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Protesto contra Israel na Alemanha reúne de pacifistas a radicais

13:43 | Jul. 24, 2014
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Milhares se reúnem em Bremen para mostrar solidariedade aos palestinos. Mas, entre os ativistas de esquerda e defensores da paz, logo se infiltram também os extremistas. As pessoas preferem manter certa distância dele. O tradicional manto branco e a longa barba ruiva brilhando ao sol da tarde chamam a atenção. A imensa bandeira com palavras em referência ao Islã se destaca imediatamente em meio às bandeiras palestinas coloridas numa praça de Bremen. Com firmeza, uma manifestante lhe diz: "Isso não tem nada a ver. Retire isso daqui." Com lágrimas nos olhos, uma jovem muçulmana avança em sua direção e grita "Salafistas de m.!" Um tumulto se inicia em meio a empurrões e cuspes. Dois acompanhantes do homem de barba ruiva gritam "ya Bagdadi, ya Bagdadi", uma manifestação de simpatia com o líder da milícia radical islâmica EIIL (Estado Islâmico do Iraque e do Levante), Abu Bakr al-Bagdadi. A jovem é afastada por suas amigas. Clima de tensão São justamente incidentes como esse que Saleh al-Sarey quer evitar, a todo custo, em suas manifestações pela paz em Gaza. O ativista de 63 anos é presidente da comunidade palestina em Bremen e ajudou a organizar o evento na cidade. Al-Sarey vive há 45 anos na Alemanha. O palestino nasceu num campo de refugiados em Beirute. Com a fundação de Israel, os seus pais foram expulsos de Jaffa. Ele diz não nutrir ressentimento ou ódio, sentimentos que ele afirma não querer ver em suas manifestações. No convite, pediu explicitamente para que se trouxessem somente bandeiras palestinas. "Não queremos oferecer nenhum espaço para grupos marginalizados ou provocadores", afirma. Para ele, é importante que se proteste somente contra o procedimento brutal do Exército israelense no conflito com o Hamas, e não contra os judeus. "Somos contra o antissemitismo." "Escreva que eles matam crianças", gritou um homem com forte sotaque turco. Com "eles", o homem estava se referindo aos sionistas. Ele e um cidadão alemão convertido ao islamismo acabam de concordar que a raiz de todos os males está no sionismo. O muçulmano convertido disse ainda outras coisas que poderiam levar ao menos a uma multa por incitação ao ódio, de acordo com o Código Penal alemão. Naquele dia, no entanto, os dois estavam em minoria. Slogans pacíficos Enquanto abria caminho nas ruas do centro de Bremen, a multidão entoava slogans pré-estabelecidos pelos organizadores, como "Liberdade para Gaza", "Palestina Livre" e "Merkel, Merkel, nos escute". O fato de esta guerra estar sendo levada a cabo também com armas provenientes da Alemanha é motivo de indignação para muitos. Principalmente para os muçulmanos, que são maioria na manifestação pela paz em Bremen. "Palestina é a minha terra natal", diz Fatma Zarifi. "Eu nunca mais estive lá, mas um dia eu volto e quero poder viver em paz." A amiga dela, Gülcan, de origem turca, acrescenta: "Nós, como muçulmanos, queremos apoiar nossos irmãos e irmãs. Por isso, estamos hoje aqui." Iman, irmã de Fátima, entrou na conversa. Em suas bochechas, ela havia pintado pequenas bandeiras palestinas. A jovem diz achar exagerado o atual debate na mídia sobre uma volta do antissemitismo na Alemanha. Para ela, a crítica a Israel e o ódio aos judeus são duas coisas completamente diferentes. Pouco antes de os manifestantes chegarem à praça Marktplatz, uma fumaça surge no ar. Ao menos três câmeras de TV foram direcionadas para um monte queimado de coisas indefinidas. "Foi só papel de jornal", disse um fotógrafo, com certo desapontamento na voz. Os organizadores sabem muito bem que, após os tumultos em Berlim e na França, eles estão sob constante observação. Ao menos centenas de policiais vigiavam a manifestação. Uma mulher mais idosa, que não quis revelar seu nome, disse considerar terrível o slogan "Abaixo Israel", porque, segundo ela, ele se volta contra os israelenses. Ela nasceu na Alemanha em 1942, três anos antes do fim da Segunda Guerra Mundial. Quando adolescente, passou a se interessar pelo tema do fascismo. Ela disse que estava ali devido às pessoas na Faixa de Gaza, "que estão sendo esmagadas por tanques e não têm para onde fugir". Alemães pouco presentes "Nenhuma arma para Israel Contra o sionismo", estava escrito na camiseta de um homem que mantinha os braços cruzados. Em sua panturrilha, ele usava uma tatuagem de um punho fechado. O seu companheiro, com dentes pequenos amarelados e cabeleira raspada sob um rabo de cavalo, não quis dizer nada a princípio. Depois de um tempo, ele decidiu então se manifestar: naquele dia, ele disse estar ali porque não aceitava que o mundo todo estivesse apenas assistindo ao que Israel está fazendo: "Afinal de contas, já foram dadas terras aos judeus, de modo que eles podem se dar por satisfeitos." Ele disse que entende por que tão poucos alemães marcam presença atualmente nas manifestações. "Logo se é tachado de canalha, de antissemita." Em seguida, porém, ele se revela: "Eu nunca gostei muito dos judeus." Muitos panfletos foram distribuídos durante a manifestação, principalmente por grupos esquerdistas. Em seu panfleto, o grupo "Esquerda Anticapitalista de Bremen" se posicionou contra o bombardeio da Faixa de Gaza. Já o comunista "Poder do Trabalhador" exigiu solidariedade imediata com os palestinos e questionava se antissionismo poderia ser equiparado a antissemitismo. Trata-se de uma situação delicada. Mas, para os manifestantes muçulmanos, ela é mais fácil de superar. A Segunda Guerra e o Holocausto não pertencem à sua história. Por vezes, a manifestação assume tons macabros. Em seus braços, um homem segurava um bebê, em cujo pijama estava escrito: "Israel, não me mate". Mariam, uma jovem palestina, carregava duas bonecas de bebê, enroladas simbolicamente com panos ensopados de tinta vermelha. Com o fim da manifestação, a calma volta aos poucos à praça em Bremen. Em frente à catedral, uma mulher clama "Jesus é meu Senhor". Duas jovens usando o lenço islâmico na cabeça passam por ela e riem. Um grupo de jovens muçulmanos ainda tira algumas fotos no sol da tarde. Eles afirmaram ter vindo pela liberdade e disseram que muitos alemães estariam se esquivando, muito sob pressão da política. "O que está acontecendo ali é uma injustiça", dizem. "E para ver isso não é preciso ser muçulmano."

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