religioso.

Em agosto, havia acontecido um cerco ao forró do Gago, comandado pelo tenente-coronel Ricardo Moura. No dia, a Polícia havia recebido informações de que integrantes de facções estavam na festa. Foi apreendida uma pistola calibre .40. 

Criminalização das festas
A criminalização desses locais é uma preocupação para a Central Única das Favelas (Cufa), que tem acompanhado o fim das festas nas comunidades. Preto Zezé, que é o presidente da Cufa, disse que a entidade está preferindo o silêncio diante de tudo o que vem acontecendo, mas lembra do forró dos Trilhos, na barreira, que também foi extinto.

As festas nas comunidades da Grande Fortaleza são com bandas conhecidas popularmente como o Forró de Favela, que ganhou mais conhecimento do público após o surgimento da banda Conde do Forró. Os preços dos eventos são acessíveis, alguns com valores entre R$ 5 e R$ 15, em alguns ocasiões com entrada liberada, como era no caso do forró do Damásio. Diferente dos eventos de forró eletrônico, que promovem bandas que estão em alta e que possuem ingressos com valores de 200 e espaços privilegiados como lounges.

É preciso ocupar
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Para o advogado e presidente do Conselho de Segurança Pública, Leandro Vasques, na medida em que o cidadão comum teme sair de casa com medo da violência, os eventos passam a ser ocupados por pessoas de má índole. 

"O efeito colateral do medo faz com que as pessoas permaneçam em casa e os ambientes passam a ser cada vez mais visitados por integrantes do crime organizado. A síndrome do medo urbano é algo que silenciosamente vai dominando o meio social", relata.

O especialista em Segurança Pública, Ricardo Moura, fala sobre o problema das recomendações que são compartilhadas em redes sociais, que pedem que as pessoas não saiam de casa e que se recolham. "Isso é ruim para a vida da cidade. A cidade precisa ser ocupada. Tem Pré-Carnaval, tem restaurante, a gente precisa viver a cidade e não ficar recolhido, mas é preciso que a gente tenha o mínimo de segurança para aproveitar e curtir o momento de descontração e lazer", relata.

Ricardo Moura relata que as organizações criminosas estão demarcando espaços e que existe um jogo de ocupação por parte deles."O resultado dessa sensação de insegurança é o fechamento de locais por questões de segurança e o empobrecimento do lazer da população. Existe uma variedade de atrativos nas áreas ricas da cidade e um empobrecimento da vida cultural e possibilidade de lazer das pessoas de periferia", explica.

 

Redação O POVO Online