"Se eu fosse branco não seria abordado de tal forma", diz jovem negro acusado de roubar bicicleta

O jovem abriu um boletim de ocorrência contra o casal por calúnia, mas denúncia racismo na abordagem dos dois

10:15 | Jun. 16, 2021

Matheus mostrou a chave do equipamento, sacou o celular e chegou a mostrar fotos antigas dele na bike, mas não adiantou (foto: Reproduçã/Instagram @matheus_arpex)

"Se eu fosse um rapaz branco não teria sido abordado de tal forma", declarou o instrutor de surfe Matheus Ribeiro da Cruz, de 22 anos. Ele prestou depoimento na 14ª DP no Leblon, Rio de Janeiro, que investiga o caso em que o jovem negro foi abordado por um casal branco e foi acusado de roubar uma bicicleta. Segundo ele, a abordagem foi um ato de racismo por parte do casal.

O jovem conversou com o jornal O Globo e relatou sobre o sentimento de injustiça que sentiu quando foi abordado. "Na hora a gente fica muito em choque porque a gente não entende o porquê de estar acontecendo aquilo. O sentimento primeiro que vem é de susto e medo", afirmou sobre os primeiros momentos em que o casal o acusou de roubar a própria bicicleta. Ele foi ouvido na terça-feira, 15, e hoje, quarta-feira, 16, a jovem que teve sua bicicleta roubada e suspeito de Matheus foi chamada para prestar depoimento também.

No sábado, 12, Dia dos Namorados, Matheus esperava a namorada do lado de fora de um shopping no Leblon, considerada área nobre do Rio de Janeiro. Ele foi abordado por um casal que o acusava de roubar a bicicleta elétrica. O casal afirmava que tinha sido roubado há poucos minutos e continuaram insistindo com a abordagem, como mostram as imagens registradas por Matheus.

“Você pegou essa bicicleta ali agora, não foi?”, perguntou a jovem. Mesmo após o jovem negar, ela continuou: “É sim, essa bicicleta é minha”. Matheus teve que mostrar a chave do equipamento e chegou a mostrar fotos antigas dele no veículo elétrico, mas não adiantou. De acordo com o instrutor, o casal seguiu acusando, incisivamente, que ele havia roubado a bicicleta.

Sem a permissão do proprietário, o jovem branco retirou a trava de segurança da bicicleta do instrutor e testou a chave que portava, se convencendo que a bicicleta não era roubada. Em um desabafo nas redes sociais, o instrutor compartilhou os vídeos e afirmou que estava “sem clima de amor”. "E pra você, que é 'pretin' igual eu, seja cuidadoso ao andar em lugares assim. Eles vão te culpar, pra depois verem o que aconteceu", disse o jovem.

"Daí quando acabei percebendo que não era só uma dúvida, porque talvez se eu fosse um rapaz branco não teria sido abordado de tal forma. Se eu não fizesse o máximo possível para provar minha inocência ali, o menino já teria certeza de que eu era culpado", explica Matheus ao jornal.

Ao portal, a delegada Natacha Alves de Oliveira explica que está sendo apurado o crime de Calúnia pela falsa acusação do casal. Ela ressalta, entretanto, que não há elementos suficientes para enquadrar o crime como racismo. "Ele alega que foi abordado por ser negro. E a gente sabe que existe racismo estrutural no Brasil, isso é inegável. Mas nem sempre é o suficiente para se enquadrar no tipo penal", afirmou.

Casal demitido

 

Com a repercussão do caso, o casal foi demitido de suas posições. A ação aconteceu após cobrança de usuários nas redes sociais. A Papel Craft comunicou que desligou o funcionário, designer da marca, mas até agora, não se posicionou oficialmente.

Já a Espaço Vibre comunicou também na terça-feira, 15, em suas redes sociais que a jovem envolvida no caso, que é professora, foi demitida. A empresa afirmou por meio de nota que está "consternada" e "tratando o assunto com toda gravidade que ele merece".

"Nos solidarizamos com o Matheus pela dor sofrida e mesmo que o gesto condenável não tenha ocorrido dentro de nosso espaço, esta é uma violência que todos temos que combater juntos", afirmou a Espaço Vibre no comunicado.