PSOL enfrenta 'choque de realidade' na capital do Amapá
Difícil mesmo é prever como essas frases podem virar realidade em Macapá, cidade com 398 mil moradores, o quinto pior IDH entre as capitais brasileiras e com um orçamento de R$ 500 milhões que mal dá conta de resolver um sem-número de problemas estruturais. Para se ter ideia, apenas quatro de cada 100 domicílios têm acesso à rede de esgoto. E apenas um pronto-socorro funciona 24 horas. É justamente nesse cenário que, oito anos após sua fundação, o PSOL tem a difícil tarefa de governar a sua primeira capital e tentar aliar a retórica radical dos primeiros anos com alianças antes injustificáveis; promessas difíceis de cumprir e obras necessárias; bravatas e responsabilidades; expectativas e possíveis desencantos.
O PSOL, fundado por dissidentes do PT, é um partido de dois mundos. O primeiro é o do radicalismo, uma resposta às recentes denúncias de corrupção no PT. O outro é o da política real, que no País necessita de acordos até outro dia impensáveis para os socialistas. O embate entre esses dois mundos já criou a primeira lavação de roupa suja no PSOL. O estopim do debate que hoje divide o partido foi a costura de apoios e alianças no 2.º turno de Macapá.
À frente de esquerda Unidade Popular (PSOL, PV, PPS, PCB, PTC, PRTB e PMN) juntaram-se setores do PT, do PC do B, do PSB e líderes de partidos do espectro ideológico oposto, como o DEM, o PSDB e o PTB. Os apoios deram mais votos à chapa do prefeito eleito Clécio Luis (PSOL), que enfrentou o grupo político que estava no poder há pelo menos dez anos com apoio do senador José Sarney (PMDB-AP), do ex-senador Gilvam Borges (PMDB-AP) e dos ex-governadores Waldez Góes (PDT) e Pedro Paulo Dias (PP) - cujas últimas administrações foram marcadas por denúncias e escândalos de corrupção. Eles davam sustentação ao prefeito Roberto Góes. (PDT), que tentava reeleição.
Em reunião da Executiva Nacional, quinta-feira, cogitou-se levar Clécio e o senador Randolfe Rodrigues, articulador político dos apoios e da campanha, ao Conselho de Ética. Eles se livraram, mas só por um voto. "Não podemos transformar a vitória em derrota", disse o líder da bancada na Câmara, deputado Chico Alencar (PSOL-RJ). "Sem autofagia. Será nossa saída da adolescência, o primeiro teste de maturidade do PSOL."
Pelas ruas de Macapá, o novo governo do PSOL também gera expectativa e dúvidas nos moradores. Apesar de ter disputado o governo do Estado em 2006, Clécio ainda não é tão conhecido na cidade. Aos 40 anos, ex-agente da Polícia Civil, formado em Geografia, completa em dezembro apenas o segundo mandato como vereador.
Clécio conseguiu seu melhor desempenho na zona norte, uma franja de expansão em direção ao interior. Com perfil geográfico plano, a cidade começa agora a erguer seus primeiros edifícios de 20 andares. Macapá tem cerca de 400 mil habitantes, sendo 17 mil na área rural. São povoados distantes, com população de traços indígenas, mestiços e caboclos, ribeirinhos que vivem à beira do Rio Amazonas, de seus afluentes e do poder público. A região deu a vitória a Clécio por 2 mil votos a mais. Na zona norte, obteve 41 mil. Seu adversário Roberto, 37 mil. Na zona sul, Clécio perdeu: recebeu 60 mil ante 61 mil do pedetista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.