O Lula em pleno aquecimento para a ONU que recebeu a BBC
Entrevista à BBC foi a primeira vez que Lula falou à imprensa internacional desde a condenação de Jair Bolsonaro (PL).
18:23 | Set. 18, 2025
Luiz Inácio Lula da Silva entrou na biblioteca do Palácio da Alvorada atento à posição das câmeras e refletores montados pela equipe da BBC para sua entrevista.
"Os livros estão aparecendo?"
"Estão, sim, presidente, quer ver aqui?", respondeu o fotógrafo Ricardo Stuckert, que acompanha Lula desde 2002 anos e é a última palavra sobre a imagem do presidente.
Lula declinou de olhar os monitores, que, sim enquadravam o paredão de livros de capas duras vermelhas, azuis, verde-escuro.
Nas prateleiras, clássicos e cânones, todo o Machado de Assis, muitos volumes do jurista Affonso Arinos, e destoando pela modernidade da lombada, um exemplar de "Os presidentes: a história dos que mandaram e desmandaram no Brasil, de Deodoro a Bolsonaro", do jornalista Rodrigo Vizeu.
De terno azul marinho, camisa azul clara e uma gravata vermelha, Lula tinha o semblante descansado. Nas mãos, carregava uma pasta com o brasão da Presidência da República e páginas impressas de sua preparação para a entrevista.
Nos minutos que antecediam a conversa, negociada por meses e que fiz com a colega da BBC News, Ione Wells, Lula parecia focado. Poucas palavras.
Tentei imitar o que vi muitos colegas veteranos em Brasília fazerem para tentar atraí-lo e quebrar o gelo: falei do Corinthians.
"Nessa discussão de vistos, o senhor já está querendo naturalizar o Depay?", perguntei, meio sem jeito, citando o atacante holandês Memphis Depay, esperança da equipe alvo da paixão do presidente de retomar pujança.
"Não sei. Precisa jogar, né?".
Lula não caiu.
"Estamos prontos", disse o presidente.
A entrevista começa. Foi a primeira vez que Lula falou à imprensa internacional desde que seu principal adversário político, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), foi condenado a 27 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pelo crime de tentativa de golpe de Estado e outros delitos.
"Não é questão de política, é de justiça", diria em um momento, numa conversa em que pouquíssimas vezes chamou Bolsonaro pelo nome.
Anistia para Bolsonaro? Nem pensar, ele prometeu vetar, se chegasse às suas mãos. Mas evitou dar a mesma resposta assertiva quando a pergunta foi: e para os condenados do 8 de janeiro, o senhor concordaria como uma anistia?
A entrevista também coincidiu com a proximidade da viagem de Lula aos Estados Unidos para participar da Assembleia Geral das Nações Unidas, a primeira vez que o brasileiro irá ao país depois que o presidente Donald Trump anunciou o tarifaço de 50% a produtos brasileiros citando seu desagrado com o julgamento de Bolsonaro.
"O comportamento dele é muito ruim para a democracia", diz, não rejeitando a associação entre Trump e fascismo feita no passado. 'Se for necessário negociar com o Trump na hora, eu negocio e converso com o Trump'.
Sentados próximos às portas de vidro de quase 3 metros de altura da biblioteca, uma estrutura desenhada por Oscar Niemeyer e tombada pelo Patrimonio Nacional, assessores e o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Sidônio Palmeira, controlavam o tempo acordado da entrevista com um cronômetro em mãos: 30 minutos.
Fim de jogo. Começa a fase de desmontar a parafernália das gravações na biblioteca - que já foi palco das entrevistas de Dilma Rousseff na fase final do processo de impeachment, foi fundo de tela de centenas de lives de Jair Bolsonaro e que, segundo o delator Mauro Cid, abrigou a discussão da chamada minuta do golpe no governo anterior.
Aproveito para explorar os últimos minutos de interação, enquanto Lula cumprimenta assessores e parte da equipe de jornalistas que acompanhava a gravação.
Mais relaxado, o presidente se mostra em pleno aquecimento para a ONU, onde fará pela 11ª vez, o discurso de abertura da Assembleia -Geral.
Falou com sobre os diversos encontros que teve com o ex-presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, durante suas passagens pela ONU.
"Ele costumava chegar mais cedo e a gente se encontrava. Tivemos bons encontros", lembra. "Com o Obama foi menos", disse.
Se vai ficar cara a cara com Trump, em parte, dependerá, ele explica, da hora em que o republicano decida chegar.
Quando Lula já está prestes a ir embora, minha chefe, Flávia Marreiro, resolve tentar um último golpe de interação. Ela pergunta sobre os treinos de musculação dos quais o presidente se orgulha a ponto de postá-los, com frequência, em suas redes sociais - uma exibição de saúde rumo a uma possível campanha por um quarto mandato em 2026.
"Eu treino muito perna. Acordei 5h30 pra malhar. Estou com as pernas doloridas de tanto malhar", disse o presidente que completa 80 anos em 10 dias.
"Mas quanto peso o senhor puxa, presidente?" – em entrevista no fim de semana à Folha de S. Paulo, a primeira-dama Janja da Silva disse ter se espantado com "tanto peso" nas máquinas usadas por Lula.
Mas, marombeiro modesto, ele responde: "Deixa pra lá. Ninguém precisa saber disso".