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A interrogação sobre Dodge

2017-09-19 01:30:00
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Raquel Dodge assume a Procuradoria Geral da República em meio ao momento de maior instabilidade da história da instituição. É também o que ocorre com o sistema político inteiro, mas o comando do Ministério Público Federal tem suas peculiaridades. Tem sua crise particular, parte destacada do desarranjo generalizado. Rodrigo Janot deixou atrás de si rastro de suspeita sobre as motivações e os métodos da PGR, questionamentos sobre a condução das negociações das delações premiadas e dúvidas sobre a consistência e qualidade das denúncias apresentadas. Sem falar de crise com o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal (STF) e mal-estar instalado com o Congresso Nacional.

Dodge tem tarefa monumental e enfrenta suas próprias interrogações. Ao discursar, evitou atrito com o ausente Janot, mas expôs preocupação em apresentar denúncias mais fundamentadas. O caso da JBS escancarou o maior erro nas delações premiadas e expôs indícios de que a PGR pode ter sido manipulada ou mesmo teve ação direcionada com objetivo de prejudicar o presidente Michel Temer (PMDB). Ela precisa, então, estabelecer novos parâmetros.
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A nova procuradora-geral da República precisa, também, recompor os laços com Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Essa missão precisa, todavia, respeitar certo limite. Presidente, ministros, deputados e senadores são alvo de investigações. Daí se concluir que o mal-estar desses dois poderes em relação a Janot foi motivada pelo fato de serem eles próprios alvos do Ministério Público. A repactuação com as instituições não pode ser feita ao custo de cessar as apurações. A PGR não pode deixar de fustigar suspeitos de corrupção, em nome da suposta pacificação. Porém, será possível levar adiante os inquéritos e processos e, ao mesmo tempo, reaproximar-se de poderes que têm investigados como dirigentes?

E aí entram as interrogações sobre a própria Dodge. Com todos os incontáveis problemas ocorridos no período de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff (ambos PT), nunca esteve em questão a independência do Ministério Público. Cláudio Fonteles, os cearenses Antonio Fernando de Souza e Roberto Gurgel e, por último, Janot foram todos nomeados após serem os mais votados entre os membros do Ministério Público Federal. Neste ano, Temer escolheu Dodge, segunda colocada na votação, atrás de Nicolao Dino.

A nova procuradora-geral tampouco ajudou a própria imagem ao se reunir às altas horas da noite, fora da agenda oficial, com o presidente Michel Temer. Isso quando ela já havia sido indicada por ele para ocupar a Procuradoria Geral que o denunciava naquele momento. Tudo muito inadequado.

Ela assume no meio de um turbilhão e sob intensa vigilância. Terá de dar sinais, a um tempo, de pacificação e independência. Terá de se equilibrar nessa tarefa. Ser política e mostrar firmeza.

HISTÓRICO
A última vez em que o titular da PGR não foi o mais votado foi em 2001, na primeira vez em que a lista foi realizada, no penúltimo ano de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Naquela época, venceu a votação Antonio Fernando, seguido por Cláudio Fonteles, ambos futuramente procuradores-gerais. FHC, todavia, preferiu reconduzir Geraldo Brindeiro, pela terceira vez. Ele havia sido o sétimo mais votado. Em todos os mandatos, notabilizou-se por não criar problema algum para o Palácio do Planalto.

 

A ALTERNATIVA
Primeiro colocado na lista tríplice, Dino era o candidato de Janot. É irmão do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB). Fosse ele o indicado, também haveria suspeitas sobre a PGR, pelo motivo oposto. O ingrediente político seria tão intenso quanto.

MOTIVAÇÕES
A política do Ceará é pródiga desde sempre em alianças esdrúxulas, mas esta que se desenha entre Ferreira Gomes e Eunício Oliveira (PMDB) é candidata a mais bizarra.

Os grupos não gostam um do outro — na verdade se detestam. Não compartilham projetos, ideias, nada. Não confiam um no outro.

Mas, podem estar juntos pelo medo de serem derrotados pelo poder que um dos lados possui no âmbito nacional e outro, no local.

 

Érico Firmo

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