Acordo entre Rússia e EUA sobre Síria não resolve o conflito armado
''As armas químicas chamam a atenção, mas a tragédia continua'', afirma Khattar Abu Diab, professor de Relações Internacionais da Universidade de Paris-SuD
O acordo entre Rússia e Estados Unidos sobre a destruição do arsenal químico sírio significa um grande avanço, mas não resolve o conflito, que ainda não alcançou uma solução política após 30 meses de guerra civil, segundo analistas e membros da oposição.
"As armas químicas chamam a atenção, mas a tragédia continua", afirma Khattar Abu Diab, professor de Relações Internacionais da Universidade de Paris-Sud.
"O acordo americano-russo é uma primeira etapa, mas não uma solução para a crise na Síria", desencadeada há dois anos e meio, afirma Abu Diab, que considera que o documento assinado em Genebra é frágil.
No sábado em Genebra, o secretário americano de Estado, John Kerry, e seu colega russo, Serguei Lavrov, entraram em acordo no âmbito que prevê a destruição do arsenal químico antes de meados de maio de 2014.
O acordo, que o presidente sírio Bashar al-Assad prometeu acatar, afasta as ameaças de ataque militar de Estados Unidos e França, que queriam castigar o governo sírio por ter utilizado, segundo eles, armas químicas no dia 21 de agosto.
No entanto, o texto não menciona em nenhum momento a organização de negociações de paz. Estados Unidos e Rússia se comprometeram a convocar uma conferência chamada de "Genebra 2".
Esta conferência, já adiada em várias ocasiões, está destinada a lançar as negociações com todas as partes envolvidas para terminar com a guerra civil provocada pela repressão das manifestações de março de 2011.
A oposição insiste que o regime de Assad não deve estar representado nesta conferência, enquanto Damasco afirma que Assad permanecerá no poder até as eleições, previstas para 2014.
"Sem o aval da Coalizão da oposição e de seus aliados regionais e internacionais, não pode haver solução política", afirma Abu Diab, que por outro lado manifestou seu ceticismo com relação à vontade de Damasco de entregar o arsenal químico.
"O regime vai começar a manobrar quando os inspetores estiverem na Síria", adverte.
Segundo o acordo de Genebra, a missão dos inspetores deve terminar antes de novembro.
Para Olivier Lepick, da Fundação para a Pesquisa Estratégica baseada em Paris, é impossível cumprir com este programa.
O calendário é "extravagante. Não penso que seja possível devido à guerra civil. Inclusive em tempos de paz levaria anos", disse Lepick.
Um integrante da oposição, Samir Nashar, reconhece que o acordo permite que Bashar al-Assad ganhe tempo, mas duvida que contribua para a busca de uma paz negociada.
"A Coalizão é muito cética e se nega a ir a Genebra 2 até que os responsáveis pelos massacres sejam levados à justiça", lembra.
O chefe militar da oposição também rejeitou o acordo de Genebra.
"Devemos esperar até meados de maio de 2014 e enquanto isso morrer todos os dias para que as armas químicas sejam destruídas?", perguntou o general Selim Idriss.
Já para Bassam Abu Abdullah, diretor do Centro de Damasco para os Estudos Estratégicos, o acordo dá a Bashar al-Assad a possibilidade de cumprir com um papel na solução do conflito.
"O acordo restabelece a legitimidade de Damasco", afirma à AFP. "A questão das armas químicas é a chave que abre todas as portas", acrescenta.
Por sua vez, um funcionário de alto escalão sírio diz que o acordo poderia reativar um processo de paz se ao mesmo tempo forem suspensas as entregas de armas aos rebeldes, que em "90% são combatentes da Al-Qaeda".
AFP