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Terremoto mostra vulnerabilidade do patrimônio histórico italiano

País fica numa das áreas mais propensa a terremotos da Europa, mas adaptação de construções antigas esbarra em questões políticas e culturais. Segundo especialista, obras preventivas são relativamente simples
09:29 | Ago. 29, 2016
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Abalo sísmico devastou diversos vilarejos na região central da Itália, como AmatriceA destruição parcial ou total de diversos vilarejos da região central da Itália pelo terremoto da última quarta-feira, 24, mostrou mais uma vez a vulnerabilidade de grande parte do patrimônio histórico do país.

O abalo sísmico, que eclodiu por volta das 3h30 (hora local), matou quase 300 pessoas e deixou dezenas de desaparecidos, presumivelmente mortos entre os escombros.

A Itália é provavelmente o país mais propenso a terremotos na Europa, mas muitos dos moradores de Amatrice e outras cidades medievais arruinadas pelo tremor de magnitude 6,2 temiam que a adaptação de seus edifícios antigos saísse muito dispendiosa.

"Nesta zona do país, muitos dos prédios são bastante frágeis e malcuidados porque não estão em uso durante boa parte do ano somente no verão", afirma Dina D'Ayala, professora de Engenharia de Estruturas Dina D'Ayala do University College de Londres (UCL).

Durante a Idade Média, era comum a construção aglomerada de prédios urbanos por motivos financeiros, climáticos e de segurança. Mas sem reparos regulares e sem a conformidade com as mais recentes normas de edificações a prova de terremotos, tais edifícios são frequentemente fracos demais para resistir a uma forte atividade sísmica.

"Possuímos uma boa compreensão de como esses edifícios justapostos se comportam de um ponto de vista sísmico, e onde foi feito reforço, provou-se sucesso", afirma D'Ayala, explicando que os custos não foram proibitivos.

A acadêmica italiana diz que muitas outras cidades na Úmbria, região próxima à zona devastada, foram submetidas à adequação a abalos sísmicos após serem atingidas por ao menos três grandes tremores nas últimas quatro décadas. E elas se saíram bem neste terremoto.

Regras mais rígidas

Na Itália, a mais recente modificação do Código de Obas e Edificações, em 2008, estipulou especificamente o fortalecimento de estruturas já existentes, em particular as históricas. Mas edifícios menores ainda não estão sujeitos à nova regulação. Para D'Ayala, o fato de o governo ainda não ter imposto o código de forma abrangente se deve a questões políticas e culturais.

"Já que temos terremotos com bastante regularidade, além de tremores menores que não ocupam, necessariamente, as manchetes internacionais, agora há uma grande indústria voltada para o desastre e reconstrução", diz D'Ayala, acrescentando que, para as grandes construtoras, a restauração é muito mais lucrativa do que a adaptação a abalos sísmicos.

De forma geral, a população gosta de mudar o projeto de suas casas construindo, algumas vezes, um segundo pavimento em edifícios de pé-direito alto. Os moradores não percebem, porém, que tais modificações podem prejudicar a estabilidade estrutural de suas construções.

O reequipamento de edifícios antigos é um procedimento relativamente simples que envolve a colocação de cintas de metal entre as empenas e a fixação das lajes às paredes, mas muitos proprietários ainda não foram convencidos.

"As pessoas não acham que isso é importante, que poderia salvar suas vidas. Em vez disso, eles dizem: 'Eu vou investir numa TV nova e chamativa'", comenta a especialista.

Há também um ponto de interrogação sobre como algumas licenças de construção são concedidas quando as reformas são claramente inseguras. Mesmo edifícios modernos não estão sempre em conformidade com o código mais recente de construções antissísmicas.

O velho contra o novo

A alternativa ao reequipamento também pode significar o abandono de um número maior de cidades italianas medievais. Por todo o país, centenas de vilarejos decadentes já foram entregues à destruição, apesar da reputação italiana de conservar seu patrimônio cultural.

Um número crescente de italianos exige que edifícios antigos abram caminho para que estruturas modernas a prova de terremotos sejam construídas em terreno seguro. Após o tremor da semana passada, o governo italiano prometeu que as autoridades locais, não as instituições nacionais, vão decidir o que será reconstruído e onde.

D'Ayala, que antes trabalhava como engenheira sísmica no reequipamento de igrejas e outros edifícios históricos na Itália central, diz que grande parte da devastada cidade de Amatrice já havia sido reconstruída em duas ocasiões anteriores, depois de tremores nos séculos 16 e 18.

Mas apesar da apatia do público quanto a questões de segurança, D'Ayala diz sentir uma mudança de atitude, notando uma maior disposição para o cumprimento do código de obras, desde o terremoto de L'Aquila em 2009, o mais fatal na história recente do país.

"Uma nova geração de engenheiros foi educada para ser mais consciente e mais sensível à questão. Isso está provocando uma mudança cultural, mas leva tempo", conclui.

Autor: Nik Martin (ca)

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