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Artigo: Marx n'est pas mort

Professor de Economia Ecológica da Universidade Federal do Ceará, Aécio Alves Oliveira trata dos 200 anos de Karl Marx
20:04 | Mai. 04, 2018
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Tipo Notícia
Estamos, neste 5 de maio de 2018, comemorando o bicentenário de nascimento de Karl Marx. Comemorando, principalmente, a atualidade de suas ideias.

 
[SAIBAMAIS]O espectro deste pensador causa mais medo às mentes conservadoras de hoje do que quando estava vivo. A atualidade de suas ideias encontra-se no poder de explicação das crises que grassam as sociedades capitalistas. De maneira mais grotesca, e até mesmo fascista, sua atualidade se manifesta na forma como são tratados aqueles e aquelas que se dedicam ao estudo das ideias de um dos mais criativos e instigantes pensadores paridos pela humanidade. Nas universidades e em outros setores da sociedade, muitos são submetidos a processos de “eliminação” intelectual e excluídos das instâncias decisórias pelo fato de ousarem disseminar as ideias críticas de Marx.
 
[QUOTE1]Três aspectos para demonstrar a força das ideias de Marx, prospectados na segunda metade do século XIX até sua morte em 14 de março de 1883.
 
O primeiro refere-se ao trabalho tal como hoje se apresenta. A revolução microeletrônica e da robótica, acentua a tendência de redução do uso direto do trabalho. A perda de importância relativa do trabalhador se deve à sua substituição por máquinas. A obtenção de emprego torna-se problemática e tende a se tornar uma aventura. E quem não consegue vender sua força de trabalho – quem não consegue ser “útil para o lucro” – é considerado supérfluo e jogado em uma espécie de aterro sanitário social.
 
Outro aspecto refere-se ao dinheiro como divindade visível. Como na sociedade capitalista o dinheiro assume a condição de “objeto por excelência”, ao mesmo tempo em que traz a sociedade para seu possuidor, funciona como fonte de discriminação, de desrealização e de conflitos de classes ou interpessoais. A simbiose entre poder político e dinheiro leva à mercantilidade da vida e à corrução.
 
O terceiro aspecto aqui salientado refere-se à relação entre a economia e a Natureza. A outra face do processo que envolve as intensas inovações de processos e de produtos se expressa nas agressões à Natureza. Mais ainda, em virtude da diminuição da "vida útil" das mercadorias e do aumento da produção de resíduos e rejeitos que degradam o ambiente.
 
Diante de tais circunstâncias, Marx sugere que não há como prosseguir com a lógica destrutiva deste sistema econômico. Faz-se necessária uma transformação profunda do modo de produzir e de viver para que se tenha um futuro discernível e uma sociedade justa e igualitária. Marx afirma que as condições para tal transformação se encontram incubadas no interior da “velha sociedade”. Pois, para a humanidade, os problemas só se apresentam quando as condições materiais para que sejam resolvidos existem ou estão em vias de existir.
 
[QUOTE2]No século XXI, a moderna sociedade produtora de mercadorias revela sinais de seus limites, internos e externos. Internamente, os limites referem-se aos avanços das inovações tecnológicas que reduzem a importância do homem nos processos econômicos. E ainda a dilapidação da Natureza. A sede ‘vampiresca’ do capital o leva a tratar a Natureza como um mero objeto, ou uma barreira externa a ser ultrapassada.
 
O trabalho não confere dignidade ao homem. Como um imperativo, os indivíduos têm que funcionar como peças nas engrenagens que produzem dinheiro, para assim adquirirem propriedades e poder social individual. Marx arremata: "o trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz"; "torna-se tanto uma mercadoria mais barata, quanto maior o número de bens que produz"; "com a valorização do mundo das coisas, aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens". Essas conclusões de Marx são antecipações teóricas importantes do processo de qualificação-desqualificante do trabalho e do trabalhador, processo este que acompanha o desenvolvimento do capital. Navegar é preciso para além do capital.
 
A dominação a que está submetida a humanidade serve de fermento para que se possa pensar o impensável. O ser humano tem sempre o defeito de poder pensar. A humanidade terá que inverter a lógica da trajetória impulsionada pela economia que tem o lucro por objetivo e assumir os processos decisórios que afetam a vida dos habitantes da Terra. A ordem econômica, social e política prevalecente não garante a reprodução material adequada para uma parcela crescente da população do mundo. As desigualdades estão a falar sobre sua completa ilegitimidade e sobre a necessidade de sua superação.

Aécio Alves de Oliveira
Professor de Economia Ecológica da Universidade Federal do Ceará

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