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As crianças dos protestos de Belarus

00:01 | Set. 28, 2020
Autor DW
Tipo Notícia
Autoridades ameaçam retirar tutela de quem leva filhos para manifestações contra Lukashenko. Mas nem todos se deixam intimidar. Alguns pais explicam suas razões para a DW.As pessoas que participam dos protestos em Belarus contra mais uma reeleição do presidente Alexander Lukashenko passaram a ter algo mais a temer além de multas: autoridades bielorrussas recentemente ameaçaram os manifestantes com uma revisão de seus status familiares – ou, em outras palavras, com a retirada da custódia de seus filhos. "A participação de crianças em manifestações será submetida a uma avaliação jurídica", anunciou o vice-primeiro-ministro de Belarus, Igor Petrishenko, também responsável pela observância dos direitos de menores. E, de fato, o Ministério Público de Minsk já enviou 140 advertências, embora muitas pessoas não se intimidem com isso. À DW, algumas famílias relataram sua experiência. Veronika, jornalista "Quando se quer colocar as famílias sob pressão, sempre se encontra uma maneira", diz Veronika. A mãe de três filhos enfatiza que até mesmo quem não fez nada de errado pode receber a visita das autoridades, tendo em vista a total arbitrariedade. Ela quer que seus filhos vivam num país livre. "Se não alcançarmos a democracia, a igualdade e o Estado de Direito agora, caberá a eles conseguirem isso", afirma a jornalista. Veronika e seu marido levaram os filhos às manifestações várias vezes, mas ela diz que nunca se preocupou. "Com ou sem filhos, por razões de segurança recomenda-se andar em grupos grandes. Quando há milhares atrás e milhares à frente de você, fica claro que não há tantos policiais assim para conseguir fazer algo de ruim a essa massa de gente." Alexey, funcionário do setor financeiro "Se os manifestantes forem privados da guarda de seus filhos, isso aumentará ainda mais a insatisfação. As crianças ficarão em casa e protestarão mesmo assim", disse Alexey, pai de uma menina de 4 anos. "Mudamos de Brest para Minsk, onde não temos parentes. Não queremos que nossa filha fique com estranhos, por isso a levamos várias vezes aos comícios." Para Alexey, os manifestantes agem com cautela: "A maioria dos protestos são formados por pessoas instruídas e inteligentes. Além disso, as manifestações acontecem em ruas largas, onde sempre é possível se afastar. No que diz respeito à polícia, não sei de nenhum caso onde pais com crianças tenham sido detidos." Mas Alexey alerta que a situação está mudando. Segundo ele, está cada vez mais perigoso protestar, e grupos de manifestantes estão sendo presos. Por ora, portanto, Alexey decidiu ir sozinho aos protestos. Porém, ele se diz convencido de que as crianças devem saber qual a posição de seus pais como cidadãos: "Se não conseguirmos mudar algo agora, talvez eles obtenham sucesso." Elena, médica "Participamos de todos os grandes comícios", disse Elena, que tem dois filhos, de 14 e 16 anos. "Antes das eleições não tínhamos medo porque não tínhamos ideia do que poderia acontecer. Levávamos nossos filhos conosco." Mas na noite de 9 de agosto, Elena presenciou o horror da repressão policial brutal aos manifestantes. "Nos dias seguintes, deixei as crianças em casa", lembra a médica, cujo maior medo é que seus filhos se tornem vítimas da violência policial. "Eles não parecem mais crianças", explica. "Nunca se sabe o que esperar da polícia." Segundo ela, muitos alunos substituíram a bandeira verde e vermelha de Belarus nas capas de seus cadernos pela histórica bandeira vermelha e branca, que se tornou um símbolo dos protestos. Até agora, porém, ela diz não ter havido reclamações aos pais a esse respeito por parte dos professores. Natália, contadora Mas nem todos pensam assim. "Numa escola de Minsk, bandeiras vermelhas e verdes foram entregues às crianças, que tiveram então que marchar e ser filmadas com elas. Não sei como eu teria reagido", disse Natália, que é mãe de dois filhos. Ela levou os filhos a um único protesto, quando eles tinham 8 e 15 anos. "O mais velho é alto e pode ser facilmente confundido com um adulto. Por isso me preocupo com ele", explicou a contadora. Ela própria participou dos protestos todos os dias durante a primeira semana após as eleições. Agora, ela só vai aos domingos. "Vejo muitos pais com filhos, inclusive com uns muito pequenos, em carrinhos de bebê. Não me atreveria a fazer isso. É mais seguro ir sozinha aos protestos. No tocante à retirada de custódia, vejo isso mais como uma forma de intimidação. Legalmente, trata-se de um processo muito difícil", aponta Natália. Oleg, funcionário da educação Oleg (nome alterado a pedido) é pai de um menino de 8 anos e de uma menina mais velha que não mora com ele. "Depois da votação, fomos ao local do pleito para ver o resultado, mas não havia nenhum aviso por lá. Os membros da comissão eleitoral fugiram pelo porão", lembra. Posteriormente, ele e sua família acompanharam o que se passava em Minsk: "Quando voltamos do trabalho para casa na noite de 11 de agosto, vimos uma visão apocalíptica: não havia carros, nem transporte público; apenas polícia e veículos especiais. Não sabíamos o que responder às perguntas do nosso filho." Oleg conta que o filho esteve presente em vários comícios: "No dia 16 de agosto, queria levá-lo para a casa da avó, mas ele disse que não nos deixaria ir sozinhos. Para a próxima manifestação, ele pintou uma bandeira vermelha e branca." Mas agora que os manifestantes arriscam perder a custódia de seus filhos, Oleg não quer mais levar o garoto com ele: "Isso não significa que nosso ânimo para protestar desmoronou. Continuaremos a criar nossos filhos para serem bons cidadãos, que têm direito a ter uma posição própria e de expressar livremente sua opinião." Adaptação: Isadora Pamplona Autor: Tatyana Nevedomskaya

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