PUBLICIDADE
VERSÃO IMPRESSA

TSE desfere golpe duro na Lava Jato

2017-06-10 01:30:00
NULL
NULL

A maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) resolveu ignorar um caixa de R$ 150 milhões, disponibilizado por Marcelo Odebrecht, para abastecer a chapa vencedora nas eleições de 2014, formada por Dilma Rousseff, presidente afastada, e Michel Temer, que assumiu em seu lugar. O colegiado desconsiderou também o fato de que a própria Corte Eleitoral se transformou em lavanderia de dinheiro sujo. Por fim, tratou também de fazer vista grossa à compra de partidos por meio de gastos remetidos a empresas de fachada e ao pagamento, por caixa 2, ao casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura.


Como explicitou o relator do processo, ministro Herman Benjamin, num voto caudaloso mas sempre cristalino, o conjunto probatório de crime eleitoral atribuído por ele à petista e ao peemedebista é oceânico. Ora, parte dos colegas de Benjamin não negou isso, e houve mesmo quem admitisse assombro diante do esquema tentacular formado pelo triângulo Petrobras-Governo-empreiteiras. Caso de Tarcísio Vieira e Admar Gonzaga, ambos indicados por Temer para as vagas no TSE há menos de dois meses, quando a parte final do julgamento já estava em curso.


O que se viu ontem, na corte mais importante da Justiça Eleitoral, foi uma cegueira deliberada. Quatro dos sete ministros fecharam os olhos para o oceano de irregularidades supostamente praticadas pela chapa e convenientemente se concentraram no grão de areia, uma ninharia processual que, invocada como tábua de salvação argumentativa, terminou por se sobrepor às duras acusações imputadas às condutas da ex-chefe do Planalto e do atual.

[FOTO1]

As consequências diretas da decisão do TSE são imensas, a começar pelo precedente que se abre nas demais esferas eleitorais que julgam contas de prefeitos, vereadores e governadores - com que cara os magistrados dirão agora que um vereador de uma cidadezinha do interior cometeu crime eleitoral? Mas não para aí: o resultado do julgamento de Temer e Dilma reflete um acerto de contas com a Operação Lava Jato pelo qual Gilmar Mendes tanto esperava. Não à toa, o ministro, alinhado a outros, referiu-se um sem número de vezes às delações, de modo a desqualificá-las, e atacou, também numa quantidade razoável de oportunidades, o Ministério Público Federal e a Procuradoria-Geral da República, que estão à frente das investigações que apuram o maior esquema de corrupção do País.


Quando proferiu seu voto decisivo, desempatando a disputa a favor de Temer e livrando o presidente da cassação, Mendes tinha os olhos não apenas no processo ajuizado pelo PSDB no já distante ano de 2014. O presidente do TSE mirava, sobretudo, na queda de braço que o aguarda no Supremo Tribunal Federal (STF) nas próximas semanas, quando os inquéritos da lista de Edson Fachin se transformarem em denúncias e daí em ações penais.

[QUOTE1]

Finalmente, o placar de 4 a 3 expõe um traço culturalmente reconhecido por qualquer brasileiro: o jeitinho. Arraigado na vida do País, é possível encontrá-lo tanto na sessão que condenou Dilma ao afastamento, mas preservou seus direitos políticos, num exemplo de como se misturam, numa mesma decisão, a rigidez da previsão legal com a flexibilidade da norma social.


Também pode ser visto quando o então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), foi alvo de decisão liminar do ministro do Supremo Marco Aurélio Mello determinando que se afastasse imediatamente da presidência da Casa. À época, o plenário do STF, já sob Cármen Lúcia, resolveu o impasse à brasileira: assegurou a Renan o comando do Senado, mas excluído da linha sucessória.


Expediente parecido foi utilizado ontem no TSE: a pretexto de garantir a estabilidade política e respeitar a soberania do voto popular - que não foi levada em consideração quando do impeachment -, a Corte Eleitoral ignorou todo o Everest de provas amontoadas no plenário pelo ministro relator.


Henrique Araújo

Jornalista, editor-adjunto de Conjuntura do O POVO

Escreve esta coluna interinamente de terça a sábado

 

Adriano Nogueira

TAGS