Economista analisa os efeitos da Covid-19 no Brasil

Em artigo enviado ao O POVO, o diretor do Ibef Ceará, Renato Aguiar, destaca desafios como a dificuldade, ainda presente, para a definição de protocolos e indicadores que minimizem os custos econômicos decorrentes do isolamento social

16:31 | Mai. 06, 2020

Por: O Povo
Renato Aguiar é diretor do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças no Ceará (Ibef-CE) (foto: Divulgação/Ibef-CE)

A pandemia da Covid-19 trouxe vários desafios sanitários, de saúde pública, de convivência social, de mudanças de hábitos, rotinas pessoais e de trabalho, bem como para a mitigação dos perversos efeitos econômicos decorrentes dessas mudanças, em particular, do isolamento social, levando a interrupção temporária das atividades de vários negócios. E, consequentemente, a perdas de rendas com vendas, locações, salários, honorários, juros etc., com perversas repercussões nas taxas de desemprego e desigualdades sociais, já bastantes elevadas no País, o que torna o desafio ainda mais hercúleo do que nos países mais desenvolvidos.

Diante de uma problemática tão complexa, transversal, desafiadora e sem precedentes, coube aos governantes, sociedade civil organizada e aos indivíduos traçarem prioridades e abordagens de curto, médio e longo prazo, adotando a preservação da vida, como a meta mais importante e inegociável. Seguida da manutenção dos empregos, negócios, empreendimentos e projetos, chegando, em alguns casos, dado à relevância e importância de ambas, a gerar uma equivocada dicotomia entre elas.

Considerando a falta de modelos matemáticos, econométrico e/ou determinísticos, capazes de combinar as variáveis das dimensões de saúde e economia, bem como a falta de uma vacina e, até bem pouco tempo, de informações confiáveis, científicas e estatísticas sobre o novo vírus, seu processo de transmissão, índices de mortalidade, grupos de risco, necessidade de internações, tratamentos eficazes, quantidade de leitos necessários etc., restou aos governantes mundiais adotarem estratégias eventualmente distintas.

Mas que foram paulatinamente convergindo para a opção de isolamento social, seja vertical ou horizontal, como principal alternativa para a redução do ritmo de contágio, com o intuito de evitar o colapso da estrutura de saúde, com a consequente e indesejável elevação da quantidade de vítimas fatais, simplesmente pela impossibilidade de atendimento à demanda dos casos mais graves.

Não é à toa, a dificuldade, ainda presente, para a definição de protocolos e indicadores que minimizem os custos econômicos decorrentes desse isolamento, no sentido da identificação da condição e/ou momento ideal para a sua flexibilização. Exemplo disso são as distintas metodologias que já começaram a ser adotadas, por países que passaram pela fase mais aguda dessa pandemia, no tocante à abertura dos negócios não essenciais. Até mesmo porque há sempre o risco e a ameaça e novos ciclos de contágio, justificando, inclusive, a hesitação de alguns governantes, quanto a sua adoção, seja pelo risco do aumento de óbitos ou pelos custos adicionais da eventual necessidade de reversão dessa decisão.

Possibilidade de caos social

Independentemente dessa difícil decisão, ainda de caráter bastante subjetiva, os efeitos econômicos desse isolamento, não deixam de ser reais, indesejáveis e devastadores. Carecendo, portanto, de urgentes medidas econômicas, bem planejadas e eficazmente executadas,  a fim e mitigarem esses efeitos e evitarem os maléficos problemas acarretados pela perda de renda, empregos, recrudescimento da desigualdade social. Esta, inexoravelmente, acompanhada pela violência, fome e demais mazelas que, por fim, podem levar a um caos social.

Nesse sentido, as ferramentas de política monetária, cambial e fiscal devem ser utilizadas, nesse caso específico de pandemia e, em particular, no caso brasileiro, já com taxas de juros reais muito baixas e câmbio flutuante. Restam-nos poucas alternativas, além desta última, diga-se de passagem, já amplamente adotada por outros países, principalmente do G20. Inclusive com precedentes históricos, alicerçados na teoria keynesiana, adotada, de forma exitosa, na grande depressão de 1929.

Ou seja, a ampliação dos gastos públicos, na forma de investimentos, empréstimos de liquidez, subvenções sociais, dentre outros, objetivando proteger os agentes, empresas e/ou atividades mais vulneráveis, evitando, com isso, uma irreversível recuperação dos negócios, pós-pandemia.

Para tanto, o Governo Federal deverá assumir o protagonismo da adoção dessas políticas, ao passo que é o maior arrecadador de tributos, cerca de 60% do total, o único emissor de títulos públicos para a captação de recursos, o detentor e administrador das nossas reservas cambiais, garantias e acesso aos órgãos internacionais de financiamento, dentre outras prerrogativas. Por outro lado, os governos estaduais e municipais precisam focar na adoção e descrição das ações de isolamento, conforme as suas respectivas realidades sociais e geográficas, bem como na ampliação das suas estruturas de saúde, em face desse abrupto aumento de demanda.

Alternativas e desafios para os negócios

Aos gestores de negócios, portanto, cabe a identificação, compreensão, obtenção e implementação dessas oportunidades, além da renegociação do contas a pagar com os fornecedores, prestadores de serviços, instituições financeiras e demais parceiros. Sempre privilegiando o caixa e a liquidez, adaptando o modelo de negócios e processos, a exemplo do delivery e home office e traçando estratégias para a retomada das atividades. O controle do provável aumento da inadimplência também será outro grande desafio, seja para a preservação do caixa ou das relações comerciais, ambos imprescindíveis para a recuperação e sustentabilidade das empresas.

Aos colaboradores, flexibilidade e compreensão para a adoção das novas diretrizes, compromisso e responsabilidade na condução das atividades, quando possível, investimento constante na qualificação e, se necessário, abertura e disponibilidade da encarar novas funções e desafios. E, em último caso, para aqueles que já estavam desempregados ou perderam seus empregos, fé no processo de retomada da economia, atenção às oportunidade que irão surgir e obstinação na busca pela recolocação.

Aos investidores, evitem movimentos bruscos, no sentido da realocação de ativos, sob pena da realização de prejuízos, na medida do possível, sendo fiel às estratégias de investimentos, diversificação das aplicações e alocação dos recursos conforme perfil e idade.

Por fim, à sociedade como um todo, recomendo muita serenidade e união nesse momento delicado de pandemia, cuidados redobrados à saúde, obediência às recomendações governamentais, atenção às oportunidades advindas desse isolamento compulsório. Seja no tocante às novas rotinas, convívio com a família, solidariedade aos menos favorecidos e vulneráveis, sabedoria e parcimônia na avaliação e repercussão das mais variadas informações e opiniões. Estas amplamente divulgadas nos meios de comunicação, de modo a manter a saúde mental e foco no que realmente interessa e deva ser cultivado e incorporado, assim que essas crises sejam superaras.

Renato Aguiar, diretor do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças no Ceará (Ibef-CE)