Corrupção pública e privada
Existem bons argumentos a favor das privatizações e falar em reduzir a estrutura estatal para diminuir a corrupção não é um deles. Há dois problemas nesse raciocínio, pelo menos: pressupõe que pode haver corrupção naquilo que restar de Estado. O que, obviamente, é grave. É necessário criar mecanismos de controle e transparência com qualquer tamanho do aparato governamental.
Mas, o principal problema: Odebrecht e JBS são dois exemplos de como há corrupção também no setor privado. Muitas vezes, a propina privada por favores diversos do setor público — contratos, financiamentos, permissões — movimentam volumes muito maiores da corrupção.
Muito além dos desvios de recursos do orçamento federal, o que vem sendo exposto é que a maior corrupção consiste em subornar agentes públicos de modo a obter contratos governamentais para entes privados. Tipo de fraude mais rentável e que deixa menos rastros. Quando se desvia dinheiro público, é difícil disfarçar o rombo. Mas, ao garantir o contrato, o serviço é prestado, o lucro é garantido. Mas, a concorrência é burlada. Costuma sair mais caro. O interesse público sempre paga a conta.
DIREITA E ESQUERDA PARA ALÉM DO ESTADO
Quem entrou há pouco tempo na discussão sobre direita e esquerda pensa que a questão sempre foi o tamanho do Estado. Não é assim historicamente, nem é assim hoje no mundo todo. Os conceitos se adaptam e se transformam no tempo e no espaço. Na Revolução Francesa, quando esses conceitos surgem, direita e esquerda exprimiam duas correntes de revolucionários: moderados e radicais.No começo do século XIX, a grande dicotomia política era entre liberais e conservadores. Ser liberal, nessa época, era revolucionário. O conservadorismo era reação ao Iluminismo, à Revolução Francesa. Lutava pela restauração do Antigo Regime e das ideias absolutistas. Nada mais estatizante que essa direita clássica.
Já as ideias socialistas, em sua origem, eram antiestatizantes. Eram próximas do anarquismo, aliás. Uma das divergências entre os marxistas e o anarquista Mikhail Ba%u018Dkunin era porque este último discordava da necessidade de manter um Estado, mesmo transitório, como propunha Karl Marx. O filósofo francês de origem argelina Louis Althusser falava dos “aparelhos ideológicos” estatais como força repressora. O italiano Antonio Gramsci reforçava se tratar o Estado de instrumento de dominação e coerção da burguesia.
Na I Guerra Mundial, a esquerda não se apegava à ideia de Estado, muito menos de nação, daí se opor à guerra. Na tradição leninista e stalinista, a esquerda se torna radicalmente estatizante. Essa é a matriz principal da esquerda brasileira, em torno do antigo partidão. O PT, sob influência gramsciana, não nasce estatista. Os esquerdistas brasileiros e na América Latina são mais adeptos da estatização do que na maior parte do mundo.
Por outro lado, a UDN, partido que talvez melhor representou a direita no Brasil, chegou a votar a favor da emenda que fortaleceu o caráter estatal da Petrobras - o texto original do governo Getúlio Vargas configurava praticamente uma empresa de economia mista, já à época. Donald Trump, que creio ninguém discordar de ser alguém de direita, adota reiteradamente medidas protecionistas e de fortalecimento do mercado nacional, em detrimento do livre comércio.
Esses conceitos de esquerda e direita não são tão simples e lineares. Tampouco se repetem de forma idêntica em todos os países. Ser de esquerda na Espanha não é sinônimo do PT. Centro, no Reino Unido, não é um PMDB. A direita alemã tampouco é o DEM.
[FOTO1]UBER E A INICIATIVA POPULAR
A coluna de quinta-feira mencionou como a falta de regulamentação do Uber causa prejuízo para taxistas em Fortaleza. Os motoristas vinculados ao aplicativo circulam do mesmo jeito, a fiscalização não consegue nem remotamente inibi-los e, por ora, a Justiça dá razão a eles. E prestam serviço sem cumprir com nenhuma exigência legal, em concorrência desleal em relação aos taxistas. Ninguém mais que os motoristas de táxi deveria estar interessado na regulamentação.A Prefeitura quer aguardar posição do Congresso Nacional, que, convenhamos, anda mais preocupado com outras coisas. A Câmara Municipal não encaminha o tema. Diante disso, o presidente municipal do PT, Acrísio Sena, propôs que seja formulado projeto de iniciativa popular sobre o assunto. São necessárias 80 mil assinaturas. Diante disso, a Câmara tem obrigação de decidir sobre o assunto, contra ou a favor. O vereador disse que pautará a questão no PT. É uma boa maneira de forçar os representantes do povo a se posicionar.
Érico Firmo