Análise: O mestre que só mudou de lugar, por Klausney Muniz
Os bons morrem jovens, ou velhos? O mundo da literatura agora precisa lidar com outro luto – como se já não bastasse as histórias interrompidas pela distopia atual em que vivemos. Rubem Fonseca, um dos maiores escritores da segunda metade do século XX e deste, foi levado por um infarto – morreu “como um passarinho”, de acordo com o depoimento de Bia Corrêa, sua filha. Leio Rubem Fonseca desde que me entendo por gente, é uma questão de sintonia mesmo – nascemos no mesmo dia. Ao andar por uma livraria, mesmo sem grana, procurava uma lombada com o nome dele e sentava para ler – era triste ir embora dali sem levá-lo comigo. Calibre 22, Feliz ano novo, Secreções, Excreções e Desatinos, Carne Crua... suas histórias com ritmo chegaram até a mim por meio desses intervalos, pelas aulas de literatura da escola e pelas mãos de pessoas que moldaram o meu caminho como estudante e aprendiz de escritor.
Quando li que ele se encantou, como disse certa vez Guimarães Rosa, a primeira coisa que fiz foi abrir a estante daqui de casa e retirar os pedaços do contista que se preocupava justamente em retratar os recortes do mundo que reverbera dentro e fora da gente. Ele defendia que as palavras não precisam ser poupadas ou discriminadas, e eu o agradeço por abreviar e ao mesmo tempo revelar tanta coisa. Não sei como vai ser daqui pra frente – os livros ainda repousam sobre a mesa do meu escritório, desde o minuto em que fui tomado pelo mesmo tipo de assombro que suas tramas provocam nos leitores, mas fico aliviado porque nos deixou uns trinta legados – os escritores não morrem, eles só ficam entediados e mudam de lugar.
Te vejo do lado de lá, mestre.
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AssineKlausney Muniz Sampaio
Especialista em Escrita Literária e Mestrando em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual do Ceará