Consumismo na infância requer atenção

Exposição a propagandas em mídias sociais, valores familiares e contexto social podem influenciar o consumismo em crianças. Recursos lúdicos para ensinar como lidar com dinheiro são dicas para os pais

07:00 | Jan. 01, 2019

Consumismo na infância requer atenção - Apaixonados por Gente (foto: Apaixonados por Gente)

Filipe Vasconcelos, 9, espera o ano inteiro para ganhar equipamentos eletrônicos como presente de aniversário. Enquanto a data não chega, pesquisa a internet sobre o equipamento que quer. Apesar do grande desejo do filho, a contadora Nadiele Vasconcelos Ribeiro, 30, diz que não cede e não o presenteia antes do dia acordado. Além disso, ela afirma que sempre mantém diálogo sobre consumo em casa.

“O Felipe é muito consumista nessa parte de eletrônico.” A contadora diz que o filho para em uma loja de tecnologia, por exemplo, e ficar lá olhando as coisas. A mãe acredita que o comportamento consumista se deve à idade e ao conteúdo visto na televisão e na internet, uma vez que o filho tem o costume de assistir a canais no YouTube sobre jogos.

“Eles [os youtubers] têm tudo. Têm um computador de última geração, um teclado que faz mil e uma coisas. Então, hoje em dia ele [o filho Felipe] está apresentando muito esse comportamento consumista. Fico bastante preocupada, mas eu tenho esse freio. Não deixo, não compro, para ele aprender que não é porque uma pessoa tem [algo] que a gente também tem que ter, que a gente pode ter ou que eu tenha que dar para ele, porque ele é uma criança”, defende.

Possíveis gatilhos do consumo

Segundo explica Raíssa Serpa, psicóloga do Hapvida, fatores como a exposição da criança a propagandas das mídias sociais que vinculam a ideia de diversão a determinado jogo ou brinquedo podem desenvolver comportamentos consumistas.

Além da exposição a propagandas, Raíssa Serpa aponta que os valores familiares também podem contribuir para esse comportamento na criança. Para ser um bom exemplo, Nadiele afirma que mudou as próprias atitudes quanto à compra de eletrônicos. Para a mãe, o acompanhamento de Filipe com uma psicóloga também a ajudou. “Descobri que, quando se é consumista na infância, isso pode causar um problema muito sério futuramente. Fiquei bastante preocupada e tentei realmente mudar”, lembra.

Uma saída encontrada pela contadora foi o diálogo constante em casa sobre o assunto. Ao trocar o celular, por exemplo, Nadiele explica o motivo da compra. “Tenho esse costume de conversar bastante com ele para falar porque estou fazendo aquilo, para ele não ver que aquilo ali é uma coisa supérflua, é uma coisa necessária.”

“Outro fator a ser analisado é o contexto social em que a criança se encontra, por exemplo a comparação que as crianças fazem no ambiente escolar entre colegas. O objeto diferente do colega pode despertar interesse naqueles que não têm determinados recursos”, acrescenta a psicóloga.

Quando a criança apresenta esse comportamento, os pais devem estar atentos às motivações que a levam ao consumo. “Se é sinal de algum sofrimento emocional, busca de pertencimento a algum grupo social, se é praticante ou vítima de bullying devido às comparações na escola, entre outras possibilidades.” Por isso, Raíssa defende a importância de existir diálogo entre as famílias e a escola.

Segundo a psicóloga, sentimentos como angústias e frustrações pela necessidade de “algo a mais” para ser feliz ou ter prazer podem impulsionar o consumismo. “A lógica pode ser devido ao fato de que algum objeto, brinquedo, recurso tecnológico ou lúdico pode ocasionar satisfação na criança momentaneamente e, após algum tempo, outro objeto será necessário, pois aquele não desperta mais curiosidade, uma vez que já foi utilizado, manipulado e conhecido.”

Consequências negativas

“Muitos brinquedos vendidos não exploram o potencial criativo e imaginativo das crianças por já virem prontos e com regras pré-estabelecidas”, alerta Raíssa. A habilidade social também pode sofrer impacto, uma vez que algumas propagandas enfatizam o egocentrismo e objetos como sinônimo de prazer, alegria e diversão. “Nessa lógica, o compartilhamento de situações e percepções das necessidades do outro ficam excluídas, o que dificulta o potencial de relacionamento interpessoal.”

Para lidar com os filhos

Uma atitude que os pais podem adotar é o estímulo ao pensamento crítico acerca do conteúdo que os filhos assistem e dos padrões sociais existentes. De forma lúdica, segundo Raíssa, os pais podem utilizar desenhos e histórias para simular o dinheiro e fazer as crianças se apropriarem do significado de cédulas e moedas, por exemplo. “Se essa criticidade em relação ao consumo for estimulada desde a infância, o sujeito pode vir a ser um adulto com melhores escolhas.”

Desde cedo, as crianças devem aprender, aos poucos, o conceito de dinheiro e o que é preciso para consegui-lo. “Também se deve aproximar as crianças da prática de realizar mercantil, pois é um ambiente em que se tem várias opções e que elas devem selecionar as mais importantes, com a ajuda dos pais ou responsáveis”, afirma a psicóloga.