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Um restaurante como ponto de integração

00:03 | Set. 02, 2020
Autor DW
Tipo Notícia
Quando milhares de refugiados chegaram à Alemanha em 2015, a chanceler federal Angela Merkel prometeu: "Vamos conseguir!" O sírio Samer Serawan e seu restaurante mostram que ela tinha razão.Em 2015, Samer Serawan e sua esposa, Arij, chegaram à amarga conclusão de que não podiam mais ficar em Damasco. Samer administrava uma empresa de importação e exportação de alimentos e uma fábrica de leite achocolatado. Mas sua empresa foi "roubada" por um dos muitos grupos armados que surgiram durante a guerra no país. "É terrível na Síria: há muitos grupos, e todos estão lutando", diz o homem de 41 anos, sem querer entrar em detalhes. Por fim, trilharam a tristemente notória "rota dos Bálcãs" até Berlim. "Tenho tentado esquecer. Mas toda hora me fazem perguntas que trazem de volta as lembranças", comenta, com um sorriso triste. "Foi preciso fazer um pacto com o diabo", acrescenta, referindo-se aos traficantes de pessoas que encontrou a caminho da Grécia. "Usamos de tudo, caminhamos, andamos de barco, de trem, de ônibus, tudo." Samer está sentado em seu restaurante, o Damascus' Aroma, que abriu em Berlim com a esposa em 2019. São 3 horas da tarde de uma quarta-feira, numa rua quente e barulhenta. Mas as mesas do lado de fora estão todas ocupadas. A comida – pimentões e folhas de uva recheados, cordeiro e frango grelhados, bulgur e temperos do Oriente – é a autêntica cozinha síria, o jeito como os sírios cozinham em casa. "Dias terríveis" Depois de finalmente chegarem a Berlim, Samer e Arij passaram o inverno de 2015/16 num hangar do aeroporto desativado de Tempelhof. O governo estadual havia transformado apressadamente o enorme espaço em campo de refugiados, para lidar com o alto fluxo diário de refugiados. Nos hangares, paredes divisórias separavam os pequenos "quartos" improvisados com beliches. Centenas ficaram alojadas ali. Ainda hoje há um aglomerado de contêineres para refugiados no antigo aeródromo de Tempelhof. Naquele inverno, Samer passou os dias principalmente na Secretaria de Saúde e Assuntos Sociais (LaGeSo) de Berlim. O caos burocrático na autoridade de saúde e bem-estar social criou algumas das imagens marcantes da "crise dos refugiados" na Alemanha: massas de sírios e afegãos tinham de esperar até 16 horas, "arrebanhados" entre barreiras de metal pelas forças de segurança, já a partir das 3 horas da manhã, num pátio lamacento. As crianças dormiam com roupas doadas, alimentos, cobertores e primeiros socorros foram organizados por instituições de caridade. O sistema de ajuda social de Berlim, já em circunstâncias normais carente de pessoal e recursos financeiros, teve problemas para enfrentar a grande afluência. "Foram dias terríveis", lembra Samer. Mostrando Berlim aos berlinenses Nos anos seguintes, o casal morou em dois outros locais – uma vez fora da cidade, e outra no projeto social Refugio, no bairro Neukölln. Lá encontrei Samer e Arij pela primeira vez: fiz um passeio pela região do ponto de vista de um refugiado, numa iniciativa da organização Querstadtein. O passeio ofereceu aos berlinenses uma nova perspectiva sobre sua cidade: como um recém-chegado vê a capital? Quais lugares são importantes para os refugiados? Isso foi em maio de 2016. Era impossível ignorar a presença dos sírios na capital alemã: havia novos supermercados árabes, novos restaurantes, e muitas lojas ao longo da movimentada avenida Sonnenallee exibiam escrita árabe na fachada. Enquanto isso, um termo mais antigo retornou ao vocabulário: "integração" estava em alta na mídia e voltou a ser um forte tema para os políticos. Quase não passava um dia sem a preocupação de como os imigrantes sírios e afegãos poderiam ser "integrados" à sociedade alemã. Samer tem sua própria visão de integração: "Por muito tempo, ela significou que se devia viver como os alemães. Mas isso não é integração. Integração é quando se convive, quanto se encontram bases comuns." Trabalho com os europeus As caminhadas por Neukölln foram um começo nessa busca por algo comum. "No passeio, encontramos gente, mostramos alguns lugares, e então surgiu a ideia: 'Vou me sentar com eles, vamos continuar conversando.' Eles têm muitas perguntas, e a caminhada é muito curta." Assim, Samer e Arij começaram com suas "oficinas de contar histórias" no Refugio, acompanhadas de comida síria. "Sabe, quando cheguei aqui, muitas organizações trabalhavam sírios. Mas estou fazendo o contrário: estou trabalhando com os europeus, com os americanos, com quem vive por aqui." Ele estima – e ri ao lembrar-se – que menos de 10% de quem veio às oficinas conhecia um refugiado antes. "Então começamos a falar sobre refugiados e integração. Havia muitas perguntas, e as respondemos. Conversamos sobre o significado de 'refugiado', o que eles pensam dos refugiados, e conversamos sobre a situação antes e depois de chegarmos aqui." A ideia do restaurante nasceu dessas oficinas em 2019. Ele foi reaberto recentemente, depois de quase falir, devido às medidas de isolamento da pandemia. "Não é apenas um negócio", enfatiza Samer. "Quem vem aqui são fregueses só por cinco minutos. Depois, começam a ser nossos amigos. Aqui, eles se sentem como se estivessem em casa." Autor: Ben Knight

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