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Referendo define destino de Morales na Bolívia

15:06 | Fev. 19, 2016
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Presidente boliviano já governa o país há uma década e, agora, quer mudar a Constituição para que possa ficar mais um mandato no poder. Seu apoio popular, no entanto, está minguando. Durante muito tempo, Evo Morales foi um dos presidentes mais populares da América Latina. Nas últimas eleições gerais, em 2014, o seu partido Movimento ao Socialismo (MAS) teve pela segunda vez mais de 60% dos votos. Neste domingo (21/02), os bolivianos deverão decidir em referendo se Morales pode se candidatar mais uma vez. Ainda um ano atrás, parecia que a população iria atender a esse desejo presidencial. Mas ele tem perdido apoio nos últimos meses. Nas eleições regionais e municipais, os candidatos do MAS tiveram que ceder cargos importantes para a oposição. Além disso, Morales teme perder ainda mais apoiadores, pois a crise econômica deverá se acentuar ainda mais até 2017. Os seus seguidores estão diminuindo porque, cada vez mais, constatam que a política de Morales não se dirige nem a todos os bolivianos nem a todos os povos indígenas. Voz dos oprimidos Mas foi justamente com essa promessa que o líder do sindicato dos plantadores de coca se tornou em 2005 "o primeiro presidente indígena da América Latina". Foi assim que Morales se apresentou, embora antes dele tenha havido outros presidentes com raízes indígenas inclusive na própria Bolívia. Além disso, a sua formação cultural não combina exatamente com esse cenário: ele não cresceu numa comunidade indígena nem fala a língua de povos nativos. De qualquer forma, a estratégia funcionou: Evo é um homem que veio direto do povo nativo oprimido. Segundo a alemã Anne Weiss, que supervisionou durante quase 30 anos projetos sociais na Bolívia, Morales também fez por onde merecer esse apoio. "Ele deu uma voz a essas pessoas", diz Weiss, que pediu que seu nome real fosse alterado pela reportagem da DW, para que o trabalho de sua organização não seja prejudicado. Corrupção e opressão Esse fato já diz muito sobre a forma como o MAS e Morales tentam consolidar o seu poder: há cada vez mais relatos de ameaças contra críticos e oposicionistas. Segundo observadores, quem apoia o governo pode contar com recompensas. A acusação mais recente de corrupção atinge o próprio presidente, e isso uma semana antes da consulta popular: Morales teria concedido sigilosamente à empresa chinesa Camce encomendas no valor de cerca de 500 milhões de euros (2,2 bilhões de reais). A ex-esposa do presidente faz parte da diretoria da empresa. Mesmo que essas acusações tenham sido espalhadas propositalmente, Morales já tomou suas precauções: "Boa parte da mídia boliviana é controlada pelo governo. Os poucos meios de comunicação independentes se submetem à autocensura para evitar problemas", escreveu a Fundação Konrad Adenauer (FAZ) em relatório sobre a Bolívia. Não importa quantas vezes as mídias fomentem a imagem do indígena ligado à terra cada vez mais bolivianos percebem que há algo de errado. Pois aumentam os casos de violação dos direitos de comunidades indígenas por parte do governo. Especialmente quando se trata da exploração de matérias-primas como gás natural e minério, as empresas de exploração nacionalizadas não poupam o habitat natural das comunidades indígenas. Pois a receita proveniente dessa exploração é de grande importância para o governo, já que é daí que vem grande parte do dinheiro usado para financiar seus benefícios sociais. Turbulência econômica à vista Ainda não se sabe quanto tempo isso ainda vai funcionar, tendo em vista a queda dos preços das commodities. Pois, em vez de aproveitar o boom dos últimos anos para desenvolver estruturas sustentáveis ou ao menos acumular reservas para tempos piores, Morales fomentou o consumo, inflando assim o crescimento. Na Venezuela e no Brasil, já ficou claro aonde isso leva. Também na Bolívia, os economistas preveem uma crise iminente para a prosperidade econômica registrada até o momento. O setor privado vai ser particularmente afetado, pois o salário mínimo estatal deixa pouco espaço para as empresas compensarem as perdas de demanda. "Pequenas empresas já estão tendo que fechar, porque não podem arcar mais com o último aumento do salário mínimo", diz Weiss. A assistente social alemã pode dar muitos exemplos em que talvez haja boa vontade, mas são pouco realistas: todos os professores na Bolívia devem aprender a língua quíchua ou aimará. Mas o que ganham os guaranis com isso? Na Bolívia, existem mais de 30 idiomas indígenas. Uma escola operada pela organização de Weiss poderá fechar em breve, se não conseguir reduzir o tamanho das turmas dos atuais 50 a 60 alunos para no máximo 30. "É claro que isso seria desejável, mas não dispomos nem de espaço nem de pessoal para tal." Para as crianças, o fechamento significaria que elas não poderiam ir à escola de forma alguma, explica Weiss. "Nas ruas estão os traficantes que oferecem a muitas crianças perspectivas mais atraentes." Última chance de Morales? Ainda é mais do que incerto se Evo Morales vai conseguir, de fato, ganhar mais uma vez a eleição presidencial de 2019 embora o governo venezuelano tenha lhe mostrado, em 2013, como chegar a uma maioria nas urnas, apesar de uma desastrosa política econômica. Mas muita coisa pode acontecer nos próximos anos. Agora, o que está em jogo é a possibilidade de Morales poder se candidatar mais uma vez. Os analistas da Fundação Konrad Adenauer (KAS) consideram o momento adequado: a economia ainda é forte o suficiente e, há bem pouco tempo, os empregados receberam um 13° salário dobrado, que é uma parte obrigatória do salário mínimo. O que também angariou simpatia até mesmo entre os opositores foi que o governo em La Paz obrigou o Chile a voltar à mesa de negociações com a ajuda da Corte Internacional de Haia: há mais de cem anos, a Bolívia vem lutando por uma saída para o Pacífico em solo chileno. O referendo deste domingo vai mostrar se tudo isso vai ser suficiente para que Morales possa mais uma vez se candidatar à presidência boliviana. Autor: Jan D. Walter (ca)Edição: Rafael Plaisant

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