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Crise no Egito aumenta drama dos moradores da Faixa de Gaza

09:16 | 27/08/2013
À mercê da instabilidade política egípcia, território palestino sofre com constantes fechamentos da passagem de Rafah, que prejudicam economia local e impõem dura rotina de incerteza aos habitantes. O dia mal começou, mas o agente de viagens Nabil Shurafa, da Cidade de Gaza, já sabe o que fará até o fim da jornada: cancelar e remarcar voos. Desde a mudança de governo no Cairo, o posto de fronteira Rafah, que liga Gaza ao Egito, vive uma rotina inconstante de bloqueios e aberturas e quem mais sente são os palestinos. "Cada vez que há um problema na região, então é Gaza e as pessoas daqui quem pagam", reclama Shurafa, que diz que os últimos dez anos têm sido particularmente difíceis para a empresa familiar. "Nós reservamos, cancelamos e reservamos novamente. Tentamos fazer com que o cliente pague o mínimo possível de taxas." Principalmente nos dias atuais, é quase impossível manter uma agência de viagens numa região em que a maior parte dos 1,7 milhão de habitantes não pode viajar livremente. No último sábado (24/08), o Egito reabriu a fronteira com a Faixa de Gaza cinco dias após tê-la fechado. Desde 3 de julho, dia em que Mohamed Morsi foi derrubado da Presidência, estima-se que o tráfego através do posto fronteiriço de Rafah foi reduzido em 75%. Nos últimos dez dias, a passagem foi reaberta somente duas vezes, para permitir que palestinos retidos no lado egípcio pudessem voltar para a casa em Gaza. Restrições em série Para os passageiros retidos em Rafah, só resta sonhar por dias melhores. Na área de espera perto do terminal crescem a frustração e o estado de tensão. Alguns viajantes vêm diariamente tentar a sorte. "Eu tenho um exame importante na minha universidade na Argélia no início de setembro", conta Iyad Abu Zanouma. "Se eu não conseguir sair logo, meu visto de entrada na Argélia vai expirar. Somos seres humanos, não animais que se podem aprisionar." No dia anterior à nova tentativa do jovem universitário, a fronteira esteve aberta das 11h às 13h, mas somente algumas poucas pessoas puderam sair. O seu vizinho na área de espera relata algo semelhante: o jovem palestino com passaporte norueguês visitou os pais durante o verão e pretende agora voltar para a Noruega pelo Aeroporto do Cairo. Sua esposa e filhos, bem como seu trabalho estão esperando por ele no país nórdico. "Meu patrão não está particularmente contente por eu não poder voltar a tempo, mas ele ainda se mostra compreensivo", diz Abu Sharkh. Do lado do governo, não se pode esperar ajuda. No momento, o que se escuta por aqui é que o Hamas está particularmente preocupado consigo mesmo. "Para o Hamas, a queda de Morsi é como um tsunami político", diz o cientista político palestino Omar Shaban em Gaza. "Durante um ano, eles foram apoiados de todas as formas seja política ou economicamente. De repente, tudo ficou diferente." Enquanto outros aliados na região minguaram, o Hamas encontrou no governo Morsi principalmente apoio ideológico. O Qatar prometeu milhões em ajuda financeira e para reconstrução. Mas a mudança de poder no Egito está obrigando os islamistas a repensar. Observadores acreditam que, no futuro, o governo do Hamas vai se esforçar ainda mais para controlar a pequena faixa de terra e seus habitantes. Já agora, o aparato de segurança reage com nervosismo. Recentemente, os escritórios dos correspondentes de dois órgãos independentes da mídia, Ma'an-News e Al Arabiya, foram fechados sob acusação de incitação contra o Hamas em suas reportagens. Também um vídeo colocado na internet e realizado por um grupo autodenominado Tamarod Gaza está provocando controvérsia. Nele, jovens mascarados convocam manifestações pacíficas contra o Hamas da mesma forma que jovens egípcios fizeram no país vizinho. O vídeo já teria levado à prisão de quatro palestinos. "Os egípcios estão agora muito preocupados consigo mesmo", diz o porta-voz do Hamas Ihab el-Ghussein. "Mas esperamos que em breve a situação se estabilize e que eles possam voltar a cuidar da causa palestina." No entanto, segundo observadores, a situação não está pendendo para um breve retorno a melhores relações. Negócios subterrâneos abalados Isso é particularmente visível no sul da Faixa de Gaza. Nas últimas semanas, o Exército egípcio explodiu ou inundou muitos dos túneis entre a fronteira da Faixa de Gaza e a região egípcia do Sinai. Acredita-se que mais da metade das importantes linhas subterrâneas de abastecimento tenha sido destruída. O Exército egípcio acusa o Hamas de "exportar" armas e terroristas para o Sinai, onde grupos militantes jihadistas mataram recentemente 24 policiais egípcios. No lado palestino, a região é monitorada de perto por forças de segurança do Hamas. O acesso por parte de jornalistas só é permitido com autorização especial. Os guardas de fronteira egípcios observam de suas guaritas do outro lado as muitas barracas brancas de plástico e montes de areia. O burburinho que domina normalmente os negócios subterrâneos se acalmou atualmente. Mas, num dos túneis, a agitação é grande. Sacos de cimento da cidade egípcia de El-Arish são retirados a cada cinco minutos por meio de um guincho elétrico de um fosso do túnel. "No momento, há diversos dias em que não chega cimento, aço ou qualquer outra coisa pelo túnel. E isso vai mudar somente quando houver um acordo político do outro lado", diz o trabalhador do túnel Mohamed, retirando a poeira de cimento da testa. A rede de túneis é uma importante rota de abastecimento para toda Gaza. Por ela, são contrabandeados alimentos, material de construção e também armas para a região isolada. Fora isso, a Faixa de Gaza é abastecida com mercadorias somente através do posto de fronteira Kerem Shalom. O governo do Hamas, que cobra impostos sobre as mercadorias contrabandeadas através dos túneis, está deixando de arrecadar milhões em taxas, segundo o Ministério da Economia local. Quando têm mercadorias a transportar, os trabalhadores nos túneis recebem por volta de 120 schekels (70 reais) por um turno de dez horas. Mohamed diz que não se sabe como a situação vai continuar e que já estão acostumados a não planejar com antecedência. Enquanto isso, um jovem empilhando sacos de cimento sobre um caminhão afirma: "Nossa situação é de dependência do Egito. Para onde o Egito vai, vai também Gaza."

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