Agência BBC

Os restos mortais de jovem desaparecido que foram encontrados em obra após 40 anos

O irmão da vítima conversou com a BBC News Mundo sobre a descoberta dos restos mortais de Diego Fernández e o impacto que isso teve em sua família

15:53 | Ago. 20, 2025

Por: Cecilia Barría - BBC News Mundo

Biblioteca Nacional/Revista ¡Esto!
Restos de Diego foram enterrados no jardim da casa de um colega de escola

Diego Fernández saiu de casa às 14h de 26 de julho de 1984. Segurando uma tangerina, despediu-se da mãe, dizendo que visitaria uma amiga antes de ir para a escola.

Ele nunca mais voltou.

Mais de quatro décadas depois, em maio de 2025 , operários que construíam um muro em uma casa no bairro de Coghlan, em Buenos Aires, encontraram ossos enterrados e avisaram a polícia.

Junto aos restos mortais havia um relógio com calculadora Casio, um chaveiro, uma gravata-borboleta, uma etiqueta de roupa e uma moeda.

Testes de DNA confirmaram a identidade do adolescente desaparecido havia quatro décadas.

O caso ganhou ampla cobertura da imprensa argentina porque, inicialmente, foi informado que os restos mortais estavam em uma casa onde o cantor Gustavo Cerati viveu por um tempo. Depois, esclareceu-se que era o imóvel ao lado.

Embora o prazo de prescrição para o crime contra Diego tenha passado, a Justiça argentina investigará o caso como homicídio para identificar o autor e a motivação.

Peritos forenses designados para o caso encontraram sinais de ferimentos causados provavelmente por um objeto cortante.

"Há marcas no corpo compatíveis com morte violenta e tentativa de desmembramento, mas que também podem estar relacionadas à manipulação do corpo para sepultamento", disse Mariella Fumagalli, diretora da Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF), à imprensa argentina.

Biblioteca Nacional/Revista ¡Esto!

'Cresci com uma dor enorme no peito'

A mãe de Diego, hoje com 87 anos, nunca desligou o telefone de casa, à espera de que um dia o filho ligasse.

"Até recentemente, olhava pela janela para ver se Diego voltaria", disse Javier Fernández, irmão do adolescente desaparecido, à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC.

Javier lembra a dificuldade que a família teve para conviver com a incerteza sobre o que aconteceu com Diego, importante jogador de futebol do Club Atlético Excursionistas.

"Cresci com uma dor tremenda no peito; tem sido uma agonia", diz Javier, de Buenos Aires, com a voz embargada. "Diego era meu ídolo. Eu tinha 10 anos, jogávamos futebol e ele cobrava pênaltis no meu quarto."

Nos últimos dias, viveu uma mistura caótica de emoções. Quando recebeu a notícia, mal conseguia acreditar no que estava acontecendo.

"Senti raiva, impotência, tristeza e, ao mesmo tempo, alegria, porque encontrei meu irmão 41 anos depois." A descoberta, diz Javier, ao menos permitirá que a família lhe dê um enterro digno.

"Quando me entregarem o corpo dele, poderei me despedir em paz, como ele merece", diz ele.

"Coitado, foi tirado da minha vida, ele era tudo o que era certo para mim".

Arquivo familiar
Esta é uma das poucas fotos que a família guarda da infância de Diego Fernández

O pai o procurou nas ruas

A revista argentina ¡Esto! publicou um artigo sobre o caso em 1986, dois anos após o desaparecimento do adolescente.

Nele, o pai, Juan Benigno Fernández, relatou que anotava em um caderno todas as informações que pudessem ajudar a localizar o filho e colecionava recortes de jornais.

Além disso, ele começou a coletar informações sobre o desaparecimento de outras crianças.

"Desde que essa tragédia aconteceu, passei a acompanhar os apelos divulgados em jornais e na televisão e decidi visitar os pais de crianças dadas como desaparecidas."

Vendedor de peças de automóveis, o pai disse que, sempre que tinha uma intuição, pegava a bicicleta e saía para explorar as ruas em busca do filho.

Até que, um dia, foi atropelado e morto enquanto tentava encontrar Diego, conta o filho Javier.

Ex-colegas prestam depoimento ao Ministério Público

Após a identificação dos restos mortais, a investigação passou a ser conduzida pelo promotor Martín López Perrando, que atualmente colhe depoimentos de pessoas que possam fornecer informações relevantes sobre o caso.

Vários ex-colegas de "El Gaita", como Diego era conhecido na escola, prestaram depoimento ao promotor para fornecer informações que possam ajudar a esclarecer o caso.

Segundo a imprensa argentina, o Ministério Público ouviu, nesta segunda-feira (11/08), o depoimento de Cristian Graf, colega de Diego na Escola Nacional de Educação Técnica (Enet), que morava na casa onde os restos mortais foram encontrados.

A mãe de Graf ainda mora na mesma casa, segundo a mídia local.

Arquivo familiar
Diego Fernández jogava futebol desde criança

"A escola envia condolências à família e, respeitosamente, a apoia neste momento difícil", disse a Enet em comunicado.

O time de futebol em que Diego jogava também manifestou pesar.

"O Club Atlético Excursionistas expressa comoção e tristeza com a notícia sobre Diego Fernández Lima", diz texto publicado na rede social X. "Enviamos condolências e um grande abraço a toda a família."

Inúmeras manifestações de solidariedade chegaram à família do adolescente.

O irmão Javier, que tenta conter as lágrimas sempre que se lembra de Diego, diz que, apesar da dor, a descoberta dos restos mortais ajudará a família a encerrar um ciclo após décadas de incerteza.

"Isso nos ajudará a ficar um pouco mais em paz."