Como a Alemanha quer resolver crise no sistema de saúde mais caro da Europa
Governo alemão propõe reforma que inclui corte de gastos e melhor remuneração de médicos, além de medidas para aumentar a eficiência dos hospitais. Especialistas saúdam iniciativa, mas dizem que ela é insuficiente.Falando em uma conferência anual de médicos no início de maio, o ministro da Saúde alemão, Karl Lauterbach, disse que os planos de reforma nos quais ele vem trabalhando há dois anos marcam uma "Zeitenwende" (mudança de paradigma, literalmente "virada dos tempos") no sistema de saúde alemão – uma alusão à reforma militar que o chanceler Olaf Scholz anunciou após a invasão russa da Ucrânia, em fevereiro de 2022. A lei sobre a reestruturação do setor hospitalar foi aprovada pela câmara baixa do Parlamento, o Bundestag, na quinta-feira passada. Agora, ela precisa ser aprovada pela câmara alta do Parlamento, o Bundesrat. Nova forma de remunerar os hospitais A reforma hospitalar mudará a forma como os hospitais alemães são financiados e imporá novos padrões de atendimento. A Alemanha tem o maior número de leitos hospitalares per capita da União Europeia (7,9 leitos por mil habitantes, enquanto a média da EU é de 5,3), mas a manutenção desses leitos é cara. De acordo com Lauterbach, isso deixou muitos hospitais à beira da falência. O resultado é que os pacientes estão sendo mantidos no hospital desnecessariamente para que os hospitais possam cobrar dinheiro extra das seguradoras de saúde, o que, por sua vez, aumenta os custos de saúde e as contribuições para o seguro em todo o país. Na Alemanha, os contribuintes são obrigados a pagar mensalidades às seguradoras de saúde, divididas entre o sistema básico – que funciona como uma espécie de Previdência, onde os contribuintes pagam por todos os segurados e têm um atendimento uniformizado independente de renda – e o sistema totalmente privado, onde cada um paga por si. Com a reforma, os hospitais deixarão de ser pagos por tratamento. Em vez disso, eles receberão uma renda garantida por disponibilizar determinados serviços. Espera-se que isso alivie a pressão financeira sobre os hospitais, que atualmente, para financiar seu funcionamento, tendem a realizar o maior número possível de operações e tratamentos, mesmo quando não têm qualificação suficiente para realizá-los. Essa medida visa garantir que os pacientes que precisam de tratamentos complexos sejam encaminhados a especialistas mais cedo. Isso, de acordo com o Ministério da Saúde, reduzirá os custos de saúde a longo prazo, pois os pacientes terão mais chances de serem curados e estarão menos expostos a erros, já que a equipe do hospital estará menos sobrecarregada. Lauterbach afirmou que essa reforma salvará dezenas de milhares de vidas por ano. Deficiências no atendimento ambulatorial "A reforma hospitalar é correta e importante", concorda Dirk Heinrich, presidente da associação de médicos Virchowbund. "Temos um número excessivo de pacientes internados, mas o que está acontecendo agora é muito pouco. Reformar os hospitais sem uma reforma abrangente do tratamento ambulatorial e sem uma reforma do atendimento de emergência não fará diferença." Eugen Brysch, presidente da organização de proteção aos pacientes Deutsche Stiftung Patientenschutz, também se mostra cético. "No campo do atendimento médico ambulatorial, idosos, doentes crônicos e pessoas que dependem de cuidados acharão quase impossível encontrar um novo médico", diz ele. A Alemanha também vem sofrendo com a falta de consultórios médicos em áreas rurais, pois menos médicos querem morar nessas regiões. O Ministério da Saúde alemão quer resolver esse problema oferecendo dinheiro extra para clínicas em áreas rurais. Também nesse caso, Brysch é cauteloso. "O fato de que agora estão sendo criadas melhores oportunidades de remuneração não levará, por si só, a mais médicos nas áreas rurais. Afinal de contas, outros fatores de localização também desempenham um papel", explica. Um problema foi resolvido nas novas reformas: um teto para a remuneração dos clínicos gerais. Há muito tempo os médicos reclamam desse limite orçamentário – e ocasionalmente entram em greve por causa dele – porque, segundo eles, isso os obriga a tratar os pacientes gratuitamente. Lauterbach espera que a eliminação do limite incentive os médicos a atenderem mais pacientes. Heinrich saúda essa medida, porém, mais uma vez, argumenta que ela não foi suficientemente longe. "Ela fica na metade do caminho, porque isso continua em vigor no caso dos médicos especialistas", afirma. "Não adianta o paciente conseguir uma consulta mais rápida com seu clínico geral, mas ter que esperar meses por um especialista." Fechamento de hospitais "Algumas centenas de hospitais vão ter que fechar", disse Lauterbach ao tabloide Bild am Sonntag depois que a reforma foi aprovada no Bundestag. "Não há demanda médica suficiente para esses hospitais", acrescentou ele, explicando que um terço de todos os leitos hospitalares está vazio, e ainda não há enfermeiros suficientes. "Temos um sistema tão ineficiente que em nenhum outro país da Europa Ocidental a expectativa de vida é menor do que na Alemanha", disse Lauterbach, argumentando que ‘a centralização melhorará a qualidade do atendimento'. A reforma ainda precisa da aprovação da câmara alta do parlamento, o Bundesrat, que representa os 16 estados federais da Alemanha. As mudanças entrarão em vigor em 1º de janeiro de 2025 e serão implementadas gradualmente até 2029. As contribuições para o seguro de saúde devem aumentar no próximo ano também devido à reforma. No entanto, Lauterbach disse ao Bild am Sonntag que não espera mais aumentos no ano seguinte, se suas propostas de reforma do sistema de saúde forem implementadas. Autor: Ben Knight
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