O ano do terror na Europa
Atentados confrontaram europeus com novo tipo de ameaça, que floresce também dentro de seu próprio território. Enquanto se discute integração de imigrantes, uma guerra se abre no Oriente Médio e sem um fim aparente.
O ano de 2015 termina como começou: com ecos do terror no coração de Paris. Em janeiro, o semanário satírico Charlie Hebdo e um mercado judaico foram os alvos 17 pessoas morreram. Em novembro, foram 130 vítimas em diferentes pontos da capital.
Não só a França, como toda a Europa, reagiu em choque. Em janeiro, o presidente François Hollande falou em "barbárie monstruosa". Agora, no fim do ano, ele vê seu país em guerra contra o "Estado Islâmico", que opera na Síria, no Iraque e no Norte da África. "O que aconteceu ontem em Paris foi ato de guerra", disse então.
O ano chega ao fim com uma coalizão improvável contra o "Estado Islâmico", unindo agora também a Rússia. Mas o conflito na Síria continua. E, apesar de haver alguns sinais de que pode existir uma saída negociada para a crise, EUA, Rússia, Arábia Saudita, Irã, França e Turquia parecem ter além do EI como alvo comum objetivos diferentes para a região.
O potencial explosivo da situação ficou aparente quando um jato russo foi derrubado pelas Forças Armadas turcas em novembro. As relações bilaterais esfriaram significativamente desde então, mas uma escalada foi evitada.
Continente busca união
Alemanha e outros aliados europeus, como Reino Unido e Dinamarca, estão agora colocando sua declarada solidariedade em prática. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, prometeu apoio ilimitado à França. Logo depois, jatos Tornado de reconhecimento, um navio e aeronaves de abastecimento foram enviados à Síria.
Especialistas em segurança alertam que a Alemanha já é há tempos um potencial alvo de terroristas mais do que nunca neste fim de ano. "Nós, seus amigos alemães, nos sentimos bem próximos de vocês. Estamos chorando com vocês", disse Merkel aos franceses em novembro.
"Je suis Charlie." Com essa frase pessoas na França e ao redor do mundo demonstraram sua vontade de resistir contra o terrorismo. O ministro das Relações Exteriores iraniano, porém, continuou a condenar a publicação de caricaturas de Maomé.
A marcha da solidariedade de líderes mundiais em Paris orquestrada numa rua paralela à manifestação popular "por razões de segurança" acabou se tornando algo embaraçoso. Em novembro, atos do tipo tiveram que ser cancelados, dado o perigo que a situação alcançou.
Destaz vez, sapatos foram colocados na Place de la Republique: "Je suis Paris" virou o slogan. Os franceses cantaram fervorosamente a Marselhesa. E, apenas quatro semanas após os atentados, o partido populista de direita Frente Nacional obteve vitórias importantes nas eleições regionais.
Ataques em série
Além dos ataques em Paris, a França foi alvo de diversos outros atos terroristas de menores proporções. Em abril, uma mulher foi morta a tiros por um agressor que tinha como objetivo atacar uma igreja cristã. Em junho, um ataque a uma fábrica de produtos químicos nas proximidades de Lyon fracassou por pouco. No atentado, um homem foi decapitado por um suposto simpatizante do EI.
Em agosto, um islamista foi dominado por passageiros em um trem de alta velocidade antes de conseguir realizar um atentado, e em novembro, um judeu foi esfaqueado em Marselha.
Em fevereiro na Dinamarca, duas pessoas foram mortas em ataques a um centro cultural e uma sinagoga, levando o país a declarar guerra ao terror. Após o ataque, o rabino-chefe Jair Melchior declarou: "Os judeus dinamarqueses são parte da sociedade. É por isso que nos sentimos tão especiais aqui. Se alguém depositar uma flor do lado de fora, não é para expressar solidariedade aos judeus, mas sim, porque um dinamarquês foi morto."
Também ocorreram ataques de cunho terrorista em Berlim e Londres. A Turquia e a Rússia foram fortemente atingidas: centenas de pessoas morreram em atentados em Ancara e Suruc, e um avião de passageiros russo foi abatido sobre a Península do Sinai. Nos dois casos, há suspeita de envolvimento de islamistas.
UE reforça segurança
A União Europeia prometeu ajuda militar à França, seguindo o parágrafo 42 do Tratado de Lisboa, que especifica que se um Estado vier a ser alvo de agressão armada no seu território, os outros Estados-Membros devem prestar-lhe auxílio e assistência por todos os meios ao seu alcance, em conformidade com o artigo 51 da Carta das Nações Unidas".Essa é uma medida sem precedentes.
Os ministros do Interior do bloco pedem maior cooperação entre os serviços de inteligência e as polícias, com a intenção de aumentar o monitoramento de viagens e transferências financeiras. Mas, os trâmites burocráticos são demasiadamente lentos. Os mesmos compromissos e exigências foram mencionados tanto no início quanto no final do ano. A implementação de uma legislação sobre o tema poderá levar meses, ou até mesmo, anos.
A abertura das fronteiras internas da Europa está indubitavelmente sob pressão. Primeiramente, em razão dos refugiados, que há meses chegam em grande número ao continente sem serem devidamente controlados. Além disso, a Europa se deu conta que terroristas com passaportes europeus podem viajar despercebidamente ou se misturar ao fluxo de migrantes que chegam à França da Síria, sem serem identificados.
O ministro alemão do Interior, Thomas de Maizière, já pediu maior proteção às fronteiras externas da Europa. "Milhares de jihadistas estrangeiros estão na Síria combatendo ao lado do autoproclamado 'Estado Islâmico'. de lá, ataques terroristas estão sendo planejados e realizados na Europa. É por isso que temos que saber quem viaja da Europa e quem retorna à Europa, para que possamos reagir adequadamente", declarou o ministro após uma das muitas reuniões extraordinárias sobre o combate ao terrorismo.
A UE planeja no futuro armazenar e avaliar dados sobre viagens aéreas. Uma guarda multinacional de fronteira será criada, uma vez que países como Grécia, Itália e Bulgária não conseguem dar conta do fluxo de entrada de migrantes.
A Bélgica como reduto de radicais
Quase todas as pistas deixadas pelos autores dos atentados de Paris levam à Bélgica. Os ataques foram aparentemente organizados em Molenbeek, um bastião islamista em Bruxelas que já há anos é monitorado pelas autoridades belgas.
A rede de metrô, lojas, escolas e universidades foram fechadas por alguns dias após os ataques. Depois, enquanto o dia a dia voltava ao normal, políticos debatiam sobre de quem seria a culpa pela falha na integração de muçulmanos.
A Bélgica está lutando contra a reputação de ser um "Estado falho" em termos de segurança, como cunhou a revista alemã Der Spiegel. Soldados estão patrulhando as ruas neste fim de ano. Difícil dizer, porém, se isso transmite de fato uma sensação de segurança.
Autor: Bernd Riegert (rpr/rc)