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Ondas de calor fatais aumentarão mesmo com aquecimento de 2º C

19:01 | Jun. 19, 2017
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As mudanças climáticas vão aumentar a frequência das ondas de calor letais, mesmo que a humanidade limite o aquecimento global a dois graus Celsius, conforme prevê o Acordo de Paris, disseram cientistas nesta segunda-feira.

Cumprir o compromisso assumido por 196 países até 2100 ainda deixaria quase a metade da população mundial exposta pelo menos uma vez por ano a períodos de calor e umidade que se mostraram fatais no passado, informaram os pesquisadores na revista científica Nature Climate Change.

Em um cenário de manutenção do status quo, em que os gases de efeito estufa continuam sendo lançados na atmosfera nos níveis atuais, três quartos da humanidade enfrentarão anualmente o que os pesquisadores chamam de eventos de calor letais.

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"Descobrimos que as ondas de calor letais em todo o mundo estão se tornando mais comuns, e que essa tendência já parece inevitável", disse Camilo Mora, professor da Universidade do Havaí e autor principal do estudo.

"Mesmo que superemos os objetivos de Paris, a população exposta ao calor mortal será de cerca de 50% até 2100", disse à AFP.

Hoje em dia, 30% dos habitantes da Terra passam por períodos de calor extremo em algum momento do ano.

Desde o início do século XXI, as ondas de calor deixaram milhares de mortos, mesmo em países melhor equipados para ajudar seus cidadãos a lidar com o clima extremo. Na Europa Ocidental, por exemplo, houve mais de 70.000 mortes durante o verão intenso de 2003.

No futuro, os trópicos serão mais atingidos, de acordo com o estudo, que prevê - ano a ano, para cada quilômetro quadrado da Terra - o número de "dias mortais" sob três diferentes cenários de poluição por carbono definidos pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

A Indonésia, as Filipinas, o norte do Brasil, a Venezuela, o Sri Lanka, o sul da Índia, a Nigéria, a maior parte da África Ocidental e o norte da Austrália enfrentarão mais de 300 dias de ondas de calor potencialmente letais cada todos os anos sob a trajetória atual de emissões, conhecida como RCP 8.5.

Mesmo sob o cenário de emissões mais otimista (RCP 2.6) - que corresponde aproximadamente ao objetivo de Paris de limitar o aquecimento a 2º C - megacidades como Jacarta, Lagos, Caracas e Manila ultrapassariam o limiar de "calor letal" durante metade do ano, concluiu o estudo.

"Com altas temperaturas e umidades, basta um pequeno aquecimento para que as condições se tornem mortais nos trópicos", disse Mora.

Cidades nas zonas subtropicais, como Miami ou Hong Kong, ficariam expostas 150 e 200 dias por ano, respectivamente, no pior dos casos, e 80 e 140 dias na projeção do RCP 2.6.

Washington D.C. será afetada por um calor potencialmente mortal em média 15 dias por ano se o objetivo de Paris for atingido, e 85 dias por ano se nenhuma ação adicional for tomada para lutar contra as mudanças climáticas.

O número de "dias de calor letal" não indica quantas pessoas vão morrer, ressaltam os autores. Se todos estiverem vivendo em ambientes com ar-condicionado daqui a 50 ou 75 anos, estarão protegidos.

Mas esse não é o caso hoje, e as ondas de calor prolongadas também são penosas para redes de energia e infraestruturas críticas.

"O estudo fornece evidências adicionais e fortes de que as mudanças climáticas, se não foram mitigadas, resultarão em um aumento de condições mortais para os humanos", comentou Jeremy Pal, professor da Universidade Loyola Marymount, em Los Angeles, cuja pesquisa em 2015 projetou mais ondas de calor no Golfo Pérsico que excedem a capacidade do corpo humano de suportá-las.

O trabalho de Pal estabeleceu um limiar de sobrevivência humana, uma medida usada por cientistas que combina temperatura e umidade.

Mora adotou uma abordagem diferente. "Nosso limiar foi baseado em casos reais de mortalidade humana", disse à AFP. Sua equipe internacional de 18 cientistas identificou 1.900 locais em todo o mundo onde as ondas de calor resultaram em mortes desde 1980.

"Nós coletamos dados climáticos para cada local e momento em que foi registrada uma morte relacionada ao calor", explicou o coautor Iain Caldwell, também da Universidade do Havaí.

Comparando estatisticamente essas ondas de calor com períodos "normais", os pesquisadores descobriram os principais fatores que contribuem para o excesso de mortalidade.

A temperatura e a umidade estão no topo da lista. A duração da onda de calor também importa, mas - surpreendentemente - não melhorou significativamente a precisão preditiva.

Os pesquisadores então ligaram suas descobertas com as projeções médias de 20 modelos climáticos globais que se estendem até 2100.

A umidade elevada reduz a capacidade do corpo humano de esfriar através da transpiração.

"Quando é ao mesmo tempo muito quente e úmido lá fora, o calor no corpo não pode ser expelido", disse Mora. "Isso cria uma condição chamada citotoxicidade por calor que é prejudicial para muitos órgãos".

"Pense nisso como uma queimadura de sol, mas dentro do corpo", acrescentou.
Um mapa interativo que mostra as projeções dos "dias de calor letal" para qualquer região do mundo pode ser consultado neste link.

AFP

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