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"Existe uma inflação de papas santos", diz historiador

07:38 | Abr. 27, 2014
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Para que servem as canonizações? O que revelam sobre a Igreja santificadora? No contexto da canonização dos papas João Paulo 2° e João 23, o historiador eclesiástico Hubert Wolf falou à DW sobre o sentido da canonização. Neste domingo (27/04), o papa Francisco irá declarar santos dois de seus antecessores os papas João Paulo 2° (1920-2005) e João 23 (1881-1963). O papa emérito Bento 16 também estará presente à cerimônia de canonização na Santa Sé. Assim, a Praça de São Pedro será palco de um evento "sem precedentes na história, ou seja, a presença de dois Papas vivos e dois Papas santos", declarou no início da semana o vice-presidente da Obra Romana de Peregrinação (ORP), monsenhor Liberio Andreatta. Em entrevista à Deutsche Welle, o historiador eclesiástico Hubert Wolf falou sobre o sentido da canonização. Wolf é diretor da Faculdade de Teologia Católica na Universidade de Münster, na Alemanha. DW: A canonização de papas revela muito sobre os canonizados. O que ela revela sobre o atual alinhamento da Igreja Católica? Hubert Wolf: Ao longo dos séculos, somente algumas poucas vezes um Papa foi canonizado. E houve séculos em que não houve nenhuma canonização. E, agora, desde meados do século 19, um em cada dois papas ou foi beatificado ou foi canonizado ou o processo está em andamento. Ou seja, no que se refere a papas, existe uma inflação de papas santos. E eu acho isso um pouco problemático. Pois o que predestina um Papa a ser santo, frente a um trabalhador católico, cuja atuação no trabalho é aliada às convicções católicas? Assim fica claro: quando papas são canonizados por papas, isso também é uma autoencenação do papado como uma instituição sagrada. E tendo-se agora duas canonizações João 23 e João Paulo 2° , então isso foi uma coisa bem orquestrada. Aqui se trata de duas práticas diferentes do ministério petrino. Por um lado, João 23, o papa que convocou o Concílio Vaticano 2° representa o abrir de portas para que entre a renovação. Do outro lado, encontra-se João Paulo 2° com seu papel inegável na unificação política na Europa, mas também com um forte reposicionamento da Igreja em direção a Roma, com um papado marcado por viagens e uma forte presença midiática. Se Francisco canoniza dois papas de uma só vez, ele está tentando satisfazer todas as expectativas. Ele quer mostrar os dois papas como complementares. Ou seja, a canonização dos dois papas revela a compreensão de papado por parte Francisco? O papa Francisco assumiu os processos de seu antecessor. Eles já existiam simplesmente. Mas o fato de ele unificá-los é decisivo. Ele poderia ter dito: "OK, agora é a vez do Santo Súbito [nome dado pela imprensa italiana à rápida canonização de João Paulo 2°]. Eu vou canonizar João Paulo 2° sozinho." Isso poderia levar a crer que esse seria o alinhamento seguido pelo papa Francisco. O fato de ele também canonizar João 23 torna a coisa toda bastante católica, ou seja, katholon de acordo com o todo, abrangente. Ele não está dizendo: "os papas devem ser como João Paulo 2°!", mas: "Eles também podem ser como João 23!" Em entrevista, Francisco disse ter cogitado chamar-se João 24. Então ficamos sabendo: a canonização simultânea diz, programaticamente, muito sobre o atual pontificado. Qualquer canonização faz isso, não sóa de papas. Aqueles que são elevados às honras dos altares e apresentados como paradigmas aos olhos dos fiéis são naturalmente o modelo. Todas as comissões de historiadores, todas as Congregações para as Causas dos Santos só podem fazer sugestões. No final, o Papa decide de forma solitária e imperativa. Assim fica claro que a forma da canonização e as pessoas escolhidas fazem parte de uma orientação. Francisco não está submetido a nenhuma crítica. Ele diz: "OK, eu sou a favor do Santo Súbito. Esse foi o desejo de muitos que admiram como ele aceitou o seu sofrimento e a sua morte." Ele recomendou João Paulo 2° como modelo. E, por outro lado, também levou João 23 junto. Assim, ele está manifestando seu apoio ao Concílio, à abertura do Concílio para o mundo, à implementação das reformas do Concílio. Esta é a tensão sob a qual está todo o pontificado. Será que vai prevalecer uma ou outra direção? Ou Francisco vai tentar equilibrar isso de alguma forma? Qual será a posição de sua cúria, de seus colaboradores mais próximos, seus adversários na cúria também seguirão esse caminho?

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