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Há um ano, Joesley gravava Temer no Jaburu e mudava rumos da política

Áudio de 39 minutos mudou articulações do Governo Federal e tornou Temer o primeiro presidente investigado durante o execício do mandato
19:34 | Mar. 06, 2018
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7 de março de 2017. Relógios marcavam 22h30min em Brasília quando o presidente da República, Michel Temer (MDB) teve, longe do olhar de jornalistas e assessores, um encontro extraoficial com Joesley Batista no Palácio do Jaburu. Há um ano, aquela noite mudaria os rumos das articulações políticas do Planalto. 

 
Se tudo tivesse saído como planejado pelo chefe do Executivo federal, ninguém iria saber daquela conversa entre ele e o empresário então maior produtor de proteína animal do mundo, investigado em cinco inquéritos de corrupção. Contudo, um dos donos do grupo J&F, proprietário do frigorífico JBS, tinha outros planos para os assuntos que iria discutir. Ele carregava um gravador de voz escondido nas roupas. 

 
Ouça a conversa gravada pelo empresário: 
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O empresário já havia conversado com a Polícia Federal (PF) para articular uma "ação controlada". A ideia dele era conseguir juntar provas para incriminar pessoas envolvidas em esquema do qual ele próprio também participava. Em contrapartida, iria negociar redução da pena com a Justiça

 
[FOTO2] "Tem que manter isso aí"

 
Por aproximadamente 40 minutos, Temer e Joesley conversam, por exemplo, sobre uma “mesada” dada ao ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (MDB), e ao doleiro Lúcio Funaro, presos na Lava Jato, para que se mantivessem em silêncio na cadeia. Ao ouvir a informação, Temer respondeu: "Tem que manter isso, viu?"

 
O empresário também contou ao presidente que estava "segurando" dois juízes e que tinha contato com um procurador de "dentro da força-tarefa" para saber os rumos das investigações. Temer ainda revelou medidas que seriam tomadas pelo Governo na economia. Disse que o Banco Central iria cortar a taxa básica de juros em um ponto percentual

 
Dali para frente, Joesley passou a articular na Justiça um acordo de delação premiada e de leniência (para pessoa jurídica) com a intenção de evitar a prisão nos inquéritos em que era investigado. De imediato, as gravações abalaram o País. Nas ruas, a população ensaiou um movimento pedindo o impeachment ou a renúncia do presidente, mas o movimento não ganhou força. Por outro lado, Temer atacou o responsável pela gravação e tentou minimizar o impacto dela no Planalto. 

 
[FOTO3] Enquanto tentava recuperar a economia, Temer viu ainda o mercado financeiro desabar, conduzido pela desvalorização de ações da JBS. O dólar atingiu preço recorde e as negociações precisaram ser interrompidas para evitar uma tragédia financeira maior. 

 
Irmãos Batista vão à Justiça

 
Em meio ao furacão que provocaram, Joesley e o irmão, Wesley Batista, conversaram com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Edson Fachin em 10 de maio. Após conversa com a dupla, o magistrado homologou a gravação, que oficialmente passou a ser usada como prova. O procurador-geral da República à época, Rodrigo Janot, pediu abertura de inquérito para apurar o envolvimento de Temer em esquema de corrupção. 

 
No acordo de delação, ficou acertado que os irmãos Batista e executivos da empresa não seriam presos ou processados pelos crimes que estavam envolvidos. Teriam de pagar multa de R$ 250 milhões cada um, além do valor de R$ 1 bilhão em nome do grupo — no fim, a empresa teve de pagar R$ 10,3 bilhões. 

 
À época, o acordo foi criticado por ser "brando" com os delatores. Contudo, antes de ser consolidado Janot teve acesso a novas gravações mostrando que os irmãos Batistas teriam omitido provas e mentido no depoimento. Os áudios invalidaram o acordo e, em setembro do ano passado, a dupla foi presa. 

 
[FOTO4] Fim do acordo

 
Além da acusação de ilegalidade no depoimento, eles também foram acusados de usar o acordo para se beneficiar no mercado financeiro, comprando dólar, antes do aumento do valor, e vendendo ações da empresa, antes delas despencarem devido à divulgação dos áudios. Pela suspeita de irregularidade, eles também tiveram mandados de prisão expedidos. 

 
Já no Planalto, os irmãos Batistas frustraram muitos planos de Temer e fizeram ele perder parte do tempo na Presidência tentando salvar a própria pele, tornando-se o primeiro presidente, em exercício do cargo, a ser denunciado. Janot apresentou duas denúncias contra o ele. Na primeira, foi acusado de corrupção. Na segunda, pesava contra ele suposta obstrução de Justiça e organização criminosa. Foi a primeira vez que um presidente da República no Brasil foi denunciado por crime comum em pleno mandato.

 
Temer se reuniu com centenas de parlamentares e articulou ações para barrar o processo. Em ambos ele conseguiu votos suficientes dos deputados federais, que não autorizaram as investigações. Contudo, nesse meio tempo o presidente perdeu apoio político e viu a popularidade, que já enfrentava muitos obstáculos, bater recorde negativo. 

 
[FOTO5] Em setembro do ano passado, obteve a pior avaliação de um líder do executivo em toda a série histórica de pesquisas CNI/Ibope. O índice de avaliação como ruim e péssimo chegou a 77%. A avaliação positiva de Temer chegou a 3%, com margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

 
Preço da sobrevivência

 
A resistência que as denúncias exigiram de Temer para manter o cargo também obrigou o presidente a gastar "cartas" que usaria para conseguir aprovar medidas propostas pelo governo, como a reforma da Previdência, uma das principais agendas do Executivo. 

 
Em janeiro deste ano, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu substituir a prisão preventiva dos irmãos Wesley e Joesley Batista por medidas cautelares. Wesley deixou a prisão, mas não poderá ter contato com o irmão ou ocupar cargos na empresa. Joesley, contudo, continua preso por responder a outro mandado de prisão ainda não julgado.

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