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Entre o orgulho e o medo de uma Grécia sem o euro

16:33 | 24/06/2015
Passeatas revelam divergências entre a população grega sobre a forma como o governo Tsipras lida com a UE. Mas poucos parecem dispostos a sacrificar a estabilidade da moeda única em nome da dignidade nacional. Kostas Sinodinos tem 31 anos e é pós-graduado em relações internacionais. Como a maioria dos gregos, tem tido dificuldade para encontrar emprego, por isso se sustenta manufaturando miniaturas para colecionadores. Os últimos anos foram duros, argumenta, principalmente porque políticos corruptos levaram o país à bancarrota para, em seguida, vendê-lo à União Europeia (UE) em troca de medidas de austeridade ridiculamente punitivas, que mataram a economia nacional. "Os governos anteriores costumavam ir até a UE e voltar uns cinco minutos mais tarde com um novo acordo. Agora, com esse novo governo, já se foram cinco meses e nós não temos nenhum acordo. Assim é que negociações devem ser: duras." Mas, apesar de o impasse ter empurrado a Grécia até a beira da falência, Sinodinos faz questão de que o país permaneça na zona do euro. "Fizemos sacrifícios antes da crise. Não podemos simplesmente sair, porque aí vamos entrar em colapso, e todo o sistema vai junto." O novo governo antiausteridade em Atenas está torcendo para que seus credores internacionais o Banco Central Europeu, o Fundo Monetário Internacional e a Comissão Europeia considerem que o destino da Grécia e o da eurozona estão interligados. O primeiro-ministro Alexis Tsipras afirma que seu partido, o esquerdista Syriza, é a favor do euro, e deseja que os pesos-pesados europeus, como a Alemanha, reconheçam que políticas de austeridade matam economias e dividem nações. Reformas necessárias estão emperradas À medida que tenta fechar um acordo, o governo de coalizão liderado por Tsipras tem voltado atrás em praticamente todas as suas promessas de campanha. A versão atual inclui impostos mais elevados para os gregos de maior renda e o abandono gradual da aposentadoria precoce, para possibilitar a reforma do pouco flexível sistema nacional de pensões, que é o mais caro da Europa. A Grécia precisa alcançar um consenso com seus credores ainda nesta semana, já que seus cofres estão perigosamente vazios. Atenas alega não ter como restituir até 30 de junho o valor de 1,55 bilhão de euros que deve ao FMI. Contudo, se deixar de pagar esse empréstimo, o país poderá se precipitar num processo de falência descontrolado, podendo desencadear uma corrida aos bancos ou controles de capital, e, por fim, sua saída da zona do euro. Tal perspectiva assusta muitos gregos. Segundo as pesquisas de opinião, a maioria da população prefere continuar na zona do euro, mesmo que isso signifique mais austeridade. Assim pensa, por exemplo, o médico Yiannis Vlachos, participante da manifestação pró-euro de 18 de junho, em Atenas, que também serviu como passeata antigoverno. O conservador culpa Tsipras e seu partido por irritarem os europeus: "Nós estávamos seguindo as regras e nos mantendo fora de confusão econômica. Agora, com esses esquerdistas, perdemos tudo." Também presente à manifestação, o pequeno comerciante Dimitris Yiannakopoulos diz entender por que o Syriza desafiou a União Europeia. "É uma questão de dignidade, da nossa dignidade, como eu entendo." "Mas esse governo é tão inexperiente. Eles não estão conseguindo passar a mensagem grega, de que temos de reformar, mas permanecendo na zona do euro. Eu não sei por que não conseguimos nos comunicar com essa gente em Bruxelas", queixa-se Yiannakopoulos. Metas iguais, opiniões diferentes Mesmo que o governo de Tsipras consiga a aprovação da UE para suas propostas e feche um acordo para que seja retomado o crédito tão urgentemente necessário, ele ainda pode ter que enfrentar uma briga no Parlamento e com os membros de seu próprio partido. Parte do Syriza é cético em relação ao euro e mesmo à filiação à União Europeia. Muitos estão habituados a demonizar os "eurocratas de Bruxelas", descartando qualquer concessão a eles. Como afirmou à emissora grega Mega TV o deputado do Syriza Alexis Mitropoulos, "é difícil qualquer acordo passar no Parlamento". Durante a passeata da última semana, viram-se numerosos sinais contra a UE. Para a estudante Zanetta Liskatou, "a União Europeia é boa para os capitalistas, mas não para o povo". Outro estudante, Thanos Likourias, vê o euro como uma prisão. "Você pode ter uma vida miserável com euros ou com dracmas", comentou, referindo-se à antiga moeda grega. "Não se trata apenas da moeda: a questão é quem controla o poder." O artesão Kostas Sinodinos, que participava da marcha pró-governo, resolveu "se infiltrar" na passeata pró-euro. Trajando camiseta com o logo de um grupo de punk-rock, ele destoava da multidão perfumada, de ternos bem passados e vestidos de grife. "Eu gostaria que eles pudessem ver que nós todos queremos a mesma coisa: um governo limpo, que não engane o próprio povo, e uma economia saudável na zona do euro, não fora dela. O acordo não vai ser uma espécie de varinha mágica: é só um começo, para podermos criar algo estável e caminhar adiante, em direção ao futuro", observa o especialista em relações internacionais. Autor: Joanna Kakissis (av)Edição: Rafael Plaisant
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