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Presidente alemão encerra visita ao Brasil destacando valores comuns

06:41 | 16/05/2013
Nos discursos, Joachim Gauck repetiu termos como democracia e liberdade e se disse emocionalmente próximo da Comissão Nacional da Verdade. Ele amenizou rixa entre Merkel e Dilma. O primeiro compromisso oficial do presidente da Alemanha, Joachim Gauck, nesta quinta-feira (16/05) é subir até a estátua do Cristo Redentor, ícone da cidade do Rio de Janeiro. A visita remete ao passado de Gauck, ex-pastor luterano conhecido pelo ativismo a favor da queda do Muro de Berlim e também pelo papel que assumiu na reunificação alemã a partir de 1990. A passagem pelo Brasil a primeira desde que ele foi eleito presidente da maior economia europeia, em março de 2012 foi marcada por discursos em que Gauck destacou valores como democracia e liberdade. Os termos foram usados em quase todos os pronunciamentos oficiais de Gauck, que abordou temas ligados à economia, à cultura e à ciência e tecnologia nos dias iniciais do ano Alemanha + Brasil 2013-2014 em São Paulo, onde esteve ao lado da presidente Dilma Rousseff. Mas tais discursos têm uma simbologia especial no Brasil na semana em que completa um ano de existência a Comissão Nacional da Verdade, criada para apurar as violações de direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988, ano em que o país aprovou a atual Constituição após o fim da ditadura militar. "Emocionalmente, a reunião com os membros da Comissão Nacional da Verdade foi o que mais me marcou", afirmou Gauck, em entrevista após encontro com a nova coordenadora da comissão, a advogada criminalista Rosa Maria Cardoso, e o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles. "Tive reuniões sobre economia, mas quando encontro pessoas que trabalham com o sofrimento que foi imposto aos outros, a dimensão é bem diferente", disse o presidente alemão, que antes de ir ao Brasil visitou a Colômbia, país que há quarenta anos é palco da atuação dos guerrilheiros das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), consideradas uma organização terrorista pela União Europeia e outros países ocidentais. Gauck disse ter ficado impressionado com a disponibilidade de uma vítima das Farc de se reconciliar com o passado que viveu. No Brasil, Gauck elogiou a criação da Comissão Nacional da Verdade independente e com acesso a todas as fontes do governo, a comissão teria importância fundamental na eliminação de injustiças, segundo o presidente alemão. Mas Gauck também alertou para o risco de fracasso da Comissão. "O projeto pode dar errado se for um 'projeto de esquerda'. A reconciliação precisa partir do núcleo, do interior da sociedade. Todos os democratas precisam dizer 'nunca mais'. Na [reunificação da] Alemanha, tínhamos um consenso amplo [sobre a abertura dos arquivos da Stasi]", exemplificou, defendendo que a população brasileira tenha um discurso "construtivo" e "frequente" sobre o seu passado sombrio. Gauck ainda se declarou contra leis de anistia. "Não são tão boas, considero até algo ruim. Aceito anistias quando elas evitam novas violências entre etnias. Nesse caso, é possível justificar politicamente." Na terça-feira, a Comissão Nacional da Verdade disse que vai propor uma nova interpretação da Lei da Anistia brasileira de 1979, abrindo eventualmente a possibilidade de investigar e julgar militares que violaram os direitos humanos entre 1946 e 1988. Limites para o poder de criminosos O discurso sobre valores também prevaleceu na quarta-feira (14/05) durante a visita de Gauck à Comunidade Santa Marta, a primeira favela pacificada da cidade do Rio, há quatro anos, e famosa pelo videoclipe do cantor Michael Jackson, They don't care about us. "É preciso criar primeiro as bases para as pessoas viverem bem juntas, saindo da extrema pobreza. A educação faz parte desse processo", disse Gauck, enquanto acenava para os moradores, ao mesmo tempo em que posava para fotos, sorridente, ao lado de crianças. Em vários momentos dos quatro dias de sua estada no Brasil, ele salientou a importância da educação, dando repetidas vezes o exemplo do chamado sistema dual alemão, que além da formação universitária também oferece capacitação técnica. "Reparei que existe um enorme potencial de desenvolvimento para a formação não universitária no Brasil", afirmou o presidente alemão, durante a apresentação, também nesta quarta-feira, da agenda científica do ano Alemanha + Brasil 2013-2014, no Palácio Guanabara, sede do governo do Estado. Responsabilidade da ciência A cooperação entre Brasil e Alemanha não deve ser intensificada apenas no plano econômico ou político, mas também na pesquisa e na inovação tecnológica, disse Gauck. E, assim como na Comissão Nacional da Verdade, é preciso adotar soluções sustentáveis a longo prazo. "A população mundial cresce cada vez mais e todos têm direito à alimentação, querem ter mobilidade, acesso ao transporte e à energia", argumentou o presidente alemão. Ele salientou a importância da cooperação científica e tecnológica entre os dois países, que poderão se tornar pioneiros de uma economia de desenvolvimento que respeite o meio ambiente e que seja sustentável. "Um país como o Brasil, onde as desigualdades são grandes, precisa sempre estar atento tanto ao desenvolvimento econômico quanto ao social. Uma 'economia verde' como aquela apontada durante a Rio+20 [conferência internacional de sustentabilidade realizada no ano passado pelas Nações Unidas, no Rio de Janeiro] não depende apenas de protocolos internacionais", disse Gauck mas sim de pesquisa e empresas inovadoras que "não precisam fazer tudo o que é possível, mas precisam melhorar a vida das pessoas de forma sustentável". Por isso, regimes democráticos como os do Brasil e da Alemanha seriam "ideais" para o desenvolvimento da inovação. Amenizando rixas No início da visita de Gauck ao Brasil, o presidente alemão disse em pronunciamento à imprensa que estava curioso para saber como seria recebido por Dilma, já que ouvira muito na Alemanha sobre o problema "que existiria entre ela e [a chanceler federal alemã] Angela Merkel. Encontrei uma presidente disposta a ir ao encontro de Merkel de coração aberto". A declaração serviu, de certa maneira, para amenizar uma rixa surgida no ano passado entre as duas líderes, sobre a valorização excessiva da moeda brasileira, o real. Durante a abertura do Encontro Econômico Brasil-Alemanha, na última segunda-feira, Dilma repetiu uma crítica feita a países desenvolvidos no ano passado, quando visitou a Alemanha. A valorização excessiva do real aconteceria "por causa de 'injeções monetárias' dos países ricos, acabando com a competitividade dos nossos produtos" no mercado internacional, disse. Na ocasião, Merkel alertou contra "medidas protecionistas unilaterais" pelas quais o Brasil estava sendo criticado, como o aumento de impostos de carros importados, por exemplo. Como impressão geral, Gauck disse que o Brasil ainda precisa alcançar os objetivos ambiciosos que deverão projetá-lo internacionalmente. "O Brasil, naturalmente, ainda está a caminho. Ainda estão por alcançar essas metas para se tornar um 'global player'. Nós, os alemães, ficamos felizes em ajudar onde pudermos. E poderemos aprender a levar coragem e uma atitude decidida para promover mudanças", afirmou.

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