Sentença contra Berlusconi põe à prova coesão política na Itália
Primeiro-ministro e presidente pedem calma. Correligionários do "Cavaliere" prometem agir com discernimento, enquanto ele próprio anuncia continuação de "luta pela liberdade" com seu partido.
A primeira condenação legalmente válida e inapelável de Silvio Berlusconi desencadeou nervosismo nos meios políticos da Itália. Os grandes grupos da coalizão de governo o Partido do Povo (PdL), do ex-premiê condenado, e o esquerdista Partido Democrático (PD) exortaram-se mutuamente a mostrar senso de responsabilidade, separando a política do veredicto judicial.
Ministros e deputados expressaram esperança de que a sentença contra Berlusconi, figura central da direita italiana, não venha a colocar em perigo a coligação liderada pelo primeiro-ministro Enrico Letta, de cujo gabinete o ex-premiê não faz parte.
Os correligionários de Berlusconi manifestaram-se fiéis à coalizão: segundo o deputado do Gianfranco Rotondi, do PdL, o Cavaliere jamais colocará em questão a estabilidade do governo.
Mártir Berlusconi
Berlusconi, de 76 anos, foi sentenciado na quinta-feira (01/08) a quatro anos de prisão, por sonegação de impostos. Na mesma noite, numa mensagem de vídeo rodada em ambiente de pompa estatal, ele criticou o veredicto com palavras drásticas.
"Ninguém consegue compreender a carga de verdadeira violência que me foi reservada, [...] numa série de acusações e processos que não tinham e não têm nenhum fundamento na realidade", lamentou. Uma parte dos juízes, afirmou, é "irresponsável, uma variável incontrolável e descontrolada" para o país; e os processos em si, um "encarniçamento judiciário que não tem igual no mundo civil".
Além de se apresentar como mártir, perseguido pela Justiça "desde que começou a se ocupar de política", no vídeo de nove minutos o ex-chefe de governo anunciou a intenção de dar continuidade à sua "luta pela liberdade", fortalecendo o partido Força Itália, com que estreou na política, cerca de 20 anos atrás.
Governo pede serenidade
Tanto o primeiro-ministro Enrico Letta quanto o presidente Giorgio Napolitano reagiram à sentença com um apelo à moderação. Letta, de centro-esquerda, enfatizou a necessidade de um governo estável para a Itália, pois nada seria mais inoportuno do que uma ruptura interna.
Napolitano, que poderá convocar eleições antecipadas caso o desfecho do processo provoque o esfacelamento da coalizão em Roma, disse que o país precisa de "serenidade e coesão", num momento em que a crise econômica ainda faz sentir seus efeitos.
O presidente do PD, Guglielmo Epifani, declarou que pretende observar o parceiro de coligação PdL. "Vamos esperar e ver o que vai acontecer", comentou.
Por sua vez Beppe Grillo, líder do oposicionista Movimento Cinco Estrelas (M5S), comparou a condenação do adversário político à queda do Muro de Berlim, em 1989: para ele, Silvio Berlusconi era como um muro que separava a Itália da democracia.
Advogados prometem recurso
Os advogados do político populista de direita declararam ter recebido "com consternação" a sentença por fraude fiscal da corte de cassação em Roma. "Vamos utilizar toda possibilidade, também em nível europeu, para assegurar que esse veredicto seja fundamentalmente modificado", prometeram.
Apesar da condenação, Berlusconi não terá que ir para a prisão. Uma lei de 2006 já o isenta de cumprir três dos quatro anos, e, devido a sua idade, ele poderá escolher entre pagar o ano restante com trabalhos sociais ou em prisão domiciliar.
O Cavaliere não está, contudo, livre da Justiça, pois ainda enfrenta outros dois inquéritos: o apelidado "Rubygate", onde é acusado de ter tido relações sexuais com uma prostituta menor de idade; e o "processo Unipol", por quebra de sigilo e abuso de cargo. A estes, pode-se ainda acrescentar uma terceira ação, por suposto suborno de um senador.
AV/dpa/rtr/afp