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"Selva" de Calais começa a ser removida

11:26 | Jan. 19, 2016
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Voluntários ajudam moradores na mudança em CalaisCom a construção de novos abrigos ao custo de 18 milhões de euros, escavadeiras já destruíram um terço do maior campo de refugiados da Europa. Caos e violência só são evitados por causa de voluntários. Lar momentâneo de quase 5 mil requerentes de asilo, "a selva" um acampamento em Calais, no norte da França, próximo à estrada que dá acesso às balsas em direção à Inglaterra terá um terço de suas construções removidas, para a criação de uma zona de segurança entre os barracos e a rodovia. O objetivo é barrar a aproximação de refugiados a veículos que vão para o Reino Unido. Com tantas pessoas vivendo em meio a pilhas de lixo e lama misturada com neve, uma cena caótica e potencialmente violenta só foi evitada na segunda-feira (19/01) porque centenas de voluntários europeus ajudaram os habitantes do acampamento a remover suas coisas. Cerca de 1.500 pessoas foram realocadas. Voluntário no acampamento há quase quatro meses, o jovem londrino Ben Harrison, de 20 anos, descreve a ação como "um esforço monumental". "Pessoas ouviram sobre o despejo e vieram do Reino Unido com caminhões e trailers para ajudar na mudança das casas", conta. "Sem a ajuda voluntária, a polícia teria usado gás lacrimogêneo para tirar as pessoas de suas casas. Foi ruim mudá-los assim, mas evitamos qualquer possibilidade de violência." "É cruel despejar pessoas no inverno" Harrison conversa com a reportagem da DW no Kabul Café, um dos muitos estabelecimentos que fazem a "selva" parecer mais com uma pequena cidade do que com um acampamento de refugiados. Vestindo uma jaqueta amarela cheia de lama, tomando um copo de chá e com olhos pensativos, o jovem afirma que "é cruel despejar pessoas no inverno", mas lembra que, pelo menos, a demolição foi anunciada com antecedência. "O último despejo ocorreu em setembro embaixo do viaduto. As máquinas chegaram sem aviso, no meio da noite, e as pessoas não tiveram tempo de pegar documentos, requerimentos de asilo e os poucos itens pessoais que ainda possuíam. Às vezes o governo tolera o acampamento, e outras vezes não", explica. A demolição veio após o novo governo abrir abrigos adjacentes à "selva". As moradias custaram 18 milhões de euros e são compostas por containeres brancos com capacidade para receber 1,5 mil pessoas. O local rodeado por uma cerca é vigiado por seguranças. Cerca de 300 pessoas já foram transferidas para o novo abrigo, e 50 pessoas são recebidas nos containeres diariamente, afirma Barbara Jurkiewicz, relações públicas da La Vie Active, organização que administra o local. No local é realizado um escâner 3D da palma da mão dos futuros moradores. A medida é controversa. Muitos residentes da "selva" temem que as chances de deixar a França sejam reduzidas com qualquer forma de identificação junto ao governo francês. "Não quero ficar na França, queremos ir para o Reino Unido", diz Abdul Mumam, um refugiado sudanês que está em Calais desde outubro. "Prefiro ficar aqui, pois a polícia vai tirar minhas impressões digitais e me obrigar a pedir asilo na França." Apesar as temperaturas congelantes e dos ventos cortantes do Báltico, muitos requerentes de asilo compartilham a opinião de Mumam, expressando uma profunda desconfiança com o governo e a polícia francesa e optando por permanecer em abrigos precários demais para o inverno europeu. "Damos boas-vindas as pessoas que se mudam para os containeres, mas não podemos os forçá-los a nada", reforça Jurkiewicz. Mais de 15 anos de existência A "selva" existe há mais de 15 anos, perto da entrada do Eurotúnel na fronteira da França com a Inglaterra. Embora a recente onda migratória tenha trazido mais refugiados para Calais, as precárias condições do campo não são novas. Frustrados com anos de inação, voluntários no local condenam as Nações Unidas e políticos europeus pôr não reconhecerem "a selva" como um campo oficial, o que permitiria aos seus habitantes receberam assistência da agência da ONU para os refugiados (Acnur). Mas quando essas reclamações chegam a Celine Schmitt, uma representante do Acnur que monitora a situação no local, ela questiona se o estabelecimento de outro campo de refugiados na França é realmente a solução. "É importante colocar as pessoas em um local seguro e quente", diz Schmitt, lembrando que a França possui vários abrigos para requerentes de asilo. "As condições são difíceis aqui, e é difícil para as pessoas pensarem sobre o futuro e tomarem boas decisões." Schmitt afirma ainda que um funcionário do Acnur será enviado à "selva" para informar os habitantes sobre o processo de asilo e os direitos dos refugiados. A ONU também oferece transporte e incentiva os migrantes a irem para um abrigo do governo, onde serão acomodados e receberão comida. Desde o outono, cerca de 2 mil pessoas foram para esses centros, e muitas abriram processos para ficar na França, conta Schmitt. Voltando ao Cabul Café, Ben Harrison faz uma ligação atrás da outra enquanto escavadeiras começam a limpar o terreno na área afegã. Ele afirma que quase todos foram removidos do local antes da chegada das máquinas, mas que continua ansioso por uma solução para a "selva": "É difícil condenar alguém por fazer o que o sistema internacional permite. Agora temos essa situação onde médicos e contadores vivem em tendas, tremendo com temperaturas congelantes, entre muitas doenças." Autor: Diego Cupolo, de Calais (cn)Edição: Rafael Plaisant

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