Programa traça estratégias contra assédio sexual em ônibus de Fortaleza

Através de iniciativas que buscam reduzir o número de casos de assédio sexual nos coletivos da Capital, a Prefeitura de Fortaleza trabalha para que, ainda no primeiro semestre de 2019, ações auxiliem na inibição dos crimes

08:00 | Mai. 17, 2019

Em março de 2019, a ferramenta Nina foi incorporada ao aplicativo Meu Ônibus como uma das primeiras ações para inibir o assédio sexual nos coletivos. (Foto: Kiko Silva/Divulgação)(foto: Kiko Silva/Divulgação)>

Em meio a um cenário no qual 5,2 milhões de mulheres no Brasil foram assediadas em transportes coletivos, somente no ano de 2016, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), a criação de iniciativas para reduzir o número se mostram necessárias. Na capital cearense, o Programa de Combate ao Assédio Sexual no Transporte Público, lançado no fim de 2018 pela Prefeitura de Fortaleza, apresentou uma série de medidas para trazer mais segurança para as usuárias de ônibus da Cidade.

A iniciativa, que integra várias frentes, é pioneira no Brasil. A coordenação do programa é da Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos (SCSP). De acordo com Bianca Macêdo, coordenadora do Programa, a iniciativa partiu do “entendimento de que o assédio sexual acomete a vida das mulheres que andam de ônibus”, conta. Devido ao número de mulheres nos coletivos ser maioria na Capital, cerca de 60% dos usuários, ações se fazem necessárias para promover tranquilidade e segurança a todas.

Durante a pesquisa para o desenvolvimento do Programa, foi identificado que dois problemas eram mais agravantes e comuns às usuárias: a impunidade dos casos de assédio sexual e a culpabilização da vítima. Por conta disso, o Programa desenvolveu ações que pudessem ser implementadas com velocidade. Bianca diz que a meta é colocar as ações em prática ainda no primeiro semestre de 2019.

Uma ação já colocada em prática pelo Programa de Combate ao Assédio Sexual no Transporte Público é o projeto Respeito Coletivo, lançado em conjunto com a ferramenta Nina, que passou a compor o aplicativo Meu Ônibus. São cartazes em ônibus, panfletagem em determinadas eventos, como já aconteceu em jogo de futebol entre Fortaleza e Ceará, além de vídeos veiculados em shoppings e áreas comerciais de Fortaleza.

Outras cinco ações ainda serão desenvolvidas para o Programa, como a melhora na iluminação de 200 paradas de ônibus em Fortaleza. Para isso, será montado um mapa colaborativo, no qual a própria população poderá apontar quais áreas são mais críticas. Outra questão é o desenvolvimento de um protocolo de ação imediata para que o flagrante do crime seja mais efetivo. Em complemento a esse último ponto, o Programa prevê a capacitação da Guarda Municipal, da Polícia Civil e dos operadores do transporte coletivo, como motoristas e trocadores, para conscientização sobre a problemática do tema.

Também será realizada uma pesquisa com participação de 500 usuários do transporte coletivo, entre homens e mulheres, com o objetivo de estabelecer a dimensão do problema do abuso sexual nos coletivos. O último ponto é sobre a flexibilização da parada fora do ponto à noite. Atualmente, os usuários já podem solicitar a ação entre 23 horas e 5 horas. A proposta é que o horário mínimo seja ampliado para começar mais cedo.

Denúncia rápida

Criado em 2015, o aplicativo Meu Ônibus tem como função primária trazer as rotas e os horários dos coletivos, além de mostrar a localização em tempo real do veículo. A partir de março de 2019, a ferramenta Nina foi incorporada ao aplicativo, como uma das primeiras ações para inibir o assédio sexual nos coletivos.

Funcionando por meio de um botão que pode ser ativado no próprio Meu Ônibus, o Nina solicita automaticamente os vídeos das câmeras de segurança do veículo em que a usuária está para registrar o momento do assédio, com intervalo de gravação de 30 minutos antes e 30 depois da ativação. Dessa forma, é possível reunir mais material que ateste o crime. Bianca conta que cerca de 500 denúncias já foram feitas desde o lançamento da função. Contudo, só 8% desse número se mostrou aplicável, pois é necessário que a denunciante faça login no aplicativo, para efetivar o registro do assédio sexual. A justificativa, diz a coordenadora, é para evitar os potenciais trotes no sistema.

De acordo com a criadora do Nina, Simony César, o projeto foi concebido durante uma participação em um hackathon (competição de programação). Usuária de transporte coletivo e filha de uma cobradora de ônibus, Simony relata já conhecer de perto o assédio sofrido pelas mulheres nos transportes. Em 2017, durante os primeiros testes, a criadora conta ter percebido que o Nina funcionaria melhor como uma funcionalidade que se integrasse a outros aplicativos, como é o caso do Meu Ônibus, de forma a estar presente em mais dispositivos.

Simony relata que a experiência está sendo recompensadora, por conta do retorno dado pelas usuárias do aplicativo. “A gente conversou com algumas usuárias que fizeram a denúncia dentro do aplicativo, e era só gratidão. Muitas disseram: ‘foi a primeira vez que fui amparada, que alguém acreditou em mim’. E o objetivo era esse”, diz. O próximo passo do Nina, explica Simony, é expandir para outras cidades brasileiras, seja por incentivo de editais ou por meio de parcerias com outros aplicativos.