Devendo conta de energia, mãe de criança com paralisia cerebral recorre à Defensoria Pública

"Quando falta energia é um desespero aqui em casa, porque meu filho precisa de equipamentos que ficam ligados na tomada. É um pânico", diz Angelinda Alves de Lima

04:55 | Dez. 08, 2021

Filme será divulgado para que todos tenham acesso (foto: Divulgação/ Defensoria Pública)

Seja para estudar ou trabalhar, o uso cotidiano de energia elétrica é indispensável para milhares de pessoas. No entanto, esse recurso é ainda mais necessário para os pacientes nomeados de eletrodependentes. Esses, não só precisam da energia elétrica para atividades rotineiras, como também dependem dela para viver

“Quando falta energia é um desespero aqui em casa, porque meu filho precisa de equipamentos que ficam ligados na tomada. É um pânico”. Este é o relato é da Maria Angelinda Alves de Lima, mãe de Robert. O garoto, de 11 anos, tem paralisia cerebral. Ele precisa de cuidados em tempo integral para auxiliar na alimentação com sonda e de aparelhos para aspiração de secreções nas vias respiratórias.

Os pacientes eletrodependentes demandam tratamento de saúde ou procedimento médico que requer uso continuado de energia elétrica. Por esse motivo, vivem uma realidade em que a disponibilidade da rede pode ser uma questão de vida ou morte.

O equipamento que desempenha esta função depende de energia elétrica diariamente e isso sobrecarrega o orçamento da família, que veio do município de Tauá, na região dos Inhamuns, para Fortaleza quando o quadro clínico de Robert se agravou. Após um período de internação da criança no Hospital Albert Sabin, mãe e filho foram liberados para continuar o tratamento em casa.

Já em casa, um novo problema surgiu: arcar com os altos valores da conta de energia elétrica. “As faturas começaram a vir no valor de R$500,00. Eu passo o dia cuidando do meu filho, sou mãe solteira, cuido dele 24 horas por dia, não tenho nenhum parente em Fortaleza, nossa renda vem do benefício assistencial, só um salário-mínimo. Isso mal dá pra pagar a luz porque eu tenho um mini leito hospitalar”, complementa Angelinda.

Com o aumento nos gastos com energia e a cobrança por parte da Enel, concessionária de eletricidade do Ceará, da quantia pendente, a família procurou o Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da Defensoria Pública que judicializou a ação. A Defensoria solicitou a suspensão da cobrança da dívida de energia elétrica existente decorrente da instalação do leito hospitalar em casa e a troca do medidor para outro específico.

No Núcleo, em 2021, já foram sete ações deste tipo. Nelas, a Defensoria pede que a Justiça determine a individualização dos medidores de energia elétrica (para que separem o consumo da casa dos aparelhos), dando obrigação ao Estado de custear a manutenção do tratamento homecare. Cinco ações pleiteadas foram deferidas e uma aguarda julgamento de mérito.

No processo, a defensora anexou a carta que a mãe escreveu ao juiz. “Venho aqui falar com o meu coração desesperado para que o senhor me conceda esse direito, para mim não pagar energia que meu filho precisa muito. Tenho 5 papéis para pagar, mas não tenho condições. Eu amo muito meu filho. Sempre vou lutar pelo bem do meu filho. Nunca baixarei a cabeça para nada”, escreveu a mãe.

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O processo foi tramitado para a 3a Vara da Infância e Juventude e deferido no dia 19 de outubro. A juíza Alda Maria Holanda Leite deferiu a liminar do pedido de urgência e determinou que a Enel não suspenda e nem interrompa a prestação de serviços de energia elétrica na casa da família de Angelinda, tendo em vista a necessidade de fornecimento ininterrupto de energia elétrica.

Atuante na 3a Vara da Infância e Juventude de Fortaleza, o defensor público Adriano Leitinho fala sobre o assunto. O defensor acredita que, para pacientes eletrodependentes, o fornecimento de energia elétrica representa o acesso à saúde, pois sem ela, os pacientes morrem.

"O direito à saúde deve ser amplo, universal e gratuito, ainda mais quando falamos de criança e adolescente, que devem ser tratados com prioridade absoluta. O custeio da energia elétrica pelo Estado e pela Enel nada mais é do que a garantia da efetivação do direito à saúde e de uma vida digna para os eletrodependentes, principalmente considerando que a grande maioria vive em situação de extrema vulnerabilidade”, destaca.

Quando o paciente é maior de idade, o processo tramita na Fazenda Pública. Para a defensora Marília Braga, supervisora das Defensorias da Fazenda Pública, estes casos seguem de forma célere, porque dizem respeito à vida das pessoas, mas o desfecho poderia ter um destino mais certo com o julgamento da Ação civil Pública que tramita desde 2010 e serem resolvidos coletivamente.

“Nós, defensores, temos uma grande expectativa no julgamento da Ação Civil Pública, já que poderá garantir de forma imediata e sem burocracia o direito à isenção de energia elétrica aos eletrodependentes, em razão da vital necessidade do equipamento elétrico para a preservação de suas vidas”, destaca Marília.

Enel

 

Em nota, a Enel informou que irá cumprir com a decisão judicial no que cabe à distribuidora. A Enel afirma que o custeio das contas de energia são de responsabilidade do Estado e que a unidade (a casa de Angelina) está cadastrada como cliente eletrodependente, estabelecido pela Resolução 414 da Agência Nacional de Energia Elétrica, "que estabelece o procedimento para a identificação de clientes eletrodependentes sendo necessária a apresentação da documentação que comprova o uso dos equipamentos, a cada 120 dias. A companhia esclarece ainda que, em caso de dúvidas, o cliente pode acessar o site www.enel.com.br e consultar a documentação necessária para a solicitação. A Enel Ceará reforça que mantém o cadastro atualizado dos clientes que fazem uso de aparelhos elétricos essenciais à vida."

Serviço

Se você se encontra nessa situação e não tem condições de arcar com as custas do processo e despesas de advogados particulares, basta entrar em contato com o Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas.

• Telefone: (85) 98895-5514 / (85) 98873-9535
• E-mail: ndhac@defensoria.ce.def.br

No site www.defensoria.ce.def.br, há um banner vermelho com os contatos de telefones e e-mails de todas as cidades que contam com a atuação de defensores públicos.

Atualizada às 07h51 de 09/12/2021

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