Partido pode frustrar Obama no controle de armas
Esses senadores democratas, de estados predominantemente rurais e com uma cultura forte de posse de armas pelos cidadãos, veem a iniciativa de Obama com cautela e não se comprometeram a apoiá-la. Essas preocupações poderão enterrar o projeto do presidente antes mesmo que um único legislador do Partido Republicano vote "não". Os republicanos são fortemente contra controles sobre o acesso dos cidadãos a armas.
"Há um 'núcleo duro' de senadores democratas - a maioria do Oeste, mas nem todos - que representa estados com uma taxa de posse de armas maior do que a média e com um desejo igualmente forte de sentir que suas crianças estão seguras. Eles estão tendo discussões difíceis, porém positivas com seus eleitores sobre como identificar soluções intermediárias que respeitem a Segunda Emenda da Constituição, mas tornem mais difícil para pessoas perigosas terem acesso a armas", disse Mark Glaze, diretor da organização Prefeitos Contra Armas Ilegais.
A Segunda Emenda da Constituição dos EUA diz que "sendo necessária uma milícia bem regulamentada para garantir a segurança de um Estado livre, o direito do povo a manter e portar armas não será violado". O Senado tem 100 integrantes, dois de cada estado, de modo que um projeto de lei precisa ter 51 votos para ser aprovado; atualmente são 56 senadores do Partido Democrata, 42 do Partido Republicano e dois independentes.
As atenções agora estão voltadas para pelo menos dez senadores democratas que poderão votar contra a iniciativa do presidente Obama, alguns dos quais estão diante de campanhas para a reeleição em 2014. Entre eles estão Max Baucus, de Montana, Mark Begich, do Alasca, e Mark Pryor, do Arkansas.
O Comitê de Justiça do Senado deve fazer a primeira audiência sobre o projeto na próxima quarta-feira. Em debate estará a iniciativa de Obama, materializada num projeto de lei da senadora democrata Dianne Feinstein, da Califórnia, que proíbe a venda de fuzis automáticos de assalto, limita o tamanho dos pentes de munição, estabelece medidas para combater o tráfico de armas e universaliza as verificações dos antecedentes de quem quer comprar armas de fogo.
Grupos de interesse, lobistas da indústria, legisladores, vítimas de crimes e seus familiares estarão atentos ao comportamento dos senadores democratas, para ver quais medidas eles deverão apoiar ou não, em busca de indícios sobre se o Congresso será capaz de adotar alguma legislação sobre controle de armas depois da morte de 20 crianças e seis adultos em um tiroteio em uma escola primária de Newtown (Connecticut), em dezembro.
Neste domingo, dezenas milhares de pessoas participaram de uma manifestação em Washington pela proibição à venda de armas automáticas. Entre elas estava o prefeito da capital dos EUA, Vincent Gray, e cerca de cem moradores de Newtown.
O movimento contra qualquer controle é liderado pela Associação Nacional do Rifle (NRA), uma organização não governamental tradicional com grande influência sobre setores do público e que representa uma ameaça a senadores democratas em estados predominantemente pró-armas e que pretendem se reeleger.
As preocupações políticas de alguns democratas criam problemas para o líder da maioria no Senado, Harry Reid, de Nevada. A NRA manifestou apoio a ele em eleições anteriores, mas se manteve neutra na última vez em que ele concorreu, em 2010. Mesmo antes de Obama anunciar sua iniciativa por novos controles à posse de armas, no começo deste mês, o senador Reid disse em entrevista a uma emissora de televisão de Nevada que seria difícil o Congresso aprovar essas medidas. Essa declaração irritou a senadora Feinstein, autora do projeto.
"É claro que isso não ajudou", disse a senadora na semana passada, ao apresentar o projeto de lei. Em 1994, durante o governo do presidente Bill Clinton, também do Partido Democrata, outro projeto de controle de armas da autoria de Feinstein havia sido aprovado, mas com duração de apenas dez anos para a proibição da venda de armas automáticas. Naquele ano, a NRA fez uma campanha vigorosa contra os congressistas que haviam votado a favor da lei e alguns observadores atribuem a isso a derrota dos democratas naquelas eleições. Quando a proibição à venda daquele tipo de armas caducou, em 2004, o Congresso, pressionado pelo lobby pró-armas, não aprovou sua renovação.
Reid disse recentemente que "esta é uma questão da qual nós não vamos fugir", mas ele está sob pressão. Pelas normas do Senado dos EUA, algumas iniciativas legislativas podem ser encaminhadas pela liderança diretamente ao plenário. Reid, porém, prometeu que o projeto de Feinstein cumprirá o ritual de passar pelo Comitê de Justiça - que é presidido pelo senador democrata Patrick Leahy, de Vermont, proprietário de armas e conhecido apoiador da Segunda Emenda.
O líder da maioria também prometeu um processo aberto de apresentação de emendas ao projeto, o que deve tornar o processo legislativo mais demorado. Ativistas que defendem o controle de armas estão preocupados com a possibilidade de o processo ser tão lento que acabe parando sem que nada seja aprovado. Para alguns, esse pode ser o resultado desejado secretamente por democratas "moderados". "Estou preocupado, porque Reid tem um histórico misto nessas questões, enquanto nós gostaríamos que ele fosse um campeão da causa", disse Josh Horwitz, diretor executivo da Coalizão para Deter a Violência com Armas.
Do outro lado da disputa, a NRA, conhecida por recompensar aliados com doações generosas e punir os adversários com campanhas virulentas, também está atenta aos movimentos de Harry Reid. "Ele vai ficar dividido, assim como muitas outras pessoas, especialmente os democratas, mas acho que, à medida que o debate prossiga, ele vai fazer mais bem do que mal, do nosso ponto de vista. Tudo isso já foi discutido antes, e, uma vez iniciado o debate e que se questione se essas medidas vão fazer alguma coisa para proteger nossas crianças e evitar uma nova Newtown, acho que a resposta será 'não'", disse o presidente da NRA, David Keene.
Os senadores Baucus, Begich, Pryor e outros têm manifestado cautela ao comentar a iniciativa de Obama. Baucus pediu "um debate bem pensado". Begich disse ao jornal Fairbanks Daily News-Miner que a aprovação de qualquer das medidas previstas no projeto será "difícil, porque há alguns de nós que acreditam fundamentalmente no direito previsto na Segunda Emenda". Pryor declarou à imprensa do Arkansas que os esforços por maior segurança com armas deveriam começar com a aplicação das leis já existentes.
Outro senador democrata a ser observado é Joe Manchin, da Virgínia Ocidental. Ele é conhecido por ter disparado um tiro de rifle contra uma cópia da legislação proposta por seu próprio partido sobre mudança climática e preservação do meio ambiente, durante a campanha eleitoral de 2010. Recentemente, Manchin disse a uma emissora de rádio de seu estado que estava trabalhando em um projeto de lei que exigiria verificações de antecedentes para a maioria das compras de armas. Não há detalhes disponíveis sobre esse projeto, mas a questão das verificações de antecedentes é uma na qual existe a maior expectativa de que se encontre uma solução de compromisso que possa ser aprovada no Senado e até mesmo na Câmara, que está sob controle do Partido Republicano.
A NRA se opõe à universalização das verificações de antecedentes dos compradores de armas e contesta as afirmações das entidades que a defendem de que 40% das compras de armas acontecem sem qualquer verificação. O vice-presidente da NRA, Wayne LaPierre, deve depor na audiência desta quarta-feira.
Os congressistas democratas, especialmente aqueles de estados em que predomina o apoio ao direito de portar qualquer tipo de armas, vão estar divididos entre aliar-se à NRA e seguir o presidente. "Somos um estado que apoia a Segunda Emenda. Eu apoio os direitos dos caçadores e atiradores desportivos e de colecionadores de terem armas de fogo. É uma parte importante de nossa cultura e de nossa tradição. Mas eu ouço que existe uma preocupação grave, tendo em vista as experiências que tivemos com Aurora, Columbine... As pessoas de todo o Colorado querem prevenir esses massacres", disse recentemente o senador democrata Mark Udall, do Colorado.
Ele se referia a duas chacinas ocorridas em seu estado: a matança de 12 estudantes e um professor em uma escola em Columbine, em 1999, e um tiroteio em um cinema em Aurora, em julho do ano passado, que deixou 12 mortos.
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