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A euforia com a venda da Eletrobrás

2017-08-23 01:30:00

O mercado financeiro teve ontem o melhor dia em seis anos. A Bolsa de Valores de São Paulo não tinha desempenho tão positivo desde a terceira semana de governo Dilma Rousseff (PT), em janeiro de 2011. O motivo foi o anúncio da decisão de vender o controle acionário da Eletrobrás.


O mercado considera que, sob gestão privada, a estatal de energia elétrica terá desempenho administrativo melhor do que tem sido sob gestão governamental. Ao longo do governo Dilma, houve de fato ingerências políticas, que custaram caro e se reverteram em altas exorbitantes das tarifas. Sobrou para o consumidor.


É possível que, sem interferência política típica das estatais, a gestão melhore sim. É capaz de a condução privada trazer bons resultados. Como também pode ser que não.


LIÇÕES DA TELEFONIA

O caso da Oi é emblemático. Na privatização do sistema Telebrás, a antiga estatal foi desmembrada. A Oi, antiga Telemar, surgiu como resultado da privatização de 16 empresas de telefonia, entre elas a Teleceará. No ano passado, a empresa entrou em recuperação judicial — o maior processo desse tipo na história do Brasil. A dívida alcançou a casa dos R$ 64 bilhões,com 55 mil credores. Só no segundo trimestre, o prejuízo foi de R$ 3,3 bilhões, alta de 302% no rombo em relação ao mesmo período de 2016. No primeiro semestre, pelo menos dois mil funcionários foram demitidos. No ano anterior, já haviam sido mais de mil cortes. Uma calamidade.

Por muitos anos, as telefônicas foram citadas como grande exemplo de sucesso das privatizações. Referência de como a iniciativa privada é mais competente na gestão do patrimônio público. Isso é visão ideológica liberal. A realidade está longe de ser tão linear.


GESTÕES BOAS OU RUINS

A gestão privada pode ser melhor, como pode ser pior. Tem administração particular boa ou ruim, como também no setor público há órgãos bem e mal geridos. Claro, no âmbito governamental há amarras e restrições que impõem dificuldades. Isso sem dúvida. Algumas restrições burocráticas podiam ser revistas, sim. Outras são importantes garantias, por se tratar da administração de algo cuja dona é a sociedade. Não é empresa na qual o proprietário decide o que faz e arca com as consequências. Como também é verdade que, em muitos setores, o melhor que o Estado pode fazer é se retirar e deixar a iniciativa privada investir e tomar de conta. A carcaça do que deveria ser um aquário na Praia de Iracema é ótimo exemplo.

Mas, há entes públicos muito bem geridos e que dão retorno à sociedade, mesmo com todos os problemas. Para ficar na área mais crítica: a saúde. Quando se fala em trauma ou queimados, o Instituto José Frota (IJF), em Fortaleza, é parâmetro de excelência acima de qualquer hospital privado. Sem ignorar os muitos problemas, as macas nos corredores, típicos de hospital que não pode renegar paciente nenhum. Quando se fala em acidente vascular cerebral (AVC), o Hospital Geral (HGF) é a referência principal, assim como o Hospital de Messejana em relação ao coração. Todos têm muitos problemas, mas há patamar de qualidade a ser notado.


Na educação: há escolas públicas muito ruins, e outras muito boas. Assim como no setor privado. Há universidades particulares ótimas e outras lamentáveis. A universidade pública tem problemas, mas há espaços de formação e produção extraordinários. Estivesse a pesquisa científica brasileira dependente da iniciativa privada, estaríamos ainda mais bem arrumados do que estamos.


O que quero dizer é: há problemas que são da rede pública, sim. Pode e deve haver aperfeiçoamentos. E, independentemente disso, não são intransponíveis. Há gestão boa e ruim na iniciativa privada e no setor público. Não é a natureza, se particular ou estatal, que define isso. Achar que governamental é necessariamente ruim e empresarial é sempre bom significa apenas inocência boba.


ATUAÇÃO DE GILMAR PODE TER SÉRIA REPERCUSSÃO

A forma como Gilmar Mendes tem agido é grave e a repercussão pode ser pior ainda. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu impedimento, suspeição e incompatibilidade do ministro nas decisões de libertar o empresário Jacob Barata Filho. O magistrado foi padrinho de casamento da filha de Barata Filho. Mas, nega relação de proximidade com ele.

O ministro já havia sido o primeiro na história do Supremo a ter suspeição pedida pela Procuradoria Geral, em maio, no caso de Eike Batista, cliente do escritório da mulher de Mendes.


A postura de Mendes é muito grave e a consequência pode ser maior. Duvido que o STF tenha coragem de declará-lo impedido de julgar. E assim, o indispensável mecanismo do distanciamento e isenção do julgador se enfraquece para esse caso e para muitos outros. Cria jurisprudência.

 

Érico Firmo

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