Passei minha infância e adolescência jogando bola nos campos de várzea. Quando a bola chegava aos meus pés, queria sair driblando quem aparecesse à minha frente. Tinha habilidades e só me paravam com falta. Reclamava. Ouvia: "Futebol é pra homem"!

Depois me tornei profissional. Ouvi, li e vi a mídia esportiva associando o erotismo da relação bola-mulher. "Comeu a bola". "Entrou com bola e tudo". "Cuidado com as Marias Chuteiras". "Se o goleiro for casado deve dormir abraçado com a bola e a mulher".

Diante dessas frases, fica claro a redução da imagem da mulher à condição de objeto, e, se olharmos pelo lado afetivo, encontraremos algum aspecto carinhoso, tipo "musa inspiradora". Ainda assim perceberemos o preconceito, colocando a mulher em plano inferior.

Esse preconceito se arrastou através dos tempos e foi oficializado em 1941, através do decreto-lei 3199/41, do então presidente Getúlio Vargas. Nele, rezava o artigo 54 que não era permitida a prática de qualquer esporte "incompatível com a natureza feminina".

Não é de se estranhar, portanto, o tempo em que as mulheres brincavam de boneca e os homens brincavam com a bola. Com o tempo, as coisas foram mudando e a lei também mudou. Hoje em dia tem garoto que brinca de boneca e menina que joga bola.

Esse entendimento implica numa compreensão do papel da mulher na sociedade atual, não como refém de leis que tolhem sua energia, mas da sua importância nas diferentes áreas de atuação profissional. Sejam elas tarefas de trabalho ou situações de entretenimento.

E nem precisa brilhar tanto como Marta. A goleadora brasileira, numa história de superação e conquistas, atingiu o ápice de uma carreira no futebol ao ser eleita por seis vezes a melhor jogadora do mundo. É ainda a maior artilheira de todas as Copas do Mundo.

Dentro da minha casa tenho exemplos do que escrevo. Bárbara jogou basquetebol pelo Clube Diários e Clarice, minha outra filha, jogou futebol de praia pelo Dínamo de Copacabana. Hoje em dia não jogam, mas recordam com prazer. O lugar de uma mulher é onde ela quiser.