O imponderável quarteto do Eintracht Frankfurt que derrubou o campeão

Autor DW Tipo Notícia

Um dos astros da partida, o goleiro Kevin Trapp defende chute de Robert LewandowskiCom quatro peças-chave, o Eintracht conseguiu a proeza de vencer o Bayern em plena Allianz Arena, quebrando tabu de 21 anos. Desprezado na seleção, o goleiro Kevin Trapp pode ter feito a melhor partida de sua carreira.A coisa estava feia para o lado do Eintracht Frankfurt. Depois de seis rodadas, o time ainda não havia vencido um jogo sequer, mesmo enfrentando equipes consideradas inferiores, como Augsburg e Arminia Bielefeld. Tinha acumulado uma derrota vexatória e cinco insossos empates seguidos. Nem de longe se equiparava àquela equipe que terminou em quinto lugar na temporada passada, com direito à vaga para disputar a Liga Europa. Agora no 14º posto da tabela, se aproximava perigosamente da zona do rebaixamento já no começo do campeonato. Para piorar tudo mais um pouco, na prestigiosa Copa da Alemanha – vencida pelo Eintracht em 2018 –, o time foi eliminado logo na primeira rodada pelo modestíssimo Waldhof Mannheim, da terceira divisão. Antes do pontapé inicial para o confronto entre Bayern de Munique e Eintracht Frankfurt no último domingo (03/10), a cotação das casas de apostas para uma vitória do Eintracht sobre o Bayern era em média de 15x1. Ou seja: um euro apostado rentabilizava quinze vezes mais. O jogo começou com os bávaros pressionando fortemente a defesa das "águias", que resistiu bravamente até os 29 minutos de jogo. Foi nesse momento que um erro do capitão Martin Hinteregger no meio do campo levou ao primeiro e único gol do Bayern com Leon Goretzka. O austríaco Hinteregger é um velho conhecido de Manuel Neuer e do Bayern. Em 2018, na partida entre Alemanha e Áustria, ele fez seu primeiro gol contra Neuer. Dois anos depois, ele repetiu a dose ao marcar de cabeça mais um gol, na histórica vitória do Eintracht sobre o Bayern por 5x1 que resultou na demissão do técnico Niko Kovac. Meio ano depois, Hinterreger de novo superou Neuer, marcando dois gols de cabeça depois de dois escanteios levantados do mesmo jeito sobre a grande área pelo volante Sebastian Rode. Apenas três minutos depois do seu erro que resultou no gol do Bayern, Hinteregger foi para a grande área adversária. Filip Kostic, meia atacante do Eintracht, se preparava para bater o escanteio e cobrou com perfeição cirúrgica para Hinteregger cabecear sem dar chance ao goleirão Neuer, que depois reclamou muito do posicionamento dos seus zagueiros Süle e Upamecano. Tudo empatado em 1x1. O supergoleiro A partir daí o que se viu foi um bombardeio do Bayern sobre a meta defendida por Kevin Trapp, que fez incontáveis defesas de classe mundial para garantir a igualdade no placar. Apenas vez por outra seus colegas tentavam uma ou outra incursão rumo ao gol defendido por Neuer. Trapp talvez tenha feito nesse jogo a melhor partida de toda sua carreira. Até então, na atual temporada, além de não se destacar em nenhum dos seis jogos que disputou, em três deles o site de esportes kicker deu nota 4 por suas medíocres apresentações. Provavelmente, por essa sua fase pouco inspiradora, o técnico Hansi Flick, da seleção alemã, tenha preferido convocar Bernd Leno (reserva no Arsenal) como terceiro goleiro para os próximos jogos da Nationalelf contra Romênia e Macedônia do Norte. Detalhe: Flick estava na Allianz Arena para ver o bloco do Bayern funcionar. Acabou vendo uma performance inesquecível do goleiro que dispensou e um bloco bávaro impotente. Aos repórteres, depois do jogo, Trapp declarou sorridente: "O técnico nos disse ontem que iríamos precisar de um supergoleiro para encarar o Bayern e sairmos vitoriosos. Decidi assumir esse papel. Poucos acreditaram que pudéssemos ter alguma chance hoje, mas nos defendemos bem, e as poucas oportunidades que tivemos, aproveitamos". É verdade. Enquanto o campeão finalizou 20 vezes durante todo jogo, obrigando Trapp a fazer 11 defesas dignas de um goleiro de primeira classe, o Frankfurt ameaçou a meta defendida por Neuer em apenas cinco oportunidades. Em duas chegou ao fundo das redes. O jogo parecia se encaminhar para o empate. O placar estava em 1x1. Trapp era praticamente intransponível com uma defesa magistral atrás da outra. Os deuses do futebol definitivamente estavam do seu lado. O meia ofensivo Filip Kostic, entretanto, ainda não tinha terminado o seu serviço. Percebeu que pelo seu flanco esquerdo o lateral direito Süle avançava muito e abria muito espaço às suas costas. Além disso, o chefe da defesa bávara, Dayot Upamecano, não estava num dos seus melhores dias. Já havia falhado no primeiro gol e iria falhar de novo no segundo. Em diagonal penetrou na grande área depois de ultrapassar Upamecano e, quase sem ângulo, chutou forte à meia altura. Há poucos atacantes que se arriscam a uma finalização dessa posição. Ele correu esse risco, mesmo porque já tinha feito um gol na mesma situação contra o Stuttgart há poucas semanas. Neuer foi mal para a bola, que passou quase rente ao seu braço e foi parar na bochecha da rede. Eintracht Frankfurt 2x1 Bayern de Munique. "Não viemos a Munique para passear" Para completar o quarteto, é bom não esquecer o técnico Oliver Glasner. Na coletiva de imprensa antes do jogo havia dito com todas as letras: "Não viemos a Munique para passear nem tomar café e comer um bolo. Viemos para ganhar. Estamos motivados e preparados para essa empreitada." Consta que alguns repórteres não esconderam seus risos sarcásticos. Glasner preparou um plano de jogo, e seu time o executou com afinco. A espinha dorsal desse plano era constituída por um massivo bloco de cinco defensores assessorados ainda por dois volantes, o que resultou numa quase perfeita ocupação de espaços no setor defensivo. Poucas vezes se viu uma defesa tão bem compactada como essa organizada pelo técnico do Frankfurt obrigando o Bayern a avançar em demasia peças defensivas, deixando buracos no meio campo. Ofensivamente suas ações se restringiam a eventuais contra-ataques, predominantes pelo lado esquerdo nas costas da defesa do Bayern. Foi assim que surgiu o gol da vitória do Eintracht Frankfurt. Kevin Trapp, desprezado na seleção. Filip Kostic, mal amado pela torcida. Martin Hinteregger, o improvável carrasco de Manuel Neuer. Oliver Glasner, o técnico pressionado. São os quatro integrantes desse imponderável quarteto que, contrariando todas as expectativas, conseguiu derrubar o campeão e ainda quebrar um tabu de quase 21 anos, para alegria de sua torcida e de todos aqueles que apostaram as suas fichas numa vitória das "águias". O Eintracht Frankfurt havia vencido o Bayern na Allianz Arena pela última vez em 18 de novembro de 2000. Coincidentemente, também por 2x1. ________________________ Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Atuou nos canais ESPN como especialista em futebol alemão de 2002 a 2020, quando passou a comentar os jogos da Bundesliga para a OneFootball de Berlim. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit é publicada às terças-feiras. O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW. Autor: Gerd Wenzel

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