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Disputas entre milícias podem levar Líbia à guerra civil

08:51 | Ago. 26, 2014
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País vive os mais violentos conflitos desde queda do ditador Kadafi, e processo de transição política ameaça fracassar. Parlamento recém-eleito tem pouca influência, e milícias lutam umas contra as outras pelo poder. Tanques passam sobre a pista de pouso, uma fumaça escura toma o aeroporto de Trípoli. As salas de espera estão destruídas, e muitos edifícios, extremamente danificados. Há semanas, várias milícias disputaram a mais importante unidade do sistema de transportes da capital líbia. No último fim de semana, a aliança islâmica Fajr Lybia tomou não só o aeroporto, como também as esperanças de que tempos de paz voltem ao país no norte da África. O governo perde cada vez mais o controle da situação. As milícias são militarmente superiores às forças de segurança, ainda em estágio de reestruturação. Uma razão para isso é que o ex-ditador Muammar Kadafi enfraqueceu muito as forças de segurança do país e do Exército, em prol da sua guarda palaciana. Agora, o governo líbio sequer consegue proteger ruas e edifícios públicos, quem dera um grande aeroporto. "Um aeroporto internacional na capital de um país é um símbolo de soberania", afirma Wolfram Lacher, especialista em Líbia do Instituto Alemão de Relações Internacionais e de Segurança (SWP, na sigla original). "A destruição mostra que ninguém controla o Estado, e que as partes do conflito estão dispostas a destruir a infraestrutura para evitar que seus adversários se beneficiem dela", diz. Mais caos Três anos após a queda de Kadafi, o caos na Líbia está crescendo. Em 2011, as milícias ainda lutavam juntas contra o governante, mas desde sua morte, elas lutam entre si. "São grupos locais armados, que, nos últimos anos, foram formando alianças", afirma Lacher. A aliança Fajr Lybia, por exemplo, reúne milícias de Misrata e de outros bastiões da revolução de 2011, além de forças islâmicas. Outra aliança é liderada por milícias de Sintan. "Sintan também teve um papel de liderança na revolução de 2011", comenta Lacher. "Mas, desde então, o grupo foi gradualmente se afastando de seus aliados revolucionários. Agora, luta ao lado de forças conservadoras, como os federalistas no leste, remanescentes do antigo Exército e as elites tribais, incluindo grupos que eram próximos ao antigo regime." Há ainda o chamado Exército Nacional Líbio, do general Khalifa Haftar, que luta desde maio contra milícias islâmicas no leste do país, obtendo sucessos parciais. Haftar rompeu com Kadafi no final de 1980, viveu muito tempo no exílio nos Estados Unidos e tem apoio de parte das Forças Armadas regulares em particular, da Força Aérea. Governo central irreconhecível O poder das milícias é tão grande que o governo central é quase irreconhecível. Em junho, um novo Parlamento foi eleito, mas ele não é reconhecido por todos os lados. Os resultados obtidos pelos islamistas nas eleições parlamentares foram catastróficos, e, como consequência, eles declararam o Parlamento ilegítimo. Muitos analistas também veem na ofensiva das milícias ligadas a islamistas uma tentativa de reverter, através da força, a derrota na eleição. "Nesse meio tempo, o Parlamento já se posicionou claramente contra os revolucionários, classificando as forças em Trípoli de terroristas", diz Lacher. "Com isso, tornou-se uma das partes do conflito. Forças políticas importantes boicotam o Parlamento, que também não pode reivindicar nenhum papel central de liderança." Devido à violência em Trípoli e Bengasi, o Parlamento tem trabalhado na cidade mais oriental de Tobruk. Milhares de líbios fugiram nas últimas semanas da guerra, principalmente para a Tunísia. Muitos diplomatas também deixaram a Líbia. O presidente do Parlamento, Akila Saleh Issa, pediu a intervenção da ONU. "Nós ainda estamos esperando que uma intervenção da comunidade internacional proteja os líbios e pare o derramamento de sangue", disse à emissora Sky News. Iminente guerra civil Muitos observadores preveem agora uma guerra civil ou a até mesmo a desintegração do país. Somente em 1963, as áreas então autônomas Tripolitânia, Cirenaica e Fezzan foram unidas para formar um Estado central. A própria Líbia surgira apenas no período colonial italiano, recebendo a independência em 1951, sob o rei Idris. Hoje esta unidade está ameaçada, pois fica cada vez mais claro que governo e Parlamento estão perdendo o controle sobre grandes áreas e grandes cidades. A tomada do aeroporto pela Fajr Lybia é apenas um exemplo. "Existe a possibilidade de que seja formado um antigoverno e, possivelmente, um Parlamento paralelo em Trípoli", afirma Lacher. "Com isso, o processo de transição política estaria fracassado." Estados vizinhos da Líbia já temem que o caos possa se espalhar para seus países. Nesta segunda-feira, o ministro do Exterior do Egito, Sameh Shukri, exigiu, durante uma reunião com seus colegas da Líbia e de outros cinco países vizinhos, que o governo líbio seja fortalecido e as milícias, desarmadas.

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