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Para diretor, temática religiosa do filme "Os Mucker" segue atual

14:45 | 19/08/2015
Fundamentalismo religioso continua presente na sociedade brasileira, afirma cineasta alemão Wolf Gauer, que participou em São Paulo de um debate sobre o seu filme que narra a história da seita religiosa gaúcha. Por volta de 1824 chegavam ao sul do Brasil os primeiros imigrantes da Alemanha, em fuga principalmente da pobreza e movidos pela esperança de uma vida melhor. Cinquenta anos depois, um novo grupo de alemães desembarcava na mesma região, mas com maior dificuldade para se estabelecer: as melhores terras do Vale do Rio do Sinos, no interior do Rio Grande do Sul, já estavam ocupadas. O filme Os Mucker, co-produção de 1978 do diretor alemão Wolf Gauer com o brasileiro Jorge Bodanzky, foi exibido no último fim de semana na Cia Paidéia de Teatro, em Santo Amaro, zona sul de São Paulo. A exibição foi seguida de um debate entre o público e Gauer. A obra narra a trajetória de um grupo socialmente isolado, que não usava dinheiro em suas trocas comerciais e cujos membros não bebiam nem fumavam. No sectarismo e no fundamentalismo religioso, eles encontraram uma resposta à necessidade de sobreviver em condições miseráveis. O grupo é liderado por Jacobina Mentz, considerada pelos seguidores como uma nova Jesus Cristo, e seu marido, João Jorge Maurer, curandeiro. Jacobina, além de um gênio forte, tinha epilepsia, "desde os tempos antigos vista como predestinação divina", como afirma Gauer, e não demorou a se tornar "porta-voz e líder dos menos afortunados". Temática contemporânea Acusados de feitiçaria e rechaçados pela comunidade da região, os seguidores de Jacobina foram exterminados pelo poder estatal. "Quem era diferente logo era considerado bruxo, feiticeiro ou criminoso, principalmente pelas igrejas tradicionais", comenta Gauer. "O filme tenta explicar a origem da violência entre grupos sociais, mesmo sendo esses grupos quase homogêneos e de caráter religioso." Ainda que Os Mucker se passe no século 18, alguns aspectos abordados no filme permanecem atuais. "Jacobina recorreu ao pensamento religioso porque não tinha outro modelo de pensar", afirma Gauer. "Existem processos parecidos na atualidade brasileira, como o afluxo de pessoas pobres a seitas religiosas e a autodenominadas 'igrejas', que prometem resolver com 'milagres' os problemas dos que aderem. Há um fundamentalismo generalizado", diz. O diretor explica que o filme tem falas em alemão e em português, de acordo com a língua nativa dos que participaram da produção. "Muitos descendentes dos Mucker, e que não eram atores profissionais, trabalharam no filme", diz Gauer. "Até o surgimento do filme, a história dos Mucker era vista como uma 'mancha negra' do Rio Grande do Sul. Depois dele, alguns atores declararam se sentir 'absolvidos' do trauma de serem descendentes de supostos criminosos", afirma. Sobre a coprodução de filmes com Bodanzky Gauer no roteiro e o brasileiro na câmera , que começou com filmes educativos na Alemanha, o diretor alemão afirma que foi o interesse social que inspirou os trabalhos. "Trata-se da abordagem de processos e conflitos dentro da sociedade que não são explicados pela mídia. E com a prerrogativa de sempre trazer a participação da população envolvida com a história de cada filme." Educação pela arte "Imigração, fuga, pobreza e exílio são assuntos muito atuais, principalmente na Europa, mas também no Brasil", afirma Aglaia Pusch, cofundadora da Cia Paidéia. O grupo de teatro desenvolve trabalhos artísticos com crianças e jovens por meio de montagens teatrais, exibição de filmes, espetáculos de dança e exposições de arte que instiguem curiosidade e possibilitem discussões. Um dos principais objetivos da companhia, cuja sede fica em Santo Amaro, mas perto do bairro de classe média alta Chácara Flora, é colaborar com a educação "ampliando a formação cultural e a visão de mundo de jovens de várias classes sociais e diferentes situações de vida em São Paulo", como afirma Aglaia. "E o cinema é um bom caminho para estudar a história e a cultura de diferentes regiões do mundo", diz. A Cia Paidéia, que mantém uma forte ligação com a Alemanha desde sua fundação, já firmou parcerias com o Teatro Nacional de Mannheim, com o Junges Schauspielhaus, em Düsseldorf, e com o Teatro de Comédia de Colônia, além de manter um intercâmbio cultural duradouro com o Grips Theater, de Berlim. A sede da companhia recepcionará agora a 9ª edição do Festival Internacional Paidéia de Teatro para a Infância e Juventude: Uma Janela para a Utopia, de 25 de setembro a 1º de outubro. O evento contará com a participação de espetáculos e oficinas com artistas de Brasil, Alemanha, Dinamarca e Turquia. Autor: Gabriela SoutelloEdição: Alexandre Schossler
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