PUBLICIDADE
Notícias

Alemanha lidera luta contra guerras de agressão

07:27 | 27/10/2012
Guerras de agressão devem ser passíveis de punição penal no futuro, como prevê mudança no estatuto do Tribunal Penal Internacional aprovada há dois anos. Alemanha quer ser um dos primeiros países a ratificar a decisão. A invasão dos Estados Unidos e seus aliados no Iraque em 2003 foi controversa desde o início. A partir de 2017, os responsáveis por intervenções militares semelhantes deverão ser levados ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, acusados de delito de agressão. Foi o que decidiram em 2010 os então 111 Estados integrantes do TPI, em uma conferência de revisão do estatuto do tribunal, em Kampala, Uganda. Agora, o governo alemão iniciou o processo de ratificação, tendo levado um projeto de lei ao Bundestag, a câmara baixa do Parlamento alemão. Até agora, só Liechtenstein e Samoa concluíram o processo de ratificação do estatuto. Até 2017, pelo menos 30 dos 121 Estados atualmente membros do TPI têm que ratificar a decisão, para que o tribunal possa começar sua luta contra as guerras de agressão. Na prática, os investigadores podem, então, tomar medidas contra os líderes políticos e militares responsáveis por atos de agressão contra outros países, caso esses ataques contrariem a Carta das Nações Unidas. Guerras destinadas à autodefesa ou iniciadas com um mandato da ONU não são consideradas delito de agressão. "Para que seja verificado crime de agressão, a condição é sempre que exista uma clara violação da Carta das Nações Unidas e do sistema de segurança coletiva nela previsto", explica Christoph Safferling, professor de direito penal internacional da Universidade de Marburg. Depois disso, os indivíduos responsáveis pelos comandos militares devem ser identificados. O TPI não processará soldados comuns que agiram executando ordens. Restrições Delitos cometidos antes de 2017 não serão levados em conta pelo novo estatuto. "Mas, em princípio, ações militares como a invasão americana do Iraque em 2003 e a invasão soviética do Afeganistão, nos anos 80, são cenários em que poderíamos falar em crime de agressão", comenta Safferling. No entanto, ao contrário da invasão alemã da Polônia em 1939, na maioria dos casos é difícil determinar se um Estado realmente feriu os princípios da Carta das Nações Unidas ou se fez uso de seu direito de autodefesa. "Não temos aqui um esquema de preto no branco. Muitas vezes, temos situações complexas ou parecidas com uma guerra civil", frisa Safferling. "Tomemos por exemplo o caso do Iraque, em que uma grande nação afirma ser ameaçada por células terroristas ou armas de destruição em massa para, em seguida, invadir um Estado." Mesmo nas chamadas intervenções humanitárias para proteger a população de um Estado não está claro até que ponto o direito internacional é violado, observa o analista. "São todas áreas nebulosas, para as quais a Carta da ONU não tem uma resposta clara." E até 2017 pouca coisa deve mudar nesse aspecto, especialmente porque ainda há obstáculos formais para a abertura de processos. Não faltam brechas Reino Unido e França, ambos com poder de veto no Conselho de Segurança da ONU, conseguiram em Kampala, apoiadas pelos EUA, impor outras restrições ao TPI. Somente quando o Conselho de Segurança determinar que uma agressão é internacionalmente ilícita, o procurador-geral do TPI pode começar seus trabalhos. Caso o Conselho de Segurança não consiga chegar a tal determinação dentro de seis meses, o procurador pode então entrar com um pedido de abertura de processo por iniciativa própria ou a pedido de um Estado. No entanto, os Estados do TPI têm possibilidade de não reconhecer a decisão do tribunal, podendo, com isso, proteger seus cidadãos de penalidades. Estados influentes, com poder de veto, como EUA, China e Rússia, já não se submetem a determinações do TPI. Em sua luta de dez anos contra crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio, o TPI conseguiu em apenas um caso condenar alguém: no processo contra o criminoso de guerra congolês Thomas Lubanga. Outros acusados, até hoje, somente africanos tiveram de ser absolvidos por falta de provas. Mas a mudança no estatuto permitindo que futuras guerras de agressão sejam condenadas tem significado simbólico importante, como explica o professor de direito penal internacional. "Direito penal simbólico não é um direito penal inútil, é um sinal claro, numa abordagem moral e ética, de que guerras de agressão são condenáveis e criminosas." Aprendendo com o passado Safferling avalia como positiva a posição de liderança da Alemanha no processo de ratificação, considerando que, por seu passado, a o país tem uma responsabilidade especial. A primeira vez que o direito penal internacional foi efetivamente aplicado contra indivíduos foi nos Julgamentos de Nurembergue. Logo após 1945, nazistas de alto escalão acusados de crimes de guerra foram julgados e condenados. "Décadas após os Julgamentos de Nurembergue, descobrimos que fizemos bem em condenar os criminosos de guerra nazistas após a Segunda Guerra Mundial, ou em deixá-los ser condenados pela comunidade internacional", observa o especialista. Ainda neste ano, o Bundestag deve votar o projeto de lei sobre o desenvolvimento do direito penal internacional. Dentro da oposição, sobretudo os Verdes saúdam a medida. "Agora, presidentes ou líderes militares poderão ser responsabilizados pessoalmente por invasões, bombardeios ou bloqueios em outros países, que sejam contra o direito internacional. Este é, sobretudo para nós, alemães, um marco importante do desenvolvimento do direito internacional", declarou, em um discurso no Parlamento, Volker Beck, porta-voz para questões de direitos humanos do Partido Verde. Autor: Christina Ruta (md) Revisão: Francis França

TAGS