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A aposta internacional mais arriscada de Obama

15:29 | 14/07/2015
Presidente americano posiciona acordo com Irã ao lado da reaproximação com Cuba, como marcos de seu governo. Só que os riscos desta vez são maiores, e é improvável que se vejam efeitos concretos num curto prazo. Quando, ao tomar posse em janeiro de 2009, Barack Obama prometeu estender as mãos "aos que descerrarem os punhos (...), mesmo àqueles que estão no lado errado da história", poucos duvidaram de que ele tinha os líderes iranianos em mente. Seis anos depois, Obama conseguiu um acordo que até seus aliados já começavam a ver como improvável. Nos últimos meses de negociações, esse acordo se provou mais complicado que seus projetos anteriores em política externa: a aproximação com Cuba e Mianmar. Alcançado com ajuda de outras cinco potências, o acordo abre definitivamente as portas para o fim de mais de três décadas de animosidade entre Teerã e Washington. Pode ser comparado ao de Camp David (1978), que firmou a paz entre Israel e Egito, ou à reconciliação com a China, em 1972, então inimiga americana de longa data. O entendimento com o Irã carrega o que vem sendo uma marca de Obama em política externa nesta reta final de segundo mandato: o uso da diplomacia e do multilateralismo para resolver conflitos gerados durante a Guerra Fria. E constitui, sobretudo, a aposta internacional mais arriscada de sua passagem pela Casa Branca. "Pouco do que foi anunciado nesta terça-feira elimina a capacidade do Irã de, em algum momento no futuro, se tornar uma potência nuclear apenas posterga esse dia", escreve o New York Times. Possível aliado contra EI O acordo encerra mais de uma década de negociações, com um compromisso que tem potencial para mexer no frágil equilíbrio geopolítico no Oriente Médio. O Irã mantém a capacidade de produzir energia nuclear, se legitima em fóruns internacionais, e aos poucos verá serem levantadas as sanções ocidentais, que sufocam sua economia. Os Estados Unidos, por outro lado, interrompem o caminho iraniano rumo à obtenção de armas nucleares. O primeiro efeito desta nova era nas relações bilaterais pode ser uma eventual cooperação por parte do regime dos aiatolás no combate aos extremistas do "Estado Islâmico". O Irã é a principal potência xiita do Oriente Médio, hostil tanto a Israel quanto aos aliados árabes sunitas de Washington, como a Arábia Saudita. Os aliados em Riad e Teerã lutaram guerras por procuração durante décadas na Síria, Líbano, Iraque e Iêmen. Mas americanos e iranianos têm hoje motivos para cooperarem contra os inimigos comuns, acima de tudo o "Estado Islâmico" (EI). Os EUA vêm realizando ataques aéreos contra a organização jihadista, enquanto Teerã ajuda milícias iraquianas que combatem no solo. Para Obama, a diplomacia com o Irã se posiciona como um marco de seu governo, ao lado da normalização das relações com Cuba. Só que críticos do acordo destacam que o regime dos Castro não apresenta qualquer ameaça aos interesses americanos, e que derrubar as sanções a Teerã impõe muito mais riscos. "Há uma chance real de que, durante a primeira fase de colocar as coisas em funcionamento, vejamos ações de ambos os lados que vão minar a durabilidade do acordo", disse à agência de notícias AFP a analista política Suzanne Maloney, do Brookings Institution. Resistência em várias frentes Entre os maiores críticos da política externa de Obama está Henry Kissinger. Ao lado do também ex-secretário de Estado americano George Shultz, o artífice da reaproximação com a China descreveu o acordo com o Irã como um erro fatal, que não ajuda em nada "a acabar com três décadas e meia de hostilidade extremista ao Ocidente". O Congresso americano, cujas duas Casas são dominadas pelos republicanos, terá agora dois meses parar dar um parecer sobre o acordo. Uma rejeição é provável, mas Obama tem o poder de vetá-la. O veto presidencial só será revogável caso os congressistas consigam juntar dois terços dos votos na Câmara dos Representantes e no Senado. Outro desafio para Obama nos próximos meses será convencer seus aliados no Oriente Médio de que o acordo é, de fato, vantajoso. Em relação às monarquias sunitas que veem Teerã como uma ameaça, isso é até possível. Com os israelenses, no entanto, um sucesso é improvável. De todo modo, o acordo deve ficar como um marco da gestão Obama: até poucos anos atrás, Teerã era para Washington parte do "Eixo do Mal", e os EUA eram para o Irã o "Grande Satã". A questão nuclear era um dos pontos altos de um conflito que já durava desde 1979, quando foram rompidas as relações bilaterais. Porém, segundo a imprensa americana, ninguém na Casa Branca está interessado de fato em estabelecer uma relação mais ampla com o regime dos aiatolás num curto prazo. O Irã continua na lista americana dos países patrocinadores do terrorismo, da qual Cuba foi recentemente retirada. E, como o próprio Obama admitiu nesta terça-feira, o acordo de Viena é baseado não na confiança, mas na verificação. Autor: Rafael PlaisantEdição: Augusto Valente
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