Dinheiro vivo declarado na eleição será fiscalizado
A suspeita é de que candidatos façam declarações falsas à Justiça Eleitoral e ao Fisco, informando possuir valores em espécie em casa que, na verdade, não possuem. É o chamado "colchão" para lavagem, conforme definem integrantes dos órgãos de controle. Para investigadores, casos assim podem configurar "pré-lavagem de dinheiro".
A declaração falsa visaria, ao fim da eleição, transformar a sobra de campanha em dinheiro próprio ou injetar recurso de origem ilícita para custear os gastos eleitorais.
Em 2014 foram declarados R$ 300 milhões em dinheiro por 7,6% do total de 26.259 candidatos. Já em 2016, quando foram eleitos prefeitos e vereadores, 12,28% dos 497.697 candidatos declararam possuir R$ 1,679 bilhão em espécie (veja quadro).
A doação de empresas para financiar campanhas está proibida desde 2015 por determinação do Supremo Tribunal Federal. Neste ano, a eleição será financiada por meio dos fundos Eleitoral - que contará com R$ 1,7 bilhão dividido entre os partidos - e Partidário, que terá mais R$ 888,7 milhões, além de doações de pessoas físicas. Os dois fundos são abastecidos com recursos públicos da União.
Embora o TSE seja o responsável por fiscalizar as eleições, os órgãos de controle vão usar suas técnicas para tentar identificar possíveis casos suspeitos com cruzamento de dados. De posse dessas informações, a Receita e o Coaf devem informar a Corte eleitoral.
O Estadão/Broadcast apurou que, dentro do TSE, não está descartado até o emprego de eventuais "batidas" na casa de políticos suspeitos para verificar se a pessoa, de fato, guarda os recursos. Pela legislação brasileira, a Receita pode intimar o contribuinte para provar a informação prestada na declaração e à Justiça Eleitoral sem a necessidade de autorização judicial.
O trabalho de repasse das informações do TSE aos órgãos de controle é quase em "tempo real", realizado à medida que os candidatos prestarem informações cobradas pelo tribunal.
O foco também será o monitoramento dos doadores para identificar se o repasse eleitoral foi feito por um "laranja". Será um trabalho bem ágil, de acordo com uma fonte envolvida nas discussões.
Tio Patinhas
O método que será empregado, no caso da Receita, foi testado recentemente em Santa Catarina na Operação Tio Patinhas. Em abril, o Fisco mapeou que, em 2017, 621 pessoas haviam declarado manter R$ 1 milhão ou mais guardado dentro de casa.
Com base nessas informações, os auditores visitaram esses contribuintes para saber se realmente o dinheiro existia e qual era a fonte geradora do montante.
Após três meses de fiscalização, o número de pessoas que declararam manter a cifra de R$ 1 milhão caiu 55%, de acordo com informações divulgadas pela Receita Federal. Os contribuintes pegos na fiscalização acabaram retificando a declaração do Imposto de Renda ou diminuindo e até mesmo zerando o valor declarado em espécie.
Da mesma forma, ao longo da eleição, a Receita pretende mapear candidatos que declararem esses valores para depois checar a veracidade das informações e a origem do dinheiro, segundo fontes.
Coaf
Outra frente é o mapeamento de transações suspeitas às vésperas do pleito. Para acompanhar possíveis saques e depósitos vultosos, o Coaf deve monitorar transações envolvendo contas de políticos, partidos e prestadores de serviço para fiscalizar casos suspeitos de lavagem e corrupção.
O Coaf manterá, ao longo da disputa eleitoral, uma sala de situação com a participação de diversos outros órgãos para monitorar as transações suspeitas. Assim como no caso da Receita, ao verificar algum tipo de movimentação suspeita, o Coaf vai encaminhar os dados ao TSE para que os políticos sejam autuados. A equipe ficará a partir deste mês até a fase de prestação final de contas.
Da sala de situação participam também representantes da área de inteligência do Ministério Público Federal, Polícia Federal, Receita e Tribunal de Contas da União (TCU).
Cruzamento de dados
Na primeira eleição geral sem doações de recursos por empresas, a Justiça Eleitoral planeja apertar a fiscalização contra o uso de CPFs de laranjas para simular contribuições às campanhas, cruzando bases de dados produzidas pela Receita Federal e por outros órgãos.
Técnicos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que atuam na fiscalização de contas de campanha avaliam que, com a redução dos recursos totais disponíveis em relação a campanha anteriores, pode ocorrer um aumento da prática de caixa 2.
Uma das maneiras usadas para lavagem do dinheiro não declarado na campanha é encontrar pessoas que possam assumir, dentro da cota permitida (até 10% da renda no ano anterior), um repasse simulado, que, na verdade, não era dela.
Análises sobre a prestação de contas das eleições municipais de 2016 indicaram milhares de casos suspeitos, como CPFs de mortos, desempregados, de pessoas inscritas em programas sociais e de transferência de renda do governo federal, como o Bolsa Família. Eles apareciam como doadores de campanhas na listagem declarada à Justiça Eleitoral.
Além disso, mais de 300 mil CPFs mapeados escapavam à base do Fisco - não se tratavam de pessoas isentas, dispensadas da declaração do Imposto de Renda de Pessoa Física, mas de supostos doadores que nunca haviam informado ter fonte de renda à Receita.
O mecanismo de controle adotado atualmente detecta esses casos e emite alertas às autoridades por meio de relatórios de inteligência financeira, empregados no momento da análise das contas - após o fim da campanha, quando a Justiça Eleitoral pode fazer diligências.
Ao longo de uma semana, o TSE reúne as doações registradas a cada 72 horas pelos candidatos e compila toda sexta-feira. O material é enviado ao Tribunal de Contas da União (TCU), para que sejam feitos a pesquisa e o cruzamento das informações nas bases de dados do governo (beneficiários do Bolsa Família, Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, entre outros). O Ministério Público Eleitoral é comunicado caso haja suspeita de fraude. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Agência Estado
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