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Tensão no julgamento do "Contador de Auschwitz"

12:07 | 21/04/2015
Processo começa com debate histórico acalorado do lado de fora do tribunal na pequena cidade de Lüneburg. Enquanto sobreviventes enfatizam importância do julgamento, antifascistas e neonazistas se confrontam. Houve confusão na longa fila diante do prédio em Lüneburg onde, às 9h30 desta terça-feira (21/04), se iniciou aquele que pode ser o último processo relativo ao Holocausto. O réu é Oskar Groning, de 93 anos, apelidado pela imprensa alemã o "Contador de Auschwitz". O espaço na sala do tribunal, para apenas 60 espectadores, foi ocupado por cerca de 40 participantes de um grupo antifascista local, que já haviam chegado às 6h00 da manhã. Sua intenção principal foi assegurar assentos para os parentes dos coautores da ação coletiva, 65 sobreviventes do campo de extermínio Auschwitz-Birkenau. Contudo, a segunda meta era garantir que "essa gente" não entrasse, revela Henryk Kuzbik, um dos ativistas, apontando para um grupo de dez neonazistas, que só conseguiram lugar no meio da fila. "Seria insuportável para os familiares ter essa gente aqui. E queríamos mostrar que não há só nazistas." O líder informal dos extremistas, Thomas Wulff, que diz pertencer a um "movimento nacionalista", aproveita a ocasião para travar um acalorado debate sobre a história da Alemanha e o Holocausto com os jornalistas presentes. "Isso é um julgamento atrasado de vingança pelos Aliados. Não há defesa neste país", acusa. Segundo ele, Gröning "foi uma vítima da sua época, e agora é uma vítima do sistema judiciário alemão". Wulff acrescenta que ele próprio foi condenado a pena condicional de um ano e meio "por fazer perguntas". Neonazismo se faz presente Muitos alemães vieram até o Tribunal Regional de Lüneburg para demonstrar sua solidariedade com as vítimas do genocídio perpetrado pelo regime de Adolf Hitler. "É muito importante que esse julgamento esteja acontecendo agora", observa Meline Dumrese, uma das fundadoras da organização que pleiteou a construção do Memorial do Holocausto em Berlim, em 2005. Os neonazistas foram acompanhados por Ursula Haverbeck, viúva de um pastor que foi membro da liderança do Partido Nacional-Socialista. Já tendo sido multada várias vezes por negar o Holocausto, ela aparece num vídeo, postado na segunda-feira no YouTube, condenando o processo e convocando outros opositores a assisti-lo. Além disso, Haverbeck distribuiu um panfleto intitulado "Assassinato em massa no campo de concentração de Auschwitz?", onde questiona os dados históricos sobre o Holocausto e propõe estimativas mais baixas para o número de judeus executados um ato considerado ilegal na Alemanha. Negação do Holocausto Na aglomeração na pequena cidade de Lüneburg, na Baixa Saxônia, Kuzbik e seus companheiros entoam brevemente "Fora nazistas!" e ostentam uma bandeira de Israel. Wulff rebate com "Israel foi fundado por terroristas". A polícia inicialmente mantém separados os dois grupos, mas acaba ordenando que os extremistas de direita deixem o local. A ironia desse incidente é que Gröning está sendo julgado por ter ido a público na década de 80, justamente com o fim de rebater os negadores do Holocausto. Ele foi um dos poucos ex-servidores do regime nazista a tomar tal atitude. Seu testemunho sobre as próprias ações tanto para os promotores como em extensas entrevistas dadas em 2005 à revista Der Spiegel e outros veículos forneceram provas substanciais contra diversos antigos oficiais nazistas. Entretanto, essas mesmas informações estão sendo agora empregadas na ação contra ele. Importância para os sobreviventes Numa coletiva de imprensa nesta segunda-feira, a húngara Eva Pusztai-Fahidi, sobrevivente do campo de Auschwitz e coautora do processo, explicou o que a iniciativa jurídica representa para ela, pessoalmente: "Nos 70 anos desde que saí de Auschwitz-Birkenau, uma das coisas mais importantes que me aconteceram foi esse julgamento. É muito importante eu poder vivenciar o julgamento de um homem da SS que serviu em Auschwitz. A questão não é a punição, mas sim o veredicto." Para outra sobrevivente, Hedy Bohm, "o importante é que o julgamento esteja acontecendo". "Meu testemunho vai ser dar um pouco uma voz a meus pais e à minha família, que não estão aqui", comentou. Apesar de terem sido banidos do tribunal no primeiro dia do processo, os neonazistas estão sendo esperados também nos dias subsequentes. "Mas nós também vamos estar aqui", promete Kuzbik. "Vamos estar aqui a cada dia do julgamento." Estão programadas 27 audiências em Lüneburg, sendo o veredicto previsto para o fim de julho. Autor: Benjamin Knight (av)Edição: Rafael Plaisant
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