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O tamanho da sobrevida

2017-07-12 01:30:00

A aprovação da reforma trabalhista era a única forma de dar fôlego a Michel Temer (PMDB). A sinalização de que será capaz de aprovar reformas é a única chance de as forças que o apoiam aceitarem o desgaste de tentar segurá-lo. A questão é o tamanho dessa sobrevida. Primeiro, porque muita gente que votou com a reforma já não apoia Temer. Sobretudo no PSDB. Além disso, a aprovação foi um tanto tumultuada, com o Senado tendo ficado às escuras e sob protesto que deixou evidente a insatisfação. Em comparação com a reforma da Previdência, a trabalhista é quase uma moleza para ser aprovada. Como se trata de emenda constitucional, são necessários três quintos dos votos. Na Câmara, a trabalhista passou com 296 votos. Faltariam 12 para mudar a Previdência. No Senado, a trabalhista teve 50 votos, um a mais que o mínimo necessário para emendar a Constituição. Como agravante, a mudança na Previdência é ainda mais polêmica. De modo que o governo mostrou que ainda tem alguma força e capacidade de articulação. Mas ela não é tão grande. Assim como a medida do fôlego conquistado.


O “PÉ DE BOI” DE CAMILO

O gesto do governador Camilo Santana (PT) de participar de transmissão ao vivo pelo Facebook com o secretário André Costa é um ato de apoio ao gestor da Segurança Pública, em momento de resultados péssimos na área.

A entrada de Costa representou, sobretudo, mudança de estilo na secretaria. O antecessor, Delci Teixeira, era discreto, reservado. Seu substituto é homem de ação, de rua. Mais jovem, não se notabiliza como alguém de gabinete. Acompanha operações, está perto dos policiais na rua. Isso pode ser ótimo e essa integração com a tropa pode ajudar bastante. Não substitui, entretanto, a estratégia e a gestão. Cabe ao secretário, principalmente, a definição das políticas de segurança. Isso até agora não tem dado resultado, para dizer o mínimo.


Lembra um pouco o segundo governo Cid Gomes (PDT). Naquela época, saiu o secretário Roberto Monteiro, de perfil intelectualizado e lembrado pelas indefectíveis gravatas borboletas. Entrou o coronel Francisco Bezerra, a quem o então governador definia como “pé de boi”. Homem de ação, de rua. Também era presença constante em operações. Vez por outra trocava tiros com criminosos.


Costa é mais refinado, mais sofisticado que Bezerra. Não chega a ser um formulador, mas tem suas qualidades. O estilo de atuação, entretanto, possui semelhanças com o secretário dos mais tenebrosos anos de Cid Gomes na segurança. Os resultados até aqui, tragicamente, também se assemelham.


Outro paralelo que é quando Cid, no fim de 2013, mergulhou num tanque em Itapipoca para verificar defeito em adutora. O ex-governador é engenheiro e é elogiável a disposição para colocar a mão na massa. Mas não é isso que se espera do gestor.


Não dá para o chefe do Executivo consertar todas as estruturas defeituosas do Estado, assim como o secretário da Segurança não vai prender todos os bandidos. Do governador se espera que conduza uma administração na qual haja obras de qualidade que não apresentem defeito de cara. E, quando reparos necessários forem, ocorram dentro de sistema de manutenção. Da mesma forma que, na segurança, o que mais se necessita é de gestão, não de um policial a mais nas ruas. Estar ao lado da tropa é ótimo, desde que não tome o lugar da estratégia, planejamento e definição das políticas do setor.


Na coluna de ontem, já havia comentado a gestão na segurança. Leia acessando este link: http://bit.ly/resultadoandrecosta


POLÍTICA DE ESTADO

Em ponto de vista publicado no O POVO de sábado, Pedro Queiroz, diretor-presidente da Associação de Praças da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros do Ceará (Aspramece), levantou questão interessante. A segurança pública não teve até hoje status de política de Estado, como ocorre na saúde e, principalmente, na educação.

Nessa última área, a continuidade de políticas no longo prazo, independentemente da mudança de gestores e governos, fez do Ceará referência nacional. Na saúde não há nem de longe tanto sucesso, mas há o mínimo de continuidade que evita que a crise seja ainda pior. Ainda que haja muito a melhorar.


Na segurança, porém, o modelo de gestão e o rumo político não resiste nem à mudança de secretário dentro de um mesmo governo, que dirá às mudanças de gestão. No governo Cid, havia uma concepção com Roberto Monteiro, outra diametralmente oposta com o coronel Bezerra e uma terceira com Servilho Paiva. No governo Camilo, Delci ensaiou a continuidade em relação a Paiva. Mas Costa representou guinada — até aqui bem desastrada.


O problema vai além dos nomes. O Ceará não conseguiu até hoje construir uma política de Estado consolidada e impessoal para a segurança. O perfil do secretário é o principal parâmetro para as ações do setor. Personalismo nunca costumou dar em boa coisa. É sintoma do nosso atraso numa área sensível como poucas outras.

 

Érico Firmo

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