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Visualizando os acordes musicais

2017-06-17 17:00:00
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José Evangelista

 

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Existe uma simbiose entre a música e a matemática que vem da mais remota antiguidade. Pitágoras e seus discípulos, cinco séculos antes de Cristo, observaram que os sons de cordas vibrantes são agradáveis aos nossos ouvidos quando combinados em grupos nos quais as frequências seguem proporções de números inteiros pequenos, como 3/2 ou 5/4.


Essa escala natural, ou pitagórica, foi substituída por outra na qual as frequências sonoras estão igualmente divididas em intervalos iguais. Essa é a escala dita temperada, usada desde a Renascença. Na escala temperada, as relações entre as frequências das notas aproximam-se, mas não são iguais, a frações de números inteiros.


Um acorde musical é um conjunto de 3 ou 4 notas tocadas simultaneamente. Os músicos sabem quais são essas notas para que o som emitido seja considerado harmonioso pelos ouvintes. Um acorde de DO maior, por exemplo, é formado pelas notas DO (a tônica), MI, SOL e outro DO com o dobro da frequência do primeiro. Na afinação do violão ou do piano, as frequências desses sons seguem o padrão temperado e não o pitagórico.


O físico José Maurício Matos, professor aposentado da Universidade Federal do Ceará, que também é músico e compositor, usa o computador para investigar as simetrias inerentes aos sons dos acordes, tanto do ponto de vista auditivo quando visual. Uma das técnicas que ele usa foi introduzida pelo matemático francês Henri Poincaré e mostra, em um gráfico, a relação de uma onda sonora senoidal em duas fases separadas por uma diferença bem determinada.


A onda correspondente a uma nota qualquer, nesse tipo de gráfico, aparece como uma curva fechada conhecida como “figura de Lissajous”. Combinando duas ou mais notas em um acorde o resultado é mais elaborado. O interesse de Maurício é buscar uma relação visual entre esses gráficos e a sonoridade dos acordes.

 

Nos gráficos das figuras ao lado, vemos a composição de um acorde formado por quatro notas, cada uma delas sendo uma onda senoidal. A onda x1 é a tônica do acorde, x2 é a onda com o dobro da frequência (uma escala acima), x3 é a onda da nota chamada de “terça”, com frequência 5/4 da tônica, na escala pitagórica, e x5 é a onda correspondente à “quinta”, com frequência igual a 3/2 da frequência da tônica.


Os gráficos da figura A foram obtidos com o mesmo acorde do tipo maior em três situações. Podem ser, por exemplo, construídos com as frequências do conjunto DO, MI, SOL e DO, que é o acorde de DO maior. No primeiro gráfico, as frequências seguem o padrão pitagórico e a curva obtida é fechada, como deveria ser, já que as notas se relacionam por números inteiros.


Esse gráfico, na verdade, seria criado pelo som gerado em um computador, tendo duração temporal ilimitada. É claro que isso nunca ocorre em um acorde emitido por um instrumento real, já que o som vai gradualmente perdendo intensidade, abafado pelos atritos normais no ar e no próprio instrumento. Maurício simula esse efeito acrescentando um termo de amortecimento às ondas do acorde. É o que vemos no segundo gráfico.


É curioso observar como fica o gráfico no caso do mesmo acorde na escala temperada, como é usado atualmente. Nesse caso, como as notas não guardam mais as relações exatas entre números inteiros, as curvas não fecham e o gráfico é bem mais rico e complexo, como vemos no terceiro caso da figura A.


Uma das motivações iniciais desse estudo foi procurar uma ilustração visual da diferença entre acordes maiores e menores. Os músicos costumam dizer que os acordes menores soam mais melancólicos que os maiores, mas isso é subjetivo. Como se sabe, a única diferença entre um acorde maior e seu correspondente menor reside nas relações da terceira nota com a tônica, que é 5/4 no acorde maior e 6/5 no menor.


Os três gráficos da figura B correspondem às mesmas condições da figura A, apenas trocando por acordes menores. É evidente a maior complexidade das curvas nesses gráficos. Como isso se relaciona com as sensações auditivas ainda é objeto de estudo.

 

Quem estiver interessado em conhecer mais detalhes sobre os trabalhos de Maurício, pode contatá-lo no endereço: jmauriciomatos@uol.com.br

Adriano Nogueira

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