Outro segmento que atua na Marcha das Mulheres Negras cobra reparação é o LGBTQIA+.
“Temos como expectativa reafirmar nossas vozes, denunciar o racismo contra mulheres negras trans e fortalecer a luta coletiva por políticas públicas que garantam uma vida digna, saúde, trabalho e moradia”, disse Bruna Ravena, do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (Fonatrans). “Justiça social só existe quando a vida das mulheres trans é protegida, respeitada e celebrada”, completou.
Nas contas de Ruth Pinheiro, há 30 anos o Brasil desvia da discussão sobre reparação. Em 1993, a convite, ela esteve na Primeira Conferência Pan-Africana sobre Reparações, na Nigéria.
O tema avançou nos Estados e na Europa, por exemplo, onde, em 2023, até o jornal britânico The Guardian pediu e desculpas pelo envolvimento de seus fundadores com a escravidão e anunciou um programação de reparação financeira e histórica. No entanto, estagnou no Brasil, que não enviou uma representação à conferência. Pinheiro ficou com a responsabilidade de provocar o movimento social brasileiro.
“Eles [organizadores da conferência] achavam assim, o dia em que o Brasil reconhecesse essa necessidade, de reparação, os povos escravizados, seus descendentes, os efeitos da escravidão, até os dias de hoje os efeitos continuam, seria mais fácil para o resto do mundo entender e também reparar”, revelou. E, de lá, ela voltou com a ideia, que tem sido trabalhada por movimento negros e embasaram, por exemplo, ações afirmativas.
As medidas, no entanto, são insuficientes, olhando pela ótica das mulheres negras, avalia Pinheiro.
“Ação afirmativa tem um tema e um período para ser trabalhada. Mas os impactos do racismo são transversais. Quem vai reparar, por exemplo, a saúde mental de uma pessoa por exemplo, que sofre racismo uma vida inteira? As mães, que assistem a matança de seus filhos, sem oportunidades, em áreas periféricas, e não se recuperam, adoecem, com pressão alta, diabetes e doenças crônicas?”, questionou.
Simone, do MNU, movimento que acolheu a agenda, explica que o crime da escravidão é irreparável, mas o racismo, que segue hierarquizando vidas, determinando quem vai ter melhores escolas, empregos e salários, permanece uma ferramenta de lucro, como pode ser constatado pelos indicadores de escolarização e renda do IBGE.
Para discutir a reparação, tramita no Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 27/24 prevendo a criação de um fundo nacional, com objetivo de captar até R$ 20 bilhões, sendo o primeiro R$ 1 bilhão do orçamento da União para ações. Entre elas, recursos para empreendedores, negócios, projetos sociais e culturais.
O mecanismo deve ser administrado por um banco público e permitir várias formas de aportes. São aguardadas contribuições do Banco do Brasil, por exemplo, que se beneficiou do tráfico transatlântico, conforme denunciou o Ministério Público Federal.