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Abriu-se a caixa de Pandora

2017-03-16 01:30:00
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O buraco que derrubou a popularidade de Dilma Rousseff (PT) foi cavado pela própria presidente. Num misto de incompetência e populismo eleitoral, jogou a economia num buraco do qual a saída ainda não se vislumbra. Com isso, sua popularidade despencou. Por mais de uma década, o apoio da população foi o alicerce dos governos petistas. Sem ele e com a economia indo à bancarrota, as outras bases de sustentação ruíram. Os empresários em geral nunca gostaram mesmo do PT. Para o meio político, o partido nunca foi propriamente um aliado fácil de lidar. Ambos os segmentos aproveitaram para desgastar Dilma. Havia entendimento de que a governabilidade havia sido perdida, e era pura verdade. Consideraram que o melhor seria tirar a presidente. Fez-se, então, processo de impeachment estapafúrdio com bases absolutamente frágeis e inconsistentes.


Ocorre que a saída de Dilma pode fracassar no projeto de restituir a governabilidade. Vários dos fatores que fragilizaram Dilma permanecem. A favor dele, a simpatia de empresários e o suporte político. Porém, o apoio popular nunca existiu e o ânimo contra ele só piora. A rejeição ao governo acaba afetando a capacidade do presidente de impor sua polêmica pauta. As denúncias de corrupção afunilam e caem sobre a cabeça do entorno do presidente. O espectro da Lava Jato no Palácio do Planalto é mais intenso que na época de Dilma, quando já causou arrepios.


Para fragilizar a então presidente, a Câmara dos Deputados sob controle de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) impôs tantos obstáculos quanto pôde. Isso agravou a situação econômica. Ajudou na queda de Dilma, mas piorou quadro já tenebroso. Em paralelo, foi dada corda às investigações da Lava Jato também como elemento de desgaste. Foi o melhor que se fez, embora os interessados talvez não tivessem se dado conta das consequências. Porque as investigações saíram completamente de controle. A Lava Jato serviu como instrumento político, mas os políticos até agora não conseguiram controlá-la. A amplitude do escândalo é espantosa. Se for às últimas consequências, não vai restar de pé nenhuma das grandes forças políticas. Os esforços para “delimitá-la” são contínuos. A bem do interesse público, espera-se que não consigam.


Por ora, ela avança e ameaça drasticamente a governabilidade de Temer. A capacidade do presidente de realizar grandes e impopulares reformas ficou seriamente abalada nos últimos dois dias. Para aprovar medidas que atingem diretamente a vida de milhões e milhões, nem o governo tem autoridade moral, muito menos o Congresso Nacional, com seus dirigentes alvos de pedido de abertura de inquérito. Quando em situação delicada, os parlamentares costumam ser particularmente sensíveis à pressão das ruas.


Com as reformas ameaçadas, a recuperação da economia pode ficar comprometida. Isso pode afetar o apoio dos meios econômicos. A parcela do impeachment cuja intenção era recompor a governabilidade periga dar com os burros n’água. Deu certo até aqui, sem dúvida. Para a parte mais importante e difícil da tarefa, todavia, é uma enorme interrogação.

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PAPEL DE RENAN CALHEIROS

O maior patrimônio do governo Temer é, até aqui, o enorme apoio político do qual desfruta. Essa sustentação sofreu grande abalo, que vai além dos protestos e da Lava Jato. É a crise de relacionamento com Renan Calheiros (PMDB-AL). O líder do partido do presidente investiu ontem contra a reforma e disse que o governo “já inviabilizou a reforma da Previdência”. Mencionou os protestos e criticou a condução da agenda econômica.

Calheiros é, também, um dos políticos mais enrolados na Lava Jato e o último dos peemedebistas graduados a ficar do lado de Dilma Rousseff. Sua postura obviamente envolve interesses. É personagem das mais influentes e articuladas de Brasília. Pela forma como o governo Temer se configura, o fogo amigo de Calheiros é capaz de fazer estrago até maior que o dos protestos de rua.


 

Érico Firmo

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