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Zimbábue vota com desafio de evitar repetição de crise política

13:48 | 30/07/2013
Cinco anos após conturbadas eleições, Mugabe volta a enfrentar arquirrival Tsvangirai, hoje premiê. Perder pode significar responder por crimes cometidos em suas três décadas no poder, e oposição teme fraude. O atual presidente do Zimbábue, Robert Mugabe, e seu primeiro-ministro, Morgan Tsvangirai, são arquirrivais, embora tenham que colaborar desde 2009 em um governo de unidade nacional. Só estão juntos hoje porque, após a crise política aberta com as eleições de cinco anos atrás, foram pressionados pela comunidade internacional a fazê-lo. Em 2008, Tsvangirai chegou a derrotar Mugabe no primeiro turno, mas não conseguiu obter a maioria absoluta dos votos. Após a onda de violência que se seguiu à votação, ele preferiu não concorrer ao segundo turno, como forma de não inflamar ainda mais os ânimos no país e tentar deslegitimar um pleito que considerava fraudulento. Membros da oposição foram presos e perseguidos, e ele próprio teve que fugir para a embaixada da Holanda. Tsvangirai, hoje com 61 anos, fora, ele mesmo, membro do partido de Mugabe, a Zanu-PF (União Nacional Africana do Zimbábue - Frente Patriótica), na década de 80, ainda que por um curto período. Mas ele se afastou de Mugabe e fundou em 1999 o Movimento para a Mudança Democrática (MDC). Alguns anos mais tarde, o MDC se dividiu entre o MDC-T, de Tsvangirai, e o pequeno MDC, hoje liderado por Welshman Ncube. O partido se dividiu em 2005 por causa das eleições para o Senado, que Tsvangirai queria boicotar. Ncube, ex-correligionário de Tsvangirai, também é candidato a presidente. Advogado e professor de direito, ele pode se tornar o fiel da balança nas eleições. "Ncube tem muitos adeptos nos redutos da oposição no leste do país. Ele pode ganhar de 10% a 15% dos votos, que podem decidir quem será o presidente", diz o analista político Dumisani Nkomo. Outro ex-aliado do presidente na disputa Por isso, é possível que nenhum dos candidatos consigam mais que 50% dos votos no primeiro turno, marcado para esta quarta-feira (31/07). "É muito provável que haja um segundo turno", sublinha Nkomo. Depois disso, muito vai depender das habilidades de negociação dos candidatos. "Se Tsvangirai quiser vencer, terá que convencer Ncube a apoiá-lo [em um segundo turno]", observa. Outro candidato também pode desempenhar um papel importante: Dumiso Dabengwa, ex-ministro do Interior de Mugabe e agora presidente do ressuscitado Zapu. A agremiação volta a aparecer no cenário político como força independente, após ter sido anexada compulsoriamente em 1989 pelo partido de Mugabe, Zanu, passando a se chamar Zanu-PF. Embora Mugabe tenha mantido o nome do seu partido como Zanu-PF, Dabengwa tinha, em 2008, apoiado um candidato da oposição. Agora, ele mesmo desafia Mugabe. "Ele pode não ganhar a eleição, mas tem uma grande influência sobre os militares e o serviço de inteligência. Ou seja, quem quer que ganhe, vai precisar do apoio de Dabengwa", prevê Nkomo. Dabengwa e Ncube já fecharam uma aliança. Embora concorram como candidatos independentes nas eleições presidenciais, se comprometeram a se apoiar mutuamente a nível regional nas áreas onde um ou outro partido não tenha candidatos próprios. O quinto candidato a presidente, Kisinot Mukwazhe, é insignificante, de acordo com Nkomo, e só deve conseguir alguns poucos votos. Aos 89 anos, Mugabe quer se manter no poder a qualquer preço. Por isso, conseguiu recentemente que o limite estipulado por referendo constitucional para que o presidente só possa cumprir dois mandatos seguidos de cinco anos não se aplique retroativamente. Com isso, pode ficar mais dez anos no cargo, apesar de sua idade avançada. Tsvangirai acusou Mugabe repetidas vezes de fraude eleitoral. Ele também queria ver as reformas implementadas antes da eleição, como tinha sido estipulado pelo acordo firmado pelo governo de unidade. Entre as medidas previstas nas reformas, estão o fortalecimento da liberdade de imprensa e a neutralidade política das forças de segurança. Mas, até agora, pouco aconteceu. O fato de Mugabe ainda ter fixado a data da eleição foi uma clara violação do contrato. Decepção também com oposição Críticas à antecipação da eleição não vieram apenas da oposição, mas também da Comunidade para o Desenvolvimento do Sul Africano (SADC), que também insistiu no cumprimento das promessas de reforma sem obter sucesso. "Estamos voluntariamente fazendo parte da SADC. Se ela decidir fazer algo estúpido, podemos deixá-la", respondeu Mugabe. "É bastante possível que Mugabe cumpra essa ameaça", crê Nixon Nyikadzino, da Coalizão Crise no Zimbábue, uma associação de várias organizações de luta pelos direitos civis no país. "O que se pode esperar de um homem de 89 anos de idade? Você está lidando com uma pessoa que já não pensa nos zimbabuanos, mas na sua família e em si próprio. É preciso não esquecer: ele também deixou a Commonwealth em 2003. Aos nossos olhos, ele perdeu a cabeça." Analistas concordam que, desde que assumiu o poder em 1980 como premiê e, a partir de 1987, como presidente Mugabe foi de um respeitado combatente pela independência a um autocrata repressivo. Particularmente controversas foram as desapropriações de terras de fazendeiros brancos. Em 2000, a Suprema Corte do país declarou a desapropriação inconstitucional. Depois disso, Mugabe trocou os juristas do tribunal. Muitos fazendeiros brancos fugiram para países vizinhos. Mas muitos também estão decepcionados com Tsvangirai. Sua popularidade caiu drasticamente nos últimos anos, após escândalos envolvendo seu casamento e sua vida amorosa, além de acusações de corrupção contra membros do seu partido. "A eleição presidencial é crucial para ambos os candidatos. Caso Tsvangirai perca, terá que abrir caminho para um sucessor, depois de três derrotas seguidas", prevê Nkomo. E Mugabe também quer ganhar as eleições a qualquer custo, para evitar ter de responder por crimes em seu próprio país, como o assassinato por suas forças de segurança de milhares de pessoas no leste do país em 1980. "Para eles, esta é realmente uma questão de sobrevivência", opina Nkomo. Ele acredita que eles também não teriam escrúpulos em recorrer à fraude eleitoral para alcançar seus objetivos. "A máquina de manipulação já está em andamento", acredita.

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