Países pedem retirada da COP30 de Belém por altos preços de hotéis
00:01 | Ago. 02, 2025
Nações acusam "valores exorbitantes" de acomodações. Governos cogitam reduzir delegações ou não comparecer. "Há uma sensação, literalmente, de revolta", diz o presidente do evento, André Corrêa do Lago.O Brasil está sendo pressionado a realizar a COP30, conferência climática da ONU, fora de Belém. Parte dos 198 países esperados para participar da conferência sobre o clima em novembro expressa insatisfação com o que classificam como "preços exorbitantes" cobrados pelas acomodações na capital paraense. Diversas delegações poderão ser reduzidas ou forçadas a não comparecer diante das diárias cobradas por hotéis, afirmam governos, a pouco mais de cem dias do megaevento, marcado para 10 a 21 de novembro. "Há uma sensação, literalmente, de revolta dos países por essa insensibilidade, sobretudo por parte dos países em desenvolvimento", disse o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, nesta quinta-feira (31/07). "Ficou público que os países estão pedindo para o Brasil tirar a COP de Belém." Dois dias antes, uma reunião de emergência do órgão climático das Nações Unidas convocada pelo Grupo de Negociadores Africanos havia endereçado o impasse, reportou a agência Reuters. Já o jornal Folha de São Paulo teve acesso a uma carta assinada por 25 países negociadores, incluindo o Grupo de Negociadores Africanos e os Países Menos Desenvolvidos (LDC, em inglês). Entre os signatários, do texto estão também nações desenvolvidas, como Áustria, Bélgica, Canadá, República Tcheca, Finlândia, Holanda, Noruega, Suécia e Suíça. O texto pede condições mínimas de acomodação e custo, "seja em Belém ou em outro lugar", pelo menos no caso da cúpula de chefes de Estado, de 6 a 7 de novembro. Os signatários apontam que a participação só é viável se puderem "viajar até Belém, ficar em acomodações adequadas e acessíveis, e ir ao pavilhão e voltar de forma segura e eficiente em termos de tempo, inclusive tarde da noite". "Uma COP melhor" Nesta semana, o governo brasileiro prometeu endereçar as preocupações dos países e oferecer uma resposta até 11 de agosto, de acordo com o chefe do Grupo de Negociadores Africanos, Richard Muyungi. "O Brasil tem muitas opções para ter uma COP melhor, uma boa COP. É por isso que estamos pressionando para que o Brasil dê respostas melhores, em vez de nos dizer para limitar nossa delegação", disse ele. A ameaça de um pedido formal pela retirada do megaevento de Belém já havia sido ventilada durante a reunião preparatória para a COP30, que aconteceu em Bonn, na Alemanha, em junho deste ano, conforme reportou o site Sumaúma. Segundo Corrêa do Lago, o governo brasileiro está tentando convencer os hotéis a baixar os preços, mas a legislação não permite a imposição de limites. "Os esforços continuam, mas eu acredito, talvez, que os hotéis não estejam se dando conta da crise que estão provocando," disse o presidente da COP30. Em conversa com jornalistas nesta sexta-feira (01/08), o diplomata admitiu que o problema da falta de hospedagem a preços acessíveis ameaça a participação dos países mais pobres – e, por conseguinte, a "legitimidade" do evento –, mas reafirmou que Belém será mantida como sede. "A COP vai ser em Belém, o encontro de chefes de Estado vai ser em Belém, e não há nenhum plano B", declarou. Delegações reduzidas À imprensa, o Brasil vem negando que considere a alteração da sede da conferência, que espera 50 mil visitantes para os dez dias de megaevento. Autoridades de seis governos, incluindo nações europeias mais ricas, relataram à Reuters que ainda não garantiram acomodações, devido aos preços elevados em Belém. Cotações mostradas pelos países à agência giravam em torno de 700 dólares por noite (cerca de R$ 4 mil). O vice-ministro do Clima da Polônia, Krzysztof Bolesta, afirmou no início deste mês: "Não temos acomodações. Provavelmente teremos que reduzir a delegação ao mínimo. Em um caso extremo, talvez tenhamos que desistir de comparecer." Já a Holanda disse que poderá reduzir a delegação, enviando menos do que os seus habituais 90 membros. A oferta e os preços das acomodações já foram um problema em outras conferências do clima. "Na maioria das cidades onde as COPs aconteceram, os hotéis passaram a pedir o dobro ou triplo do valor. No caso de Belém, os hotéis estão pedindo mais de 10 vezes os valores normais", disse, ainda, o embaixador Corrêa do Lago. Organização da COP30 oferece cota de quartos com valores limitados Segundo a organização da COP30, a prioridade das reservas é para um grupo de 73 países composto, em sua maioria, pelos Países Menos Desenvolvidos e Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS, na sigla em inglês). Procurada pela DW, a assessoria do evento informou que as delegações desses países terão disponíveis 15 quartos individuais com diárias entre 100 e 200 dólares. Aos demais países serão oferecidos dez quartos individuais com tarifas entre 220 e 600 dólares. "O plano de acomodação está sendo implementado em fases, com prioridade, nesta etapa, para as delegações que participarão diretamente das negociações oficiais da COP30", disse a organização. Mas mesmo os valores reduzidos para países mais pobres, segundo Corrêa do Lago, estouram o orçamento dessas delegações. "Esses países se manifestaram de maneira muito clara na reunião. Disseram que, com a diária de 143 dólares que recebem, precisam de quartos entre 50 e 70 dólares para poder participar", explicou o diplomata nesta sexta-feira. Segundo ele, o problema não é falta de leito, e sim os valores "nitidamente acima do que esses países podem pagar". "Os hotéis estão botando preços tão altos que se tornaram referência." Busca por soluções A bolha hoteleira em Belém é provocada, em parte, pela limitação na quantidade de acomodações, apesar dos esforços para gerar mais leitos para a COP30, e pelas condições precárias em várias partes da cidade. Segundo dados oficiais, em 2022 havia apenas 12,2 mil unidades habitacionais de hospedagem, dos quais 91% eram hotéis. O Brasil diz que haverá acomodação para todos os países. No Booking.com, que fechou parceria com o governo do Pará, seis hotéis atualmente disponibilizados para as datas da conferência têm valores entre R$ 30 mil e R$ 297 mil para uma pessoa ao longo das onze noites do evento. A plataforma afirma que não interfere nos preços das reservas. Em julho, o governo brasileiro anunciou a contratação de dois navios de cruzeiro, que disponibilizarão 3,9 mil cabines, com capacidade de até 6 mil leitos, como hospedagem temporária. Outra aposta da organização foi o aluguel por temporada, o que fez explodirem neste ano os preços em plataformas do nicho, como o Airbnb, para até milhões de reais no período da COP30. Além disso, uma plataforma foi contratada para gerir as acomodações, uma solução já adotada em outras COPs. À DW, a organização da COP30 afirmou que o assunto deve voltar a ser discutido em reunião marcada para o dia 11 de agosto. "Estarão em pauta temas como acomodação, transporte, segurança, alimentação e outros aspectos essenciais para o sucesso da conferência", disse. ht/md/ra (Reuters, ots)