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Interesses de facções ameaçam conversas de paz com talibãs

16:53 | 02/07/2013
EUA apostam em diálogo com o movimento radical para tentar reduzir a violência no Afeganistão, mas especialistas lembram que movimento tem várias ramificações, de objetivos distintos e que impossibilitam qualquer acordo. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e até mesmo o presidente afegão, Hamid Karzai, apoiam negociações de paz com os talibãs e seu escritório em Doha. Washington anseia por encontrar um interlocutor legítimo, e os representantes do movimento radical na capital do Qatar parecem se encaixar nesse perfil. "Os talibãs estão unidos", garante Wahid Mozhda, analista político no Afeganistão e ex-funcionário do antigo Ministério do Exterior do regime talibã, em entrevista à DW. "Há apenas um grupo sob o comando do Conselho Central (shura) do Talibã." A declaração, no entanto, é posta em dúvida por outros especialistas. Eles temem que nem todos os talibãs sejam envolvidos nas conversas, o que condenaria o processo de paz ao fracasso. Sem unidade Especialistas europeus em talibãs acreditam que atualmente há um grupo com posições definidas, mas que não representa todos os talibãs. "Podemos supor que os emissários em Doha são os mais próximos da chamada Quetta Shura, sob a liderança do mulá Omar, a qual frequentemente reivindica para si a liderança dos talibãs", diz o especialista alemão em Afeganistão Conrad Schetter, professor da Universidade de Bonn. Este conselho afegão aparentemente reclama para si o direito de ser o único a negociar com os Estados Unidos. No entanto, ainda há uma série de outros atores. Schetter afirma que, além da Quetta Shura, há no Paquistão os talibãs na cidade de Peshawar, perto da fronteira com o Afeganistão; além da rede Haqqani, próxima dos talibãs; e dos Hezb-e Islami (Partido do Islã), assim como muitos outros grupos dissidentes locais distribuídos pelo Afeganistão. Todos têm suas próprias reivindicações. Abdul Ghafoor Liwal, diretor do Regional Studies Center, em Cabul, acrescenta ainda à lista os talibãs do Paquistão e do Uzbequistão, além dos jihadistas internacionais, especialmente os da Chechênia e do mundo árabe. "Todos esses grupos formam alianças entre si e as quebram novamente logo depois. É impossível compreender como estes vínculos funcionam." "Seria um milagre se essa complicada rede pudesse ser representada pelo escritório em Doha", conclui o cientista político Jochen Hippler, da Universidade de Duisburg-Essen. Ele não acredita que todos os grupos talibãs se sintam representados pelo escritório na capital do Qatar. "Há muitos que têm orientação mais regional", explica, acrescentando que não existe uma estrutura de comando clara. Nova imagem "A cerimônia de abertura do escritório em Doha, em meados de junho, se prestou a demonstrar unidade política, força e legitimidade internacional dos talibãs", analisa Jawed Kohistani, presidente do Afghan Freedom and Democracy Movement, situado em Cabul. "Os talibãs de Doha não querem ser vistos como um grupo terrorista. Eles querem ser levados a sério como uma força política internacional, com uma nova imagem". O objetivo final, segundo o especialista, seria assumir o poder em Cabul e recriar o Emirado Islâmico do Afeganistão. "Uma partilha de poder com outros grupos ou com o governo Karzai nem sequer está em questão atualmente", acrescenta Hippler. "Os talibãs acreditam mesmo que isso não seja necessário para eles, pois eles acham que, politicamente, ganharam a guerra." Entretanto, tanto Karzai como a rede Haqqani e os Hezb-e Islami temem ser postos de lado. "Aqueles que não conseguirem se expressar em Doha passarão a pressionar por trás de portas fechadas para deixar claro que têm suas próprias demandas. É uma luta não só por cargos políticos e recursos mas, acima de tudo, por reconhecimento", analisa Conrad Schetter. Discussões inócuas Atualmente, no entanto, os EUA estão preocupados em assegurar que não haja mais ameaça terrorista vinda do Afeganistão. Por isso, Washington vem tentado incrementar os contatos com os talibãs afegãos, representados pela Quetta Shura, em busca de uma solução pacífica para o conflito. "Nos últimos anos, os americanos têm se distanciado de Karzai. Por outro lado, têm mostrado que não consideram mais os talibãs como 'bad boys'", observa o pesquisador Conrad Schetter. "O presidente Karzai perdeu legitimidade", afirma, por sua vez, Jochen Hippler. "Com isso, a guerra no Afeganistão está perdida politicamente.  A Otan não pode ganhar uma guerra contra 30 mil militantes armados com suas Kalashnikov. Agora, os EUA tentam salvar o que ainda resta. Os talibãs podem esperar para ver se os EUA vão oferecer uma partilha do poder e tentar tirar Karzai do governo. Ou eles podem jogar com o tempo. Em ambos os casos, os talibãs acreditam que podem prevalecer no final", analisa Hippler. Na opinião do especialista, as conversações em Doha serão inócuas. "As discussões não levarão nem à guerra nem à paz", conclui.

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