Banco Central, uma estrela solitária no céu da burocracia brasileira

Autor DW Tipo Notícia

O Banco Central é responsável por uma revolução no mercado bancário: ele flexibilizou regras e permitiu a entrada de novos competidores num setor que, há pouco tempo, estava nas mãos de um oligopólio de grandes bancos.Se alguém no Brasil tivesse me dito, há dez anos, que os mercados financeiro e bancário do país iriam mudar a exemplo do que vem acontecendo agora, eu teria dito que era uma fantasia. Porque, neste momento, conforme descrito recentemente nesta coluna, está ocorrendo uma revolução radical no setor financeiro brasileiro. Todos os processos e serviços do setor, que até recentemente eram controlados por meia dúzia de bancos no Brasil, estão sendo desmantelados. E, por trás disso, está uma instituição estatal: o Banco Central (BC), que iniciou um processo irreversível e democrático contra os poderosos interesses do setor financeiro. Em termos simples, trata-se de garantir que o maior número possível de brasileiros tenha acesso ao sistema monetário e tenha que pagar menos taxas para usá-lo. O BC quer aumentar a competição e a eficiência no setor financeiro e, para isso, está abrindo o mercado para novos competidores. Até o momento, um oligopólio – formado pelas instituições privadas Itaú-Unibanco e Bradesco, bem como pelas estatais Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal e mais um ou outro banco estrangeiro, como o Santander – controlava tudo o que tinha a ver com dinheiro: crédito, câmbio, pagamentos, transferências, faturas, investimentos ou seguros. Estes bancos se mantêm unidos, são excelentemente organizados por meio de associações como a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e, portanto, têm grande influência política: os cargos em diretorias de bancos estatais são posições políticas fundamentais – e seus representantes são tão influentes quanto ministros. Isso porque estas instituições tomam decisões sobre empréstimos. Além disso, nenhum deputado ou senador quer comprometer um bom relacionamento com os bancos privados se quiser disputar futuras eleições. Mas, a partir de 2013, o BC começou a afrouxar o monopólio das operadoras de máquinas de cartões de crédito. Naquela época, a instituição ainda não tinha autonomia: a presidente Dilma Rousseff, por exemplo, continuou obrigando o guardião da moeda a reduzir as taxas de juros mesmo muito tempo depois de a instituição ter alertado o governo sobre a alta da inflação. No entanto, o BC continuou seu curso de abertura do mercado bancário: as fintechs, por exemplo – ou seja, as empresas ascendentes ou recém-chegadas ao mercado financeiro que, em sua maioria, operam digitalmente –, desfrutam de requisitos regulatórios mais flexíveis. Antes, o presidente precisava aprovar pessoalmente cada licença bancária. O fator decisivo para o processo de abertura bancária no país foi a estratégia chamada Open Banking, ou sistema financeiro aberto, que o BC vem implementando desde meados do ano passado e que acaba de completar sua quarta fase. Ele permite que os titulares de contas compartilhem suas informações financeiras em troca de melhores ofertas de empréstimos. Ou seja: as instituições financeiras não são mais detentoras exclusivas dos dados dos clientes, que decidem com quem dividi-los. Outro exemplo é o meio de pagamento instantâneo Pix, que foi lançado há um ano: cerca de metade dos 212 milhões de brasileiros já pagou com Pix – e de forma gratuita. Recentemente, investidores estrangeiros passaram a poder investir em empresas financeiras brasileiras. Além disso, as exigências para transações de câmbio, negociação com moedas eletrônicas e as regras para contas de brasileiros no exterior também foram flexibilizadas. Centenas de fintechs escolheram se especializar e melhorar processos individuais nesse mercado gigantesco: elas podem ser gigantes como a XP, que ao longo dos anos construiu uma plataforma para investidores privados muito mais transparente do que os consultores de investimento tradicionais dos grandes bancos jamais foram – e não são até hoje. Mas podem ser também "pequenas" fintechs que focaram no fato de brasileiros poderem contas em dólares nos EUA, ou na escolha, pelo cliente, da oferta mais barata e adequada ao pegar um empréstimo numa plataforma. É impressionante como o BC executa sua estratégia com eficiência e firmeza. Como seria bom se outros órgãos públicos, do Ibama à Anvisa, da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) à Infraero, pudessem fazer seu trabalho de forma semelhante e sem influência política. O Ano Novo está chegando – e podemos ter desejos. -- Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil. O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW. Autor: Alexander Busch

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