PUBLICIDADE
Notícias

O valor de uma vítima do voo 4U-9525

17:00 | 30/03/2015
Familiares dos passageiros do avião da Germanwings que caiu nos Alpes franceses serão indenizados. Quanto irão receber depende de uma série de fatores e pode não ser suficiente para preencher o vazio deixado pela perda. O pesadelo nos Alpes franceses, após a queda do avião da Germanwings que deixou 150 mortos na semana passada, deixa um rastro de incredulidade. Cada nova evidência que surge levanta mais dúvidas. Enquanto os investigadores prosseguem com os árduos esforços para descobrir o que aconteceu, os fatos ocorridos nos minutos fatais antes da queda começam a aparecer. Um atestado médico rasgado, uma porta de cabine trancada, oito minutos de silêncio seguidos de gritos e de uma colisão estrondosa. Até agora, as pistas apontam numa só direção: um copiloto de 27 anos com o desejo de morrer, escravizado por uma doença que escondeu de seus empregadores, teria derrubado propositalmente a aeronave. Mas, como isso pôde acontecer? Por que foi permitido ao copiloto Andreas Lubitz permanecer sozinho na cabine de comando? Como puderam falhar ao não notar sua doença? Teria a Germanwings feito o suficiente para evitar a tragédia? Essas questões não assombram apenas a todos os que tentam compreender o que ocorreu. Elas também irão perseguir a empresa subsidiária da Lufthansa nas próximas semanas e meses, enquanto advogados e empresas de seguros tentam estabelecer de quem é a culpa. E responder uma pergunta que ninguém quer fazer: Qual é o valor real de uma vida? É possível fixar um preço para a dor dos familiares das vítimas? A dura verdade é que, num caso como esse, a resposta é, provavelmente, cerca de 145 mil euros. Esse é o valor que uma empresa aérea deve pagar em caso de morte de passageiros, estipulado pelo acordo internacional conhecido como Convenção de Montreal, de 1999. Gundo Spinner, advogado alemão especializado em aviação, afirma que essa é a quantia máxima que os parentes das vítimas deverão receber. O especialista diz que, como aparentemente o copiloto agiu intencionalmente, a Germanwings não pode ser legalmente responsabilizada por seus atos. "A única pessoa que pode ser responsabilizada é o próprio copiloto, mas ele está morto. Apenas seus herdeiros nesse caso, provavelmente, seus pais poderiam, teoricamente, aceitar as obrigações legais em seu nome", abrindo, assim, a possibilidade de processos judiciais, diz o advogado. "Mas por que aceitariam tal responsabilidade, sabendo que teriam enormes prejuízos financeiros? Se forem inteligentes, irão rejeitar a herança, o que seria o fim de tudo", afirma. Sem espaço para emoções Seriam 145 mil euros capazes de preencher o vazio deixado pela perda de um ente querido? A maioria das pessoas diria que não é possível estabelecer um valor para uma situação dessas. Mas, para muitos, essa quantia não chega perto de compensar a raiva e a dor. Spinner, no entanto, diz que o sistema legal alemão deixa pouco espaço para emoções. "Os familiares não recebem compensações por danos em razão do sofrimento emocional, mas sim pela necessidade de se adaptar a uma nova vida. O valor é destinado a cobrir custos materiais associados a essa transição", afirma o jurista. O fato de o voo 4U-9525 ter caído em solo francês não interfere na situação legal dos familiares, diz Spinner. Nesses casos, os sistemas legais europeus diferem muito pouco. Até o momento, a Germanwings nega veementemente ter estado ciente da condição de saúde do copiloto. "Se alguém puder comprovar que a empresa ignorou propositalmente a lei, isso a deixaria na condição de cúmplice", o que mudaria tudo, acrescenta Spinner. Enquanto a maioria dos passageiros do Airbus A320 que ia de Barcelona a Düsseldorf era de origem alemã e espanhola, havia também cidadãos da Argentina, Austrália, Japão, Marrocos e Estados Unidos. Isso significa que a Germanwings poderia ser sujeita a processos judiciais em países onde o tratamento legal dado a questões desse tipo é bastante diferente do da Alemanha. "Alguns poderiam entrar com processos nos tribunais americanos, famosos por estabelecer compensações em valores exorbitantes", diz Spinner, apontando que as indenizações podem chegar a centenas de milhões de dólares. Lógica perversa Entretanto, alguns poderão acabar sendo injustiçados, como os pais dos 16 estudantes da escola Joseph König, na cidade alemã de Haltern, cujas vidas foram abruptamente interrompidas quando retornavam de um intercâmbio em Barcelona. Em razão da forma como os danos são calculados, os pais poderiam receber compensações menores do que uma esposa com um bebê pequeno que perdeu o marido, executivo de uma empresa, na tragédia. Isso porque os tribunais levam em conta fatores como a renda e a idade dos mortos no desastre e por quanto tempo teriam condições de sustentar financeiramente suas famílias se ainda estivessem vivos. Ou seja, cabe aos juízes decidir quanto vale o sofrimento das famílias que perderam um pai em comparação ao das que perderam um filho. Da perspectiva de um agente de seguros, uma família que perde um filho tem uma pessoa a menos para sustentar, o que os deixa com uma renda maior. Já uma família que perde o pai, perde, normalmente, o provedor, o que a deixa em pior situação financeira. Não se deve esperar que nenhum dos afetados possa compreender essa lógica perversa. E provavelmente, eles não teriam de fazê-lo, diz, Spinner. A Lufthansa já se comprometeu a agir de acordo com a Convenção de Montreal, o que poderá lhe custar um total de cerca de 21 milhões de euros. "Estamos aptos a cumprir com as obrigações financeiras. Nossa prioridade é ajudar as famílias como pudermos", declarou o presidente da empresa, Carsten Spohr. "Eles [a Lufthansa] provavelmente não irão pagar mais do que sua obrigação, porque se o fizessem, isso poderia ser visto como uma admissão de culpa", afirma Spinner. Autor: Peter Dahl (rc)Edição: Luisa Frey
TAGS